Tuesday 23 February 2010

A Opiniao de António de Almeida

Entre o campo e a cidade



Quando saímos do campo a caminho da cidade, temos a sensação que estamos no encalço da civilização e que lá teremos uma inserção social estável. Quando saímos da cidade para o campo, ficamos acabrunhados, amuados e desgostosos na eminência de que tudo no campo é o centro do retrocesso, é o fim do mundo, em fim é o cú de Judas.

Que pena, mas que pena mesmo, das pessoas que assim pensam que no campo há ausência de civismo e de tudo que na cidade existe.

Se todos quiserem ter um olhar como o meu sobre o conceito de civilização, perceberão que o campo é um berço das civilizações que hoje se vê nas ditas e famosas cidades; perceberão que é no campo onde há um sentido social estável e não virtual como o que se vive nas cidades. É no campo onde os homens se respeitam e sabem valorizar o estilo de vida de cada um. É no campo e não na cidade em que um homem acorda durante a noite para socorrer o seu vizinho.

Se olharmos para o campo com uma visão de vida, despertaremos dentro de nós o civismo de saber viver ou de bem viver, que é o que está em falta nas pobres mentes humanas.

As cidades estão totalmente cheias, onde as latrinas de uns são as salas de outros.

Não quero ser pessimista e para o não parecer, vou falar da minha cidade Quelimane e o resto da minha Zambézia que é um exemplo colorido.

A cidade de Quelimane está desorganizada e cheia de pessoas desnorteadas sem espaço e nem condições de habitação, mas é lá que os pensantes mutilados querem estar confinados e a urbanização incapaz nada faz para pelo menos resgatar a imagem do tempo em que os animais falavam.

Vou citar aqui alguns bairros para fazer menção a aquilo que digo.

Bairro Brandão é o exemplo de uma demografia composta por pessoas domesticáveis e indomesticáveis, unindo-se no mesmo leque ladrões, assassinos e boas pessoas. O gosto pela cidade os hipnotizou.

Muitas dessas pessoas procuraram abrigo nas cidades, porque o único espaço que a guerra encontrou para desfrutar do seu prazer de destruir e matar foi o campo; mas a guerra já acabou e as pessoas ganharam o gosto pelas cidades.

Desempregados, camponeses entre outros que só sabem lavrar a terra não quiseram voltar para o campo, pensando que há boa vida na cidade, acabaram tornando-se em cadastrados perigosos.

Hoje a cidade de Quelimane tem uma enchente acima das capacidades da própria cidade e até se vive nos mangais onde a água marítima aparece quando lhe apetece, com tanta terra que existe por ai para ser habitada e cultivada.

Hoje até um Engenheiro agrónomo quer um requinte de luxo, um gabinete com um bom ar condicionado, desligando a ficha com a sua área de formação.

Hoje, até um guarda-nocturno já não se importa em cumprir o turno, porque está feito com gatunos com os dentes afiados para dar cabo do homem honesto.

Tudo porque estamos aglomerados nas cidades e sem nada a fazer; isso faz com que nos tornamos semelhantes a velhas abutres dos desertos, que esperam que alguém caia desnorteado na areia em brasa para o seu banquete. Assim vivemos nós nas cidades esperando o sucesso do outro, para depois usurpa-lo de maneira estranha e selvática.

Se queremos viver uma maravilha, podemos viver quer na cidade como no campo e até no campo vivemos uma maravilha com todos os detalhes de uma natureza saudável.

Falei do bairro Brandão, mas não vou deixar de falar dos outros como o Mapiazua, Torrone, Coalane, entre outros que ninguém pode se quer dar uma olhada da janela é logo dado uma catanada. Todos os dias ouvimos que este ou aquele foi morto, assaltado ou raptado. Esse é o resultado do aglomerado nas cidades, onde todos pensam que existe boa vida.

No campo, dificilmente ouvimos que fulano, beltrano ou sicrano foi assaltado, morto ou raptado. Se isso acontece no campo, é porque alguém baptizado com as maldades das cidades invadiu a privacidade do homem camponês e honesto que pouco se importa se o mundo deu um avanço, se a economia mundial foi a maneta ou não, para ele, a vida anda e não para.

Hoje o campo também está a desenvolver, mas muita gente ainda pensa que se for ao campo estará voltando no tempo. Mas não; para que isso não aconteça, é preciso que você mesmo crie suas próprias condições.

No campo se quiseres, podes ter muitos canais de TV, podes escutar rádio e até podes ter internet. O que se está a passar é que as pessoas têm medo de investir quer no campo como nas cidades e só gostam de papas feitas. Deixem de ser atrasados meus irmãos, no campo a vida é muito mais gostosa que nas cidades.

Hoje as nossas florestas estão sendo destruídas indiscriminadamente, tudo porque as pessoas que acham que têm visão, já não se importam com o campo e nem com os que lá vivem.

Hoje nas cidades, se ligas a TV ou escutas rádio, ouves logo noticias sobre assassinatos, roubo e raptos, como se estivéssemos nos Texas de outros tempos ou que estivéssemos a jogar o polícia ladrão; ai o coração fica na mão, porque nem se quer sabemos de quem se trata, se é um familiar ou um amigo em fim um conhecido.

Até quando isto vai durar?

Será que os senhores do poder não vêm tudo isso?

Se todas estas falcatruas tivessem acontecido a um familiar chegado de um dos bosses esses larápios não seriam neutralizados em segundo?

Lembrem-se do Nequinha quando violou sei lá quem de um tal vice-ministro do interior.

Essa é a disparidade entre o campo e a cidade.

No campo as pessoas se preocupam com os outros e até o governo local sabe tapar as vistas do povo. Mas nas cidades, o próprio dirigente rodeado de guardas armados até aos dentes, não sabe se acordará ou não.