Tuesday 8 June 2010

A Opinião de Jorge Ferrão

Visito Muipiti por portas e janelas. Cabaceira e redondezas. Procuro algo que nem eu mesmo sei. Estou enfeitiçado. Acho que procuro o primeiro Moçambique. Quero, eu próprio, reviver a primeira capital, descobrir porque me persegue esta impressão estranha, porém, agradável, de vasculhar a fonte de escritores, músicos, poetas. Gostaria, até, de entender os amigos do alheio que, nesta costa, desvendam tesouros que a Mãe natureza jamais permitiu que partissem.
Afinal o que tanto nos atrai e motiva?

Visitei um poço, num dia sem sol.

Não sei se foi Cabaceira Grande, Média ou Pequena. Nem importa. Fui recebido por curiosos. Como não existe mutheko (trabalho), a qualquer hora do dia ou da noite, sempre se encontram os disponíveis. Espreitam câmaras fotográficas e destrocados. Basta ser Mukhunha, e logo se colmeias, para experimentar essas línguas de longe.

O poço estava seco. Aliás, Omuipiti e Cabaceira não têm água. Sem água não há vida. Assim, dizia o ditado. Vida, porém, por aqui não falta. Em outros lugares, sem água, as pessoas dispersam. Migram. Aqui, só aumentam.
Será que vivem de água salgada?
Depois de muito papo, que eu, também, gosto, fui recebido por um jovem, idade esquecida. Era velho mesmo, mas como velho é trapo, digo que era jovem avançado. Nem esperou para saudar e cantarolou. .
Vi o Senhor a falar com aquelas Muthianas , mas vou-lhe pedir para não acreditar em nada. Essas Mulheres de Mussiro tudo que falam é mentira. Favor não acredite nelas. Aqui, eu é que sei de todas as coisas. Eu é que conheço tudo bem.
Pode deixar, meu velho, não acreditarei. Pensei para os meus botões.
Como será que ele saberia do assunto, mesmo estando distante? Ele tomou a palavra, novamente, agora com ar mais firme e de quem vasculha todos os assuntos.
- Elas falavam do Vasco da Gama.
Estas pessoas aqui da Cabaceira gostam sempre de dizer que conheceram Vasco da Gama. Tudo mentira, ninguém aqui conheceu Vasco da Gama. Eu fui o único que conheci Vasco da Gama. Ele vinha sempre buscar água neste poço. Não era aquele sem olho?
Falou com tanta certeza que eu, mesmo sem querer, acreditei. Não só acreditei, como até apertei a mão da pessoa mais idosa do mundo. Me senti privilegiado. Por isso, adoro este lugar.
Calculadas as pressas, ele deveria ter próximo de 543 anos. Depois, jogamos conversa fora. Lamentações. Ponte matou negócio de Muipiti. Deveriam destruir. Isto não é mais Ilha. Peixe tem medo de visitar as redes. Os ventos não sopram as vidas.(x)
WAMPHULA FAX – 07.06.2010

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