Wednesday, 2 September 2009

A Opinião de Jorge de Oliveira

Livros moçambicanos (II) por Jorge de Oliveira


Pedro Muiambo
A Enfermeira da Bata Negra

1. A cena dos deputados que dormem mostra-nos que o Pedro Muiambo é um humorista que trabalha tipo consultor. Faz termos de referência, um projeto, um paper com índice, desenvolvimento, conclusão, bibliografia, anexos e depoimentos, tudo só para nos fazer rir. Usa duas táticas ao mesmo tempo: Uma dos símbolos e, outra, a do invertido, do contrassenso ou do diferente para que se possa alcançar o igual. As duas são simples de perceber até porque a obra não é tão extensa assim.
2. A primeira assenta em formigas. O que nos ensinam as formigas? Porquê e quando aparecem as formigas? Num cenário de guerra civil, e enquanto nos embrenhamos num enredo de ataques, mortes, guerrilheiros e duma vida que, mesmo encontrando-se completamente parada, era tão agitada, aparecem esses bichos que, só eles, nos dão o melhor exemplo de que a união faz a força.
3. Um povo desavindo, não unido, não seguia o exemplo das formigas; o recado trazido pela simbologia só se impôs 16 anos depois. A obra mostra esse momento de pacificação.
4. Na segunda, encontra-se humor negro e brincadeira de mau gosto. Desde quando é que uma enfermeira se veste de preto? Quando está de luto? E aqui serve-se do anormal para chegar ao normal. Uma mulher de atributos físicos e morais invulgares, se bem que muito importante e destacada, não chega a ser o centro da narrativa. Mas a estilística está lá: Alguém que, por natureza, veste de branco, aparece de preto.
5. « - Já matei o suficiente por esta temporada.
- Quantos mataste até agora?
- Não sei, mas pelo cansaço que sinto há-de ter sido o suficiente.
- É por isso que estas sempre a descansar
- É».
6. Deve-se ler esta obra para se perceber coisas moçambicanas, como o comportamento das pessoas em tempo de guerra e, sobretudo, o facto de existir, no PM, um bom escritor e um cidadão que viveu esse drama trazido pela força das armas.
7. «Era uma vez... um homem decidiu deixar para trás a sua querida terra, ultrapassar mares, dobrar cabos e recreios, fiel à sua loucura, à busca do longínquo desconhecido. Era um resgatador de esqueletos».
8. Descobre-se ainda que Moçambique tem mais um dramaturgo; a sua escrita arranca, desenrola-a e fecha com precisão de um produto áudio-visual. Chega-se ao fim e diz-se: Isto daria um bom filme ou um documentário espetacular. Está lançada a ideia.

Jorge de Oliveira

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