Por John Stossel(*)
Dos seis bilhões de pessoas que habitam a Terra, dois bilhões sobrevivem com apenas alguns dólares por dia. Eles não constroem empresas - ou se o fazem, não as expandem. Diferente do que acontece nos Estados Unidos, na Europa e em países asiáticos como a Coreia do Sul, Hong Kong, etc, eles não conseguem sair da pobreza. Por que não? Qual é a diferença?
Hernando de Soto me ensinou que a maior diferença pode ser direitos de propriedade. Conheci de Soto há mais ou menos 15 anos. Foi em um daqueles almoços onde as pessoas se reúnem para refletir sobre como acabar com a pobreza.
Eu vou, mas sou cético. De Soto, presidente do Instituto para a Liberdade e Democracia no Peru, se senta e começa a mostrar fotos de barracos construídos uns sobre os outros em favelas. Fiquei imaginando o que elas significavam.
Como de Soto explicou, “Essas fotos mostram que cerca de 4 bilhões de pessoas no mundo constroem suas casas e montam suas empresas fora do sistema legal... Por causa da ausência do estado de direito e da indefinição de quem é o dono do que, e por não terem endereços, elas não podem conseguir crédito [para empréstimos de investimento]”.
Elas não têm endereços?
“Para conseguir um endereço, alguém precisa reconhecer que aquele lugar é onde você mora. Isso significa... que você tem um endereço de correspondência... Quando faz um acordo com alguém, você pode ser identificado. Mas até que a propriedade seja definida pela lei, as pessoas não podem se especializar e criar riqueza. O dia que elas conseguem o título de propriedade é o dia em que os seus negócios, as suas máquinas de costura, o descaroçador de algodão, a oficina mecânica é finalmente reconhecida. Elas podem, então, começar a expandir”.
Esse é o caminho para a prosperidade. Mas é preciso ser reconhecido por alguma autoridade local que diga: “Isto é seu”. Elas precisam do estado de direito. Mas muitos lugares do mundo subdesenvolvido mal têm o direito. Por isso, as pessoas empreendedoras têm de arriscar. Fazem um acordo com o vizinho do primeiro andar e constroem suas casas no segundo andar.
“Provavelmente o morador do primeiro andar, que teve a coragem de fazer um acordo com alguém do governo, que decidiu ignorar o que estava acontecendo, tem um direito de propriedade invisível. Não é muito diferente de quando os americanos começaram a ir rumo ao oeste, mas os americanos naquele tempo estavam absolutamente cientes do que o estado de direito significava”, disse de Soto.
Os americanos marcavam suas propriedades, que eram reconhecidas por um tribunal, e recebiam uma escritura, significando que todos sabiam a quem pertencia a propriedade. Eles podiam então comprar, vender e emprestar para quem achassem conveniente.
Essa ideia de uma escritura protegendo a propriedade parece simples, mas é poderosa. O comércio entre dois estranhos seria impossível de outra maneira. Ela se aplica a mais do que apenas a construção de arranha-céus e fábricas. Ela se aplica ao mercado de ações, que apenas funciona por causa de contratos similares a escrituras nos quais confiamos porque temos o estado de direito.
De Soto está dizendo que se o mundo em desenvolvimento vivesse sob o estado de direito ele poderia se tornar tão ricos como os países desenvolvidos?
“Sim. É claro. Mas devo dizer que trazer o estado de direito para um país não é uma tarefa fácil”.
De Soto diz que nos esquecemos daquilo que nos tornou prósperos. “Mas os líderes no mundo em desenvolvimento percebem que são relativamente pobres frente à riqueza dos países desenvolvidos”. Eles estão começando a compreender a importância da propriedade privada.
Vamos torcer para que não estejamos esquecendo o que eles estão começando a aprender.
(*)John Stossel é âncora do programa 20/20 da rede de TV ABC News, e autor do livro Myth, Lies, and Downright Stupidity
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