Wednesday 14 July 2010

Em Moçambique

Cooperação deve deixar de ser apenas do Estado e incluir universidades

– defende o economista e investigador moçambicano, Firmino Mucavele. Argumenta que, caso contrário, o empresariado nacional vai sempre reclamar

Maputo (Canalmoz) – O economista, agrónomo e investigador moçambicano, Firmino Mucavele, defende que a cooperação entre o Governo e os vários países do mundo, maioritariamente os tidos como potências económicas, deixe de ser apenas pública, do Estado e passe a incluir também o sector privado, a academia, as grandes e pequenas empresas nacionais.
Firmino Mucavele afirma que as cooperações entre Moçambique-China e Moçambique-Índia são uma oportunidade para África interagir com parte dos grandes mercados, nomeadamente a China e a Índia. Ele argumenta que para o caso da China pesa o facto de nesta fase de desenvolvimento em que se encontra estar atenta ao mercado de construção de infra-estruturas, à abertura ao mercado externo e à procura de matéria-prima, aspectos que constituem nesta altura o «Calcanhar de Aquiles» para aquele país.
Firmino Mucavele fez estes e outros depoimentos no último domingo na Televisão Pública de Moçambique, TVM, quando juntamente com o académico Lourenço do Rosário foram solicitados para analisar os assuntos que para aquele órgão marcaram a semana. Dois assuntos foram analisados: a cooperação entre Moçambique-China e a Índia e o relatório sobre o Inquérito Nacional de Prevalência, Riscos Comportamentais e Informação sobre o HIV/Sida, recentemente divulgado pelo Ministério da Saúde.
Entretanto, atento ao mercado indiano, Mucavele considera que só a cooperação não basta. “Há uma associação que se deve fazer com os empresários, com as universidades, escolas técnicas profissionais para tirarmos o melhor proveito dos indianos. Enquanto não fizermos isso, vamos sempre reclamar, como está a acontecer agora. Muitos indianos virão cá trabalhar, mas sem ter a contra-parte moçambicana”.
O economista fez também vários comentários sobre o fraco poderio e domínio tecnológico de Moçambique, mas disse que da cooperação com a Índia pode-se reverter a situação. Nesse sentido, advoga igualmente que é preciso apostar nos jovens que já têm o know-how em termos contabilísticos, económicos, Internet e Web. É isso mesmo que os indianos precisam. Muitos empresários ao chegar em Moçambique dizem que há falta de mão-de-obra porque não estamos profissionalizados”.
Ademais, o investigar diz que a Índia e a China são países muito dinâmicos e rápidos. Quando se envolvem em empreendimentos, a primeira coisa que fazem é a planificação. Determinam os recursos que eles precisam. Por isso, salienta, “da nossa parte precisamos de fortalecer o empresariado nacional. Temos um problema porque entramos nesta cooperação com a Índia e a China sem nos prepararmos”.
Para o caso concreto da Índia, Mucavele refere que a primeira preparação dos moçambicanos é conhecer a cultura empresarial indiana e os seus interesses para que, através desse conhecimento, haja uma associação do empresariado nacional.
Num outro desenvolvimento, o interlocutor disse que no âmbito dos dez (10) mil milhões de dólares que a China está disponível a investir em África, como resultado das primeiras negociações no âmbito da Nova Parceria para o Desenvolvimento de África (NEPAD) e a União Africana, em 2006, anunciados aquando da deslocação de 48 países africanos àquele país, “chegou o momento de os empresários moçambicanos fortalecerem a capacidade produtiva e respirar um pouco com estes financiamentos dos chineses”.
Por seu turno, Lourenço do Rosário afirma que, sem dúvida, a cooperação entre Moçambique e aqueles dois países é uma oportunidade e, simultaneamente, um desafio para o empresariado nacional. Ele chama atenção para a necessidade de “mentalizar que a cooperação não é oferta. Dá-se e recebe-se. Não se trata de donativos. Não se trata de acesso a capitais sem contrapartidas”. Na sua óptica, o grande problema que, muitas vezes, se comete nessas cooperações é aderir-se a elas “sem sequer nos apercebemos o que é que podemos tirar e o que é que estamos a dar. Não sei se os nossos empresários estão suficientemente alertados para este aspecto”.
Quanto à questão do envolvimento da academia na cooperação, Lourenço do Rosário disse que a Índia, por exemplo, é uma nação multiforme, mas tem uma proximidade connosco pelo facto de ter sido colónia, da Grã-bretanha. “A China é uma nação tecnologicamente avançada, o que permite que nessa penetração bastante forte, Moçambique possa tirar proveito na área de formação, não só em termos universitários, mas também técnicos”.
Antes de fazer estas declarações, Lourenço do Rosário fez um recuo histórico sobre a questão de cooperação. “Já na década de 80, insistia-se muito que se privilegiasse a cooperação Sul-Sul como uma forma de os países mais pobres e em desenvolvimento poderem encontrar melhores energias porque conhecem as suas dificuldades e aqueles que pudessem optimizar este tipo de cooperação libertariam os países mais pobres de um outro tipo cooperação mais dominadora que é a globalização”.
Já nos anos 90, prossegue do Rosário, em Moçambique falava-se muito da cooperação Win-Win (ou ganha-ganha) e o nosso país privilegiou os tigres asiáticos como parceiros referenciais, precisamente a Malásia. “Alguma coisa correu mal desta senda do Win-Win. Há alguns anos um grande pensador africano de Guiné-Bissau, doutor Carlos Lopes, alertava-nos para o surgimento de potências no sul, nomeadamente, a Índia e a China. Ele denominava-os de tubarões da cooperação, frisava que não deixavam de ser baleias e alertava exactamente para a capacidade que os empresários moçambicanos podem ter de modo a aceder de forma vantajosa em relação a estas duas potências”. Incluía já nessa perspectiva, também o Brasil.

(Emildo Sambo)

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