Friday 4 March 2011

A Opinião de Venâncio Mondlane Jr.

A Roupa


Roupa, vestes, trajes, indumentária, ou outro nome mais refinado, significa, em termos gerais, um arranjo de tecido com o fim de cobrir o corpo. Em tempos idos a pele de animais, ou couro, era o material primário que os Homens colocavam sobre a sua pele para os recobrar do frio e outras variações do clima. O tempo avançou, a história se alargou, o Homem descobriu materiais mais cómodos, mais coloridos, mais impressionantes para confeccionar a «máscara» do corpo, surgem assim o linho, a seda, o cetim e outros. Mas, acima de tudo, surgiu, com o tempo, uma arte que curiosamente é menos aludida visto que ofuscada pelos seus cultores: os estilistas. Assim, nos nossos tempos o vestuário é comodidade, conforto, suavidade, adaptável ao
clima e as ocasiões sociais como gala, discoteca, ambiente caseiro, do bairro , do trabalho..etc. Em suma a roupa desempenha não apenas uma função biológica (frio), mas
também social. Estas são em linhas gerais as vertentes em que o vestuário é usado, mas gostaria de falar de um a outra pouco falada.

O vestuário tornou-se na era moderna, um estandarte, um símbolo de sexualidade. Os decotes, as calças apertadas, as blusas truncadas, as mini-saias, são uma forma de
sugerir aos outros a nossa sensualidade. Aqui até parece um pequeno paradoxo, visto que a roupa em princípio esconde mas, ao mesmo tempo, salienta partes de nosso corpo criando impressão a quem nos olhe. As pessoas deixam de ver apenas a roupa nas suas origens mais primárias (biológica e social) e usam a roupa como um entreposto, um espelho diáfano, que deixa ver mas também esconde. Esta propriedade de uma coisa ser e não ser é a grande função que a alta costura moderna procura retractar. A roupa
atingiu um estágio de desenvolvimento avançado, em que ela vale pela sua capacidade de abstrair de ser mais expressividade que existência, ser mais arte que realidade.
É explorando este efeito que hoje pela roupa certos grupos sociais se identificam: prostitutas, rapers (repistas?), comunistas, rastamen, rockistas,....

Quando pela roupa se passa a transmir mensagens ou ideias, a roupa deixa de ser apenas um material e resvala para o plano da simbologia. Esta dimensão da indumentária é fortemente cultivada como vínculo identitário. É com conhecimento da roupa como cultura, como identidade, que os processos de aculturação são muito severos para o que se veste. Por exemplo na fase decadente do império japonês, os americanos e ingleses instituíram a proibição do uso do quimonó dos samurais. Chegou a ser considerado crime nacional quem deixasse crescer o cabelo e o colocasse em forma de «rabo de cavalo». O reino Suáti (Suazilândia) é internacionalmente conhecido como um dos baluartes da cultura africana e o que ressalta a vista de
toda a gente, á primeira, são os trajes de couro castanho- esbranquiçados que cobrem os corpos dos Suati, sobretudo nas ocasiões cerimoniais.

Modernamente a roupa passou a ser mais uma extensão de uma ideia que uma expressão cultural. Os motoqueiros, por exemplo, não descartam de seus trajes alguns pedaços de
leda ou de cabedal. Um repista exemplar não dispensa umas calças derreadas, de preferência a baloiçar no parte mediana das nádegas, uma tolha no lugar do cachecol, uma camisete com números impressos e sobretudo um boné com a aba sempre oblíqua. O facto de uma roupa poder vincular uma ideia, uma identidade, é também explorado para fins variados, alguns mesmo perversos, são inúmeros casos de larápios que encobertos apenas num simples uniforme, se fazem passar por funcionários de empresas de serviços para ludibriar e assaltar pessoas.

Dentro da questão da roupa como elemento de identidade existe um Mundo pouco falado mas não menos importante: as grandes multinacionais de confecções. Muitas das roupas
> que hoje é venerada e comprada de forma desenfreada representa mais negócio do que um símbolo, isto é, é uma ilusão pensar-se que uma calça com bolsos grandes, com a
> dimensão de uma pasta, possa ser o símbolo do black power, black proud, ...; usar uma camisete Calvin Kein é mais um contributo para a indústria CK que um sinal de grandeza para quem comprou. Esta concepção da roupa como negócio é muitas vezes niglegencidada, prevalecendo apenas a ideia da roupa como factor identitário, como manifestação de grandeza ou outro ideal que na sua essência é um abstracto.

Decorre disto que hoje, como dizia Mia Couto, existem muitos mitos. O culto da roupa, a crença que um determinado formato, um tipo especial de tecido, uma textura peculiar, seguir religiosamente a linha de produção de um estilista famoso, são formas de preencher nas nossas mentes um ideal ilusório. Isto não significa que tais crenças sejam desajustadas, ou que tais pessoas sejam intelectualmente diminuídas não, não e não. Significa por e simplesmente que essas inclinações não nos tornam cada vez mais nós mesmos, somos vítimas de uma indústria de publicidade com grandes recursos para vingar no mercado e nas nossas mentes, os nossos ideais deixam de ser produto das nossas inquietações e passam a depender do que as multinacionais
nos apresentam como bom. Estas indústrias chegam a determinar o que é parte integrante da nossa cultura, vejam só que hoje se propala, nas quatro direcções da rosa dos ventos, que existe uma tal «roupa africana», mas nada se diz sobre a história dessa mesma roupa.

Para terminar, deixo para o grupo uma reflexão e se possível, que se investigue o que está por detrás dos cachecóis, das bandeiras, camisetes e outras vestes que
muitos de nós compra em nome de ser do Sporting, Benfica, Porto, Manchester....e o que é isso de ser do clube X ou Y?

Um abraço fraterno

Venâncio Mondlane Jr.

2 comments:

Maquiti said...

Onde anda este senhor?


M

Anonymous said...

onde está Venâncio Mondlane? Não deixe seu povo.... caro Venâncio! pedimos-te.