por Israel Kirzner
A teoria de oferta e demanda é reconhecida quase universalmente como o primeiro passo na direção de comprender como são determinados os preços de mercado e a forma como esses preços ajudam a definir decisões de produção e consumo — decisões que compõem não apenas o esqueleto, mas também a carne e o sangue do sistema econômico. A Economia Austríaca concorda enfaticamente com isso. No entanto, quando vamos apenas um pouco além da superfície da "lei" de oferta e demanda, encontramos dificuldades que levaram, direta ou indiretamente, os Austríacos a explicar a determinação dos preços de forma diferente de como ela é habitualmente apresentada, pelo menos de forma implícita. Tentarei explicar o sentido em que os Austríacos estão infelizes com as apresentações tradicionais de oferta e demanda — e no entanto em plena concordância com a ênfase genérica sobre oferta e demanda como chave da compreensão da economia.
A proposta básica
O insight básico que subjaz à lei da oferta e demanda é que, em qualquer momento dado, um preço "alto demais" vai deixar potenciais (e frustrados) vendedores com bens não vendidos nas mãos, enquanto um preço "baixo demais" vai deixar potenciais (e frustrados) consumidores sem os bens que desejavam comprar. Existe um preço "certo", com o qual todos aqueles que querem comprar conseguem encontrar vendedores dispostos a vender, e aqueles dispostos a vender conseguem encontrar compradores dispostos a comprar. Esse preço "certo" é portanto, com frequência, chamado de "preço de equilíbrio".
A teoria de oferta e demanda gira em torno da proposição de que um mercado livre e competitivo gera de fato uma forte tendência na direção do preço de equilíbrio. Essa proposição é frequentemente vista como a mais importante implicação (e premissa) da célebre mão invisível de Adam Smith. Sem nenhum controle administrativo consciente, um mercado gera espontaneamente uma tendência na direção de articular as decisões independentes de compradores e vendedores para assegurar que cada uma delas se encaixe nas decisões tomadas pelos outros participantes. Fosse levada ao limite esta tendência, nenhum comprador (ou vendedor) seria induzido a perder tempo tentando comprar (ou vender) um produto abaixo (ou acima) do preço de equilíbrio. Nenhum vendedor ou comprador pagaria (ou receberia), de fato, um preço mais alto (ou mais baixo) do que o necessário para elicitar de seu parceiro comercial o acordo de troca. Na medida em que essa proposição é válida, os mercados livres e competitivos atingem o que F. A. Hayek chamou, compreensivelmente, de uma "maravilha". Mas é em relação à validade dessa proposição (e em particular nossas razões para estar convencidos de que essa proposição é tanto válida quanto relevante) que os Austríacos diferem fortemente da economia ortodoxa dos livros-textos. E é precisamente por causa da centralidade universalmente reconhecida da proposição da oferta e demanda para toda a economia que esse desacordo é tão importante.
O papel do conhecimento
A abordagem clássica dos livros-textos a essa proposição é, de uma forma ou de outra, explicitamente ou implicitamente, baseada na presunção de conhecimento perfeito. A abordagem Austríaca não faz dessa presunção o fundamento da proposição; muito pelo contrário, os Austríacos baseiam firmemente a proposição no insight de que sua validade procede de processos de mercado colocados em movimento pelas inevitáveis imperfeições no conhecimento, que caracterizam a interação humana em sociedade.
Em certos aspectos, a visão majoritária não é absurda. Em muitos contextos, costumamos dar por certo que os seres humanos estejam cientes das oportunidades disponíveis para eles. Quando economistas acreditam, por exemplo, que um aumento de preço vai diminuir a quantidade que as pessoas compram, e uma redução vai estimular as vendas, essa crença é baseada na presunção, razoável, de que esses aumentos ou reduções de preço provavelmente se tornam de fato conhecidas por compradores potenciais, cedo o suficiente para fazer diferença.
A visão majoritária toma essa presunção razoável e a leva ao extremo, e, com efeito, à sua lógica — mas já não tão razoável — conclusão. Essa conclusão é que, em qualquer mercado livre, o preço de equilíbrio é instantaneamente (ou pelo menos, muito rapidamente) estabelecido. Se cada participante de mercado sabe o que cada outro participante está preparado para fazer (incluindo, especialmente, a quantidade que está preparado para comprar ou vender a um dado preço), segue-se que nenhum preço maior do que o preço de equilíbrio pode emergir (pois os potenciais vendedores saberiam que ficarão com bens não vendidos). Segue-se, da mesma forma, que não pode surgir qualquer preço abaixo do preço de equilíbrio (pois os potenciais compradores saberiam que ficariam sem bens que querem comprar e pelos quais estão preparados para pagar um preço maior, se necessário). A proposição de que os preços do livre mercado são portanto inevitavelmente de equilíbrio procede inevitavelmente da crença de que os preços de mercado são, com efeito, instantaneamente conhecidos por todos os potenciais participantes do mercado.
A presunção perigosa
A presunção de que todos os participantes estão sempre totalmente cientes das oportunidades de mercado nas quais podem estar interessados é muitas vezes apresentado, nas exposições majoritárias de economia, como parte da presunção da chamada "competição perfeita". A competição perfeita presume explicitamente que a onisciência universal no mercado. Uma forma de expressar a insatisfação Austríaca com o tratamento da economia ortodoxa é apontando que começar a análise de oferta e demanda presumindo que a competição é "perfeita" (no sentido de livro-texto) é não apenas ser enormemente (e inutilmente) irrealista; é, de fato, roubar a análise de todo conteúdo econômico significativo — já que os principais resultados que se busca mostrar são apenas afirmações que repetem a presunção governante com palavras ligeiramente diferentes.
Demonstrar que a interação entre oferta e demanda em um mercado livre gera uma tendência poderosa para o preço de equilíbrio é conseguir um assustador desafio analítico. Demonstrá-que em um mercado perfeitamente competitivo o único preço possível é o preço de equilíbrio é simplesmente identificar trivialmente o que já foi plantado na presunção inicial. Desenvolver as propriedades matemáticas implicadas em uma definição pode, é claro, ser uma contribuição (matemática) significativa. Mas demonstrar que em mercados livres o preço de equilíbrio é atingido restringindo a atenção analítica à situação em que esse é o único preço que se permite conceber é, em termos de análise econômico, um triunfo realmente vazio.
Esse problema que os Austríacos vêem nas discussões ortodoxas de oferta e demanda pode ser apresentado em termos um pouco diferentes. A tradicional demonstração de quadro-negro da lei procede desenhando o clássico diagrama de oferta e demanda — uma curva de demanda que vai para baixo e uma curva de oferta que vai para cima. (No momento vamos esquecer os detalhes em torno da construção desse diagrama; ele é familiar para as hordas de estudantes que já foram expostos a economia elementar.) O núcleo da análise na sala de aula geralmente consiste em discussões mostrando, primeiro, que qualquer preço de mercado mais alto do que aquele indicado pela interseção das duas curvas (isso é, mais alto do que o preço de equilíbrio) tende a produzir pressão competitiva para um declínio do preço (já que o preço alto gerará um excedente de mercadoria não vendida); e segundo, que qualquer preço de mercado mais baixo do que aquele indicado pelo ponto de interseção vai produzir pressão competitiva para um aumento do preço (já que o preço baixo gerará uma carência de bens oferecidos para venda, em relação às quantidades que os compradores querem vender).
Os Austríacos não têm nenhuma discordância séria com essas discussões em si mesmas; apenas, apontam que tais discussões são essencialmente inconsistentes com a presunção de competição perfeita (que as análises de livros-textos tomam como premissa operacional). Uma rápida análise cuidadosa da presunção de competição perfeita (que infelizmente não pode ser colocada neste espaço) basta para mostrar que sob competição perfeita não podem, na verdade existir duas curvas (a curva de demanda intersectando a de oferta). Sob competição perfeita, o diagrama de oferta e demanda encolhe instantaneamente para um único ponto — o ponto onde teria ocorrido a interseção das duas curvas (se estas tivessem existido!). Isso é o caso porque qualquer ponto em uma curva de oferta ou demanda de mercado que não é esse ponto de interseção pode ter existência analítica somente quando se suspende algumas ou todas as condições que definem o estado de competição perfeita. O diagrama (embora certamente precioso) simplesmente não é consistente com as condições presumidas sob as quais se está supostamente operando.
Nossa discussão infelizmente tem sido esmagadoramente negativa. Apontamos problemas que os Austríacos vêem com a análise de oferta e demanda ortodoxa — mas não sugerims como uma abordagem alternativa poderia evitar tais dificuldades. Artigos subsequentes tentarão preencher essa lacuna. Para os Austríacos, a lei de oferta e demanda, explicada propriamente, é pelo menos tão centralmente importante para o entendimento econômico quando na economia ortodoxa. Mostraremos como os Austríacos usam insights do caráter empreendedor dos mercados dinamicamente competitivos (os quais não encontram lugar no paradigma ortodoxo) para explicar a lei de oferta e demanda de uma forma que tenha tanto intuitiva quanto analiticamente satisfatória.
Publicado originalmente em The Freeman.
Archbishop of York 'regrets' that abuse scandal priest had role renewed
twice
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Stephen Cottrell knew former priest David Tudor had paid compensation to a
woman who says Tudor abused him as a child.
51 minutes ago
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