Tuesday, 11 January 2011

As ligações perigosas do general João Américo Mfumo


Submundo do crime

Maputo (Canalmoz) - João Américo Mfumo, antigo combatente da luta de libertação nacional, ex-membro do governo de Moçambique, general na reserva e antigo comandante da força aérea moçambicana, actualmente um próspero empresário e presidente da Câmara de Comércio de Moçambique, está envolvido, através de mais um dos seus empreendimentos empresariais, com dois cidadãos estrangeiros com um passado tenebroso nos seus países, a Zâmbia e a África do Sul, respectivamente. Numa exaustiva investigação, o Canalmoz apurou os contornos dos negócios do general Mfumo.
Com a constituição da Intratek, Mfumo, em representação da firma Ocirema, juntou-se a Ibrahim Sildky Yusuf, um cidadão de nacionalidade zambiana, baseado na África do Sul, que é procurado pelas autoridades daquele país, devido a fraudes, entre outros crimes. Yusuf, também conhecido por Iboo, já respondeu em tribunal em Lusaka, por envolvimento no tráfico de Mandrax nos anos oitenta. Outro sócio de Mfumo é Ralph Pietersen, um cidadão sul-africano, antigo integrante das Forças Armadas, que já foi citado no envolvimento no tráfico de armas.
João Américo Mfumo, com interesses empresariais em várias áreas, já foi cônsul honorário da Indonésia em Maputo – título actualmente detido por Noor Momade, PCA da agência de viagens COTUR.
A 5 de Maio do ano passado (2010), o general Mfumo foi baleado por desconhecidos, na sua quinta em Marracuene, tendo sido socorrido de imediato para o Hospital Central de Maputo, segundo noticiou alguma imprensa moçambicana. A Polícia ficou de informar a sociedade sobre as motivações do crime, mas até agora ainda nada se sabe, pelo menos publicamente, sobre as razões do baleamento que, por pouco, tirava a vida ao general.
Quem é João Américo Mfumo e quais são os seus interesses empresariais?
Após a Independência de Moçambique, João Américo Mfumo foi nomeado governador da província de Nampula. Com o início do roncar das armas iniciado pela Renamo contra o então governo monopartidário da Frelimo, Mfumo teve que voltar para o teatro das operações, como operativo, onde chegou ao posto de comandante da força aérea.
O histórico da Força Aérea de Moçambique é repleto de obscuridades. Após o final da guerrilha que opunha o exército governamental e os rebeldes da Renamo, os motores da sua frota de helicópteros e aviões de combate foram vendidos e ninguém foi penalizado. O processo para a penalização dos então autores da venda ilícita dos motores das Forças Armadas, nunca chegou a ter desfecho.
O então magistrado, Alberto Nkutumula, pai do actual vice-ministro da Justiça do Governo liderado por Armando de Guebuza, nomeado então para dirigir as investigações do caso, foi assassinado com a sua esposa às portas da província de Maputo.
João Américo Mfumo, presentemente general na reserva, tem uma multiplicidade de interesses económicos em diversos sectores da economia desde 1988, quando junto a outros cidadãos de nome Natvalal Kanje e Dalpalal, constituíram a Sociedade Geral Africana de Importação e Exportação, Limitada – SOGA.
Em 1991, junta-se ao falecido Carlos Pereira Klint (fundador da RTK – Rádio e Televisão Klint, que então foi o primeiro canal de Televisão privado em Moçambique), constituíram a SEMINA – Sociedade de Exploração Mineira Limitada.
No mesmo ano (1991), João Américo Mpfumo junta-se a um cidadão de nome Emílio Faizer Abdula Ibraimo, e constituem a COPRAL - Cosmética, Perfumaria e Produtos para o Lar, Limitada.
Em 1993, com os cidadãos Castigo João Chivite, Graig Mark Woolward e Brett Graig Woolward constituíram a Clínica Cruz Limitada.
Em 1995, com Stefan Tache, Sílvia Aurel Dragomir e o general na reserva Bonifácio Gruveta Massamba, constituíram a EMAGRO, Limitada, com sede na Zambézia, uma sociedade com objecto social nas áreas agro-pecuárias, agro-industriais.
Em 1997, com os cidadãos Philip Lee Scott Gray, Samuel Whitaker e Maria Fernanda Rocha Lopes constituíram a SUBSAHRA - Consultoria, Serviços e Comércio, Limitada que se dedica à prestação de serviços de consultoria em todas as áreas de actividade económica, incluindo intermediação comercial; Importação, exportação e comercialização de todo o tipo de produto para o consumo público e de equipamentos para actividades comerciais, industriais ou agrícolas; representação e agenciamentos; gestão de propriedades; indústria e agricultura em geral; produção gráfica, incluindo impressão e edição de publicações, revistas e livros.
Em 1998, Mpfumo junta-se a José Maria Sousa Pilar, e constituíram a Sociedade Pesqueira de Angoche, Limitada, com sede naquele distrito provincial de Nampula.
Em 1999, Mpfumo junta-se com o cidadão Inácio Macuácua, e constituem a sociedade de transportes TRANSAUSTRAL, Limitada. No mesmo ano (1999), junto com Nerci Laimone Ndlovu, Pascoal José Nhalungo e Hermínio Morais (ex-general da Renamo), constituíram A Mozaminas, Limitada, uma sociedade que tinha pretensões na área de desminagem, mas tal projecto não chegou a ganhar forma.
Em 2001, com Manuel Machado Barbosa, António Fernandes Tavares Novo e Fernando Brás Lourenço constituíram a Mozmat, Limitada., uma sociedade com interesses nas áreas da engenharia e construção civil.
Em 2003, com Ghassan Ali Ahmad e Ingrid Blache Fabienne Lasoen constituíram a HOME CENTER, Limitada. Esta sociedade, de acordo com os registos oficiais, sofreu várias alterações na quotização e em 2008 a cidadã Ingrid Blache desligou-se da sociedade, sendo presentemente sócios Américo Mfumo e Ghassan Ahmad.
Em 2005, com Sam Yafoufi, Robin Alfred Yaghi e Ali Moahamed Ali Yahfoufi constituíram a MID - Group Maputo Investiment Development, Limitada, uma sociedade com interesses na consultoria nas áreas de contabilidade, turismo, hotelaria, informática, rent-a-car, etc.
No mesmo ano (2005), novamente com Sam Yafoufi e Ali Moahamed Ali YAhfoufi, constituíram a Princess Cinderella Kindergarten And Primary School, Limitada, uma instituição de ensino privado baseada na capital.
Em 2006, com os cidadãos Christos Erasmus Nel, January Boy Masilela, Ralph Pietersen (o cidadão sul-africano citado no tráfico de armas), Jacob Isreal Mabena e Paulino José Macaringue (actual chefe de Estado Maior General da FADM), constituíram a Broham Moçambique, Limitada, uma sociedade com interesses na agricultura e turismo.
No mesmo ano (2006), com Bonifácio Gruveta Massamba (também general na reserva e primeiro governador da Zambezia), João dos Santos Ferreira, Joaquim Ribeiro Pereira de Carvalho (PCA das TDM), José Phahlalea Moyane (ex-governador de Maputo), Domingos Fondo (General na Reserva), Jacob Jeremias Nyambir, Zacarias João Chichavi, Victória Daniel Paulo, João Facitela Pelembe, Lopes Tembe Ndelana, Tome Eduardo e Mussagu Daude Jeichande, constituíram a ACLL - Investimentos, Participações e Gestão, SARL. Esta sociedade é uma holding constituída quase que quimicamente nos mesmos moldes da SPI, a holding da Frelimo, com vários interesses económicos.
Em 2008, novamente com Ali Yahfoufi e Hussein Mohamed Ali Yahfoufi e Wafa Shaimam, constituíram a Coral Investimentos, Limitada, uma sociedade com interesses na indústria hoteleira.

Empresas de Mfumo devedoras de créditos do Tesouro

O general Mfumo, através da TransAustral, beneficiou de um crédito avaliado em 38.300 mil meticais em 2000, segundo o relatório-parecer da Conta Geral do Estado (CGE), auditada pelo Tribunal Administrativo (TA). No ano seguinte foi buscar mais 61 milhões de meticais. Desde 2001 a esta parte, a TransAustral ainda não reembolsou nenhum valor.
João Américo Mpfumo tem igualmente uma empresa denominada Sociedade Geral Africana de Importação e Exportação (SOGA). Em 2000, Mpfumo foi ao Tesouro buscar financiamento para a SOGA avaliado em 23.870 mil meticais, valor que ainda não foi pago, segundo documento do Tribunal Administrativo (TA).
Mas o relatório do TA referente a Conta Geral do Estado de 2001, publicado em 2003, indica que no caso da empresa SOGA, constatou-se que, efectivamente, quem recebeu os 23.870 mil meticais foi a TransAustral Lda, detida por Mpfumo, com a finalidade de comprar viaturas para transporte de passageiros, para a cidade de Maputo.
Actualmente, esta frota de viaturas de transporte de passageiros praticamente desapareceu da circulação na cidade de Maputo. A última conta do TA relativa a CGE de 2008, não faz referência aos devedores do Tesouro, ficando deste modo sem se saber quem já amortizou as suas dívidas, como no caso do general Mfumo.

Câmara de Comércio de Moçambique

Em 2009, o general na reserva foi eleito presidente da Câmara de Comércio de Moçambique, cujo mandato em frente dos destinos desta agremiação deverá terminar ainda este ano.
Este novo elenco foi empossado numa cerimónia que aconteceu no Clube dos Empresários no dia 15 de Julho de 2009, e contou com a presença do então ministro da Indústria e Comércio, António Fernando, e de vários representantes do sector público e privado.
Para a presidência da Câmara foi empossado o general João Américo Mpfumo, representante da empresa Maputo Investment Developmenmt, para a vice-presidência Romão Domingos Pinto, da SOCAIL.
O Conselho Fiscal da entidade passou a ter na presidência a firma de auditoria, Ernest & Young, a primeira vogal é ocupada pela Audiconta Lda e a segunda vogal pelo Banco Comercial de Moçambique (BCI).
Do Conselho Consultivo da Câmara passaram a fazer parte as empresas: Petromoc, Manica Lands Corporation; Premier Group; JCF Procampo; Electricidade de Moçambique (EDM); COTUR (o PCA deste empresa de agenciamento de Viagens, Noor Momade, é o actual Cônsul Honorário da Indonésia em Moçambique); Pescamar e Ester Muchope (estas vão representar as áreas de exportação, importação, agricultura, serviços, transporte, indústria, pescas e transição, respectivamente).

Yusuf Ibrahim Sildky

O parceiro do general Mfumo, o zambiano Yusuf Ibrahim Sildky, comummente tratado por Iboo, está a ser procurado pela Comissão de Repressão às Drogas (DEC) para ajudá-los nas investigações de uma fraude de 29 mil dólares americanos, obtidos a partir da Assembleia Nacional daquele país, há dois anos. O dinheiro foi obtido através do sistema de Euro Cards. A referida Comissão pretende que Iboo esclareça também numa investigações sobre o roubo de bens fora da Zâmbia no ano passado, que foram encontrados na sua posse.
A investigação do Canalmoz apurou de reputadas fontes em Lusaka que Iboo há muito tempo não visita o seu país natal, furtando-se assim das autoridades.

Intratek

A Intratek foi matriculada na conservatória do registo comercial de Maputo, sob o Número Único de Entidades Legais (NUEL) 100086484. Celebraram a escritura da sociedade pela ordem: Ralph Pietersen, João Américo Mfumo (em representação da firma OCIREMA) e Yusuf Ibrahim Sildky.
O capital subscrito foi de 20 mil meticais, dividido pelos sócios nas seguintes proporções: Yussuf 51%, Ralph 26% e Ocirema 23%.
No acto da matrícula, Ralph Pietersen, apresentando o passaporte número 455536388, emitido na África do Sul, aos 29 de Setembro de 2005, declarou-se solteiro maior, sul-africano e residente neste cidade (Maputo).
Por seu turno, João Américo Mfumo, apresentando o Bilhete de Identidade número 110233175V, emitido pelo arquivo de identificação civil de Maputo, aos 19 Julho de 2001, declarou-se casado com Gertrudes Mfumo, em regime de comunhão de bens adquiridos e que actuava no acto em representação de Ocirema, com sede em Maputo, avenida Paulo Samuel Khamkomba, número 946.
Já Yussuk apresentou-se como solteiro, natural da Zâmbia, residente, portador do passaporte ZH 86422 emitido em Lusaka e que no acto do registo se encontrava “acidentalmente nesta cidade”.
Esta investigação não conseguiu encontrar o registo físico da Intratek. O código comercial em vigor em Moçambique obriga desde 2005, a que as entidades que se registem, devem, obrigatoriamente, indicar o endereço físico e posteriormente colocar nas páginas amarelas.

Reacção

Durante a investigação que resultou no presente artigo, contactámos o general que se manifestou surpreso com o manancial de informação sobre os seus parceiros na Intratek.
“Estou a ouvir pela primeira vez sobre isso”, disse Mfumo tendo acrescentado que “quando faço negócios, faço com o princípio de boa fé. Não sabia do passado desses meus sócios, mas vou procurar saber”.
No ano passado, o semanário Mail & Guardian, que se edita em Joanesburgo, dava conta que Iboo, o homem da Zâmbia, havia vencido um concurso público em Kwazulu Natal sobre a provisão de serviços de circuncisão, num processo repleto de zonas de penumbra. (Luís Nhachote)

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