Tuesday 13 May 2014

Isencoes Aduaneiras do Partido Frelimo

ISENÇÕES ADUANEIRAS DO PARTIDO FRELIMO



Grandes volumes de importações são feitas através dos Portos de Nacala e de Beira, no Norte e Centro do País, respectivamente, e conforme apurou a investigação do Centro de Integridade Pública, as mercadorias importadas com isenções aduaneiras abastecem a grandes comerciantes de Nacala e da Beira. Há cerca de um mês, o Centro de Integridade Pública (CIP) iniciou a publicação de uma série de reportagens investigativas sobre a máfia da fuga ao fisco que se instalou no País recorrendo à importação de mercadorias como se se destinassem ao uso interno dos partidos políticos quando, na verdade, são destinadas ao comércio geral no País. A primeira publicação da série tratou da importação de viaturas de Japão e Durban (África do Sul) pelos partidos políticos extraparlamentares. A investigação prossegue e agora trazemos ao público os contornos das isenções usadas pelo partido Frelimo para importar mercadorias diversas e abastecer o mercado nacional, lesando o Estado. Os casos que aqui apresentamos, devidamente sustentados por documentos oficiais comprovativos, são apenas amostra das grandes importações que são promovidas pelo partido no poder. Na verdade o partido Frelimo não chega a importar, apenas "transmite" o seu direito de isenção aos agentes comerciais em troca de dinheiro que devia ir para os cofres do Estado em pagamento de Impostos. Motorizadas, congeladores, pneus, cadernos escolares, pilhas, capulanas são dentre várias, algumas mercadorias importadas pelos agentes comerciais com direitos fiscais da Frelimo. O agente comercial é que compra a mercadoria no exterior e manda passar a factura em nome do partido Frelimo. Quando a mercadoria chega a Moçambique, a Frelimo solicita isenção dos direitos nas alfândegas, como se a mercadoria fosse da sua pertença. Uma vez concedida a isenção, o partido Frelimo recebe uma percentagem do dinheiro de direitos aduaneiros que o agente comercial deveria pagar. A outra parte fica com o próprio comerciante. A única entidade que sai a perder neste negócio é o Estado e por extensão o cidadão que seria o beneficiário último do imposto desviado. Os documentos em anexo são referentes aos processos abaixo indicados. MOTORIZADAS Em Junho de 2012, cinco contentores contendo 690 motorizadas entraram no País, importadas pelo partido Frelimo de Dubai, adquiridas na empresa RADAKRISHIN General Trading CO (L.L.C). O preço declarado da mercadoria (incluindo frete e seguros) é de 130.970,00 Dólares. A mercadoria partiu do porto de Chong Qing pelo navio YU Xing e foi descarregada em Moçambique, no porto de Nacala. No mesmo mês de Junho de 2012, mais 690 motorizadas chegaram a Moçambique pelo porto de Nacala, importadas em nome do partido Frelimo. As motorizadas foram adquiridas na mesma empresa que as primeiras (RADAKRISHIN General Trading). Custaram igualmente 130.970,00 Dólares. Foram carregadas no porto de ChongQing pelo navio Tai Bang. Já em Julho do mesmo ano (2012), o partido Frelimo importou cinco contentores contendo 690 motorizadas, adquiridos na empresa Top Trade International, em Hong Kong. As motorizadas, segundo a factura da compra, frete e seguro da mercadoria totalizou igualmente 130.970,00 Dólares. Foram carregadas no dia 24.07.2012 no porto de Shangai, China e descarregados em Moçambique no porto de Nacala pelo navio MAERSK SELETAR. A 4 de Outubro de 2013, a Frelimo, ao nível da cidade da Beira, importou 497 motorizadas avaliadas em 32.300,00 Dólares, cerca de um milhão de meticais. As motorizadas, adquiridas na ChongQing Lifan Industry (Group) da China, foram carregadas no porto de ChongQing pelo navio Min Wei, e descarregadas no Porto da Beira. Um mês antes (19 de Setembro), o partido Frelimo importara, da ChongQing Hanyuan Motorcycle Import and Export da China, uma outra empresa, três contentores de motorizadas da China - foram 414 motorizadas -, avaliadas em 56 mil Dólares americanos - 1.7 milhão de Meticais. Como se pode ver, em dois anos, a Frelimo importou quase 3 mil motorizadas. Estas foram facturas a que tivemos acesso. O que se sabe e que estas importações ocorrem constantemente. CONGELADORES Em Julho de 2012, chegou ao porto de Nacala, pelo navio Kai Tong 9, um total de 1. 610 congeladores transportados em dez contentores. A mercadoria partiu do porto de Nanjing, na China. Os congeladores foram adquiridos em nome do partido Frelimo na RADAKRISHIN General Trading, Dubai ao preço de 104,00 Dólares cada. O custo total da mercadoria, incluindo compra, frete e seguro, é de 204.440,00 Dólares. Dois meses depois, em Setembro de 2012, chega mais um lote de 1. 610 congeladores, entrando em Moçambique pelo porto de Nacala, importados em nome do partido Frelimo. Os congeladores foram adquiridos na empresa Al Ranin Electronics em Dubai. Igualmente partiram do Porto de Nanjing, China e custaram de compra, frete e seguro, 204.440,00 Dólares. Desta vez o navio usado para o transporte da mercadoria é designado Heng Long 6. Em Dezembro de 2013 (dia 28), a Frelimo, ao nível da cidade da Beira, trouxe da Hong Kong dois contentores de congeladores de 15 toneladas, contendo 340 unidades de 160 litros cada. Pela importação, o partido declarou ter pago 31.000,00 dólares referentes à compra e ao transporte de mercadoria. Em Novembro do mesmo ano, no dia 21, já havia importado a mesma quantidade de congeladores de Hong Kong, pagando o mesmo valor. Os congeladores foram adquiridos na mesma empresa, Wiltex Limited. Ao todo, foram 680 congeladores importados daquela empresa. A 17 Janeiro do ano em curso, a Frelimo na Beira volta a importar pelas mesmas vias, também da China, 10 contentores com 1.380 congeladores, avaliados em 59.568,00 Dólares americanos, perto de dois milhões de meticais. No dia 23 do mesmo mês, o mesmo partido na Beira importou igualmente da China, 10 contentores da mesma mercadoria, contendo 693 congeladores, tendo pago, também 59.568,00 Dólares. No mês seguinte, concretamente a 17 de Fevereiro de 2014, o mesmo partido, na Beira, viria a importar dos Emiratos Árabes Unidos (Dubai) cinco contentores de congeladores, ou seja, 696 unidades, avaliados em 74.589,00 Dólares, o equivalente a 2.3 milhões de Meticais. PNEUS PARA CAMIÕES E AUTOCARROS Em Outubro de 2013, o partido Frelimo importou, da empresa Mercury Traders (LCC) de Dubai, 5 mil pneus de tamanhos diversos para camiões, autocarros e viaturas turismo. O total de direitos aduaneiros que devia ser pago pelos pneus é de 6.453.699,84 MT (seis milhões e quatrocentos e cinquenta e três mil e seiscentos e noventa e nove e oitenta e quatro meticais). Mas esta aquisição beneficiou de isenções com a justificação de que tais pneus se destinavam ao "uso nos programas do partido". Ainda em Dezembro (24) do mesmo ano, a Frelimo, em Sofala, importou da Qingdao Doublestar Tire Industrial CO.LTD, da China, 240 pneus avaliados em 26.000,00 Dólares, equivalente a 800.000,00 Meticais. TECIDOS Em Setembro de 2012, o partido Frelimo importou dois contentores contendo tecidos, totalizando mais de 56 toneladas de tecidos. A mercadoria foi adquirida na Atlas Export da Índia. O preço CIF (compra, frete e seguro) da mercadoria é de 50.056,00 Dólares. A mercadoria chegou a Moçambique através do navio D.R Camberra, tendo partido do porto de UNPL, na Índia. CADERNOS ESCOLARES Em Março de 2013, o partido Frelimo importou dois contentores com mais de 18 toneladas cada, contendo embalagens de cadernos escolares. Segundo comprovam os documentos na posse do CIP, os cadernos foram adquiridos na empresa Sundaram Multipap Limited, em Mumbai, na Índia. Partiram do porto Nsict, pelo navio Delmas Keta e chegaram a Moçambique através do porto de Nacala. RASSUL TRADING, O CLIENTE DA FRELIMO? O CIP sabe que grande parte dos produtos importados com isenção pela Frelimo, ao nível da zona norte, são vendidas nas lojas da Rassul Trading, em Nampula, sobretudo em Nacala, cidade Alta. De facto, alguns documentos de importação (Bill of Lading), a que tivemos acessos provam a existência dessa relação entre as importações da Frelimo e as lojas de Rassul Trading. Por exemplo, o Bill of Lading nº557881682, de 10 de Agosto de 2012, foi emitido em nome do partido Frelimo, em Nacala, mas o contacto que consta desse documento é um fax da Rassul Trading (ver http://www.indexmocambique.com/empresas/rassul_trading.html). No referido documento, a Frelimo importou a favor da Rassul Trading, lojas de Gulamo Rassul, 690 motorizadas, avaliadas em 130.970,00 Dólares, o equivalente a 4.3 milhões de Meticais. PRIMEIRO-MINISTRO AMEAÇOU BANIR IMPORTAÇÃO DE PNEUS USADOS No mesmo período em que o partido Frelimo patrocinava importação ilegal de 5 mil pneus de Dubai para o mercado nacional, sem pagar direitos, o Primeiro-Ministro, Alberto Vaquina anunciava que o Governo quer banir a importação de pneus usados, provenientes da África do Sul, alegando que os mesmos são "lixo". "Nós, como um país, não podemos aceitar ser a lixeira de pneus que os outros já não usam. Eles já não os usam porque já não são seguros. Se já não são seguros para os outros países, também não são seguros para Moçambique, porque eles são tão pessoas como nós. Temos o dever de ver como fazer para inibir aqueles aspectos que sabemos que são claramente responsáveis pela ocorrência de acidentes", disse o PM citado pelo jornal O País, na ocasião (ver edição de 06.08.13) As palavras do PM até fazem sentido quando se evoca a necessidade de segurança rodoviária, mas coincidentemente foram proferidas no momento em que o partido Frelimo introduzia em Moçambique dezenas de toneladas de pneus novos importados sem pagar direitos aduaneiros. O PM ignorou ainda que Moçambique não só consome pneus usados, como também que as viaturas que circulam no País, acima de 80% são usadas noutros Países e depois importados para Moçambique. URGÊNCIA DA INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO O Centro de Integridade Pública defende que é pertinente tal como urgente que o Ministério Público aja para pôr cobro a esta máfia que desvia dos cofres do Estado milhões de meticais. Não basta a actuação exclusiva das Alfândegas, tratando estes crimes como exclusivamente aduaneiros. Esta rede de negócio vai muito para além de simples descaminho aduaneiro. Configura-se uma verdadeira máfia, de crime organizado que envolve desde partidos políticos, agentes comerciais nacionais, despachantes aduaneiros e até fornecedores estrangeiros. O seu combate exige esforço conjunto de todas as autoridades estatais, sendo o Ministério Público a entidade que por lei vela pela legalidade no País, a que deve agir para repor a legalidade e esclarecer aos moçambicanos sobre o fim último destas mercadorias. ALFÂNDEGAS NEGAM DISPONIBILIZAR INFORMAÇÃO A dimensão do negócio de produtos isentos de pagamento de direitos aduaneiros, importados pelos partidos políticos, já justifica as razões por que as Alfândegas de Moçambique rejeitaram o pedido do CIP no sentido de disponibilizar a informação sobre as importações feitas pelos partidos políticos nos últimos cinco anos. Segundo apurámos, logo após a publicação do primeiro trabalho sobre o negócio de venda de isenções pelos partidos políticos (ver http://www.cip.org.mz/cipdoc%5C295_CIP%20Newsletter%20n%C2%BA01_2014.pdf), o Governo ordenou que não fossem tornadas públicas as informações que solicitamos sobre as importações dos partidos políticos. Em carta número 89/DG/DGA/2014, de 19 de Março, a Direcção Geral das Alfândegas de Moçambique respondeu ao CIP o seguinte: "manifestamos indisponibilidade para fornecer os dados solicitados no número 1 e 2 da carta na forma como pedido é apresentado devido a limitações estabelecidas por lei sobre a divulgação da informação que é submetida às Alfândegas (Diploma nº 16/2012, de 1 de Fevereiro - aprova o regulamento do desembaraço Aduaneiro de Mercadorias)". No entanto, a carta das Alfândegas não se refere ao artigo que veda o acesso a informação dos partidos. Os números 1 e 2 da carta que o CIP enviou às Alfândegas de Moçambique a 26 de Fevereiro passado, solicita a seguinte informação: 1) Número e nomes de partidos políticos que requereram e obtiveram isenções fiscais para a importação de viaturas em 2013 e o início de 2014; e 2) Lista e características das viaturas importadas pelos partidos políticos com benefício de isenção fiscal, no período acima referido. É URGENTE A REVISÃO DA LEI DOS PARTIDOS POLÍTICOS Os factos acima expostos mostram que é urgente e necessária a revisão da lei dos partidos políticos. Esta lei já está desactualizada, para além de que desde a aprovação, em 1992, ainda não foi regulamentada. No nosso entender, um partido que abusa do direito à isenção que lhe foi conferido na importação de equipamentos necessários ao seu funcionamento, deve ser penalizado e até ver esse direito suspenso ou retirado. Mas para que isso aconteça, deve haver regulamentação da lei, que neste momento apenas confere direitos de isenção e não prevê sanções em caso de uso abusivo desse direito. A lei ainda não fixa o limite mínimo do volume das importações de um partido político isentas de pagar direitos aduaneiros, o que faz com que os partidos políticos abusem desse direito. Só a regulamentação da lei pode estabelecer este limite. Aqui, a Assembleia da República (o parlamento), é que deve assumir o papel soberano de legislar sobre esta matéria. O parlamento representa os interesses dos moçambicanos e como tal deve agir com urgência para acabar com este tipo de abusos. Em anexo os documentos das importações.

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