Wednesday 2 December 2009

PRONUNCIAMENTO DO PRESIDENTE BARACK OBAMA À NAÇÃO SOBRE O CAMINHO FUTURO NO AFEGANISTÃO E PAQUISTÃO

A CASA BRANCA

Gabinete do Porta-Voz

1º de Dezembro de 2009




PRONUNCIAMENTO DO PRESIDENTE BARACK OBAMA À NAÇÃO AMERICANA

Sobre o caminho FUTURO no Afeganistão e Paquistão


Eisenhower Hall Theatre

Academia Militar dos Estados Unidos em West Point

West Point, Nova Iorque

O PRESIDENTE: Boa noite. Corpo de Cadetes dos Estados Unidos, homens e mulheres das nossas Forças Armadas e meus compatriotas: quero falar-lhes esta noite sobre o nosso empreendimento no Afeganistão – a natureza do nosso compromisso no país, a amplitude dos nossos interesses e a estratégia que o meu governo seguirá para levar esta guerra a uma conclusão coroada de êxito. É uma honra extraordinária fazê-lo aqui – em West Point –, onde tantos homens e mulheres já se prepararam para defender a nossa segurança e representar o que há de melhor no nosso país.

Para discutir estas questões relevantes, é importante primeiro relembrar por que motivo a América e os nossos aliados foram compelidos a travar a guerra no Afeganistão. Esta guerra não foi uma escolha nossa. No dia 11 de Setembro de 2001, 19 homens sequestraram e utilizaram quatro aeronaves para assassinar quase 3 000 pessoas. Atacaram os centros nevrálgicos das nossas instituições militares e económicas. Roubaram a vida a homens, mulheres e crianças inocentes, sem considerar religião, raça ou posição social. Não fossem os actos heróicos dos passageiros a bordo de um desses voos, também poderiam ter atingido um dos grandes símbolos da nossa democracia em Washington e matado muitos outros.


Como sabemos, esses homens faziam parte da Al-Qaeda – um grupo de extremistas que distorceram e profanaram o Islão, uma das grandes religiões do mundo, para justificar a matança de inocentes. A base de operações da Al-Qaeda era no Afeganistão, onde eram protegidos pelo Talibã – um movimento implacável, repressivo e radical que assumira o controlo do país após a devastação infligida por anos de ocupação soviética e guerra civil, e após a atenção da América e dos nossos aliados se ter desviado para outras regiões do mundo.


Poucos dias após o 11 de Setembro, o Congresso autorizou a utilização de força contra a Al-Qaeda e aqueles que a abrigavam – uma autorização que continua em efeito até hoje. A votação no Senado foi 98 contra 0. Na Câmara dos Representantes, foi 420 contra 1. Pela primeira vez na sua história, a Organização do Tratado do Atlântico Norte recorreu ao Artigo 5 – o compromisso que afirma que um ataque a uma nação membro representa um ataque a todos. E o Conselho de Segurança das Nações Unidas sancionou a tomada de todas as medidas necessárias para responder aos atentados de 11 de Setembro. A América, os nossos aliados e o mundo estavam unidos para destruir a rede terrorista da Al-Qaeda e para proteger a nossa segurança comum.


Ao abrigo dessa unidade nacional e legitimidade internacional – e apenas após o Talibã se ter recusado a entregar Osama bin Laden – enviámos as nossas tropas para o Afeganistão. Numa questão de meses, a Al-Qaeda havia sido dispersada e muitos dos seus agentes estavam mortos. O Talibã foi retirado do poder e forçado a bater em retirada. Um país que vivera décadas de medo tinha agora motivos para ter esperança. Numa conferência convocada pela ONU, estabeleceu-se um governo provisório sob a liderança do Presidente Hamid Karzai e foi criada uma Força Internacional de Apoio à Segurança (ISAF) para ajudar a instaurar uma paz duradoura num país assolado pela guerra.


Posteriormente, no início de 2003, tomou-se a decisão de empreender uma segunda guerra, no Iraque. O conturbado debate sobre a Guerra do Iraque é de amplo conhecimento e não precisa de ser repetido aqui. Basta dizer que, nos seis anos seguintes, a Guerra do Iraque exigiu uma parcela dominante das nossas tropas, dos nossos recursos, da nossa diplomacia e da nossa atenção nacional – e que a decisão de ir para o Iraque causou brechas consideráveis entre a América e muitos países.


Hoje, após incorrer em custos extraordinários, estamos a conduzir a Guerra do Iraque a uma conclusão responsável. Removeremos as nossas brigadas de combate do Iraque até ao final do próximo Verão, e todas as nossas tropas até ao final de 2011. Estas acções são um testemunho do carácter dos homens e mulheres das nossas forças armadas. (Aplauso.) Graças à sua coragem, garra e perseverança, demos aos iraquianos a oportunidade de definir o seu próprio futuro e, com êxito, estamos a deixar o Iraque para o seu povo.


Contudo, não obstante os marcos alcançados com grande afinco no Iraque, a situação no Afeganistão agravou-se. Após escapar pela fronteira com o Paquistão em 2001 e 2002, a liderança da Al-Qaeda criou um porto seguro nesse país. Embora o povo afegão tenha elegido um governo legítimo, este tem sido prejudicado pela corrupção, o narcotráfico, uma economia subdesenvolvida e a insuficiência das forças de segurança.


Nestes últimos anos, o Talibã continuou a perseguir uma causa comum com a Al-Qaeda, ambos procurando derrubar o governo afegão. Gradualmente, o Talibã começou a assumir o controlo de áreas do Afeganistão, perpetrando actos terroristas cada vez mais audaciosos e devastadores contra o povo paquistanês.


Durante todo este período, os nossos efectivos no Afeganistão eram uma fracção do que tínhamos no Iraque. Quando assumi a presidência, havia pouco mais de 32 000 americanos a servir no Afeganistão, em comparação com os 160 000 soldados que tivemos no Iraque no auge da guerra. Os Comandantes no Afeganistão pediram repetidamente mais apoio para enfrentar a ressurgência do Talibã, mas os reforços não chegaram. É por este motivo que, logo após tomar posse, autorizei um pedido de longa data para o envio de mais tropas. Em seguida, após realizar consultas com os nossos aliados, anunciei uma estratégia que reconhecia a correlação fundamental entre a guerra que conduzíamos no Afeganistão e os portos seguros dos extremistas no Paquistão. Defini uma meta precisa de desintegrar, desmantelar e derrotar a Al-Qaeda e os seus aliados extremistas e assumi o compromisso de melhorar a coordenação entre as nossas iniciativas militares e civis.


Deste então, fizemos avanços no tocante a alguns objectivos importantes. Foram mortos líderes de alto nível da Al-Qaeda e do Talibã, e intensificámos a pressão sobre a Al-Qaeda no mundo inteiro. No Paquistão, o Exército nacional empreendeu a sua ofensiva mais ampla em anos. No Afeganistão, juntamente com os nossos aliados, não deixámos o Talibã impedir as eleições presidenciais, e estas – não obstante as fraudes que as tingiram – produziram um governo em conformidade com as leis e a constituição do país.


Ainda assim, persistem desafios enormes. Não perdemos o Afeganistão, mas o país tem sofrido retrocessos há vários anos. Não há ameaça iminente de derrube do governo, mas o Talibã tem ganho ímpeto. A Al-Qaeda não ressurgiu no Afeganistão com a mesma força que tinha antes do 11 de Setembro, mas continua a contar com portos seguros ao longo da fronteira. Às nossas forças falta o apoio total que necessitam para treinar eficazmente e forjar parcerias com as forças de segurança do Afeganistão e aumentar a segurança da população. O nosso novo Comandante no Afeganistão – o General McChrystal – informou-nos de que a situação de segurança é mais grave do que esperava. Em suma: a situação actual não é sustentável.


Como cadetes, apresentaram-se como voluntários para servir durante esta época de perigo. Alguns lutaram no Afeganistão. Alguns serão destacados para esse país. Como o vosso Comandante-Chefe, é meu dever adoptar uma missão que seja definida com clareza e digna do vosso serviço. É por este motivo que, após a conclusão das eleições afegãs, insisti em realizar uma avaliação aprofundada da nossa estratégia. Que não haja dúvida: nunca me foi apresentada nenhuma opção de mobilizar tropas antes de 2010, ou seja, durante esta avaliação não houve nenhum atraso ou recusa dos recursos necessários para a condução da guerra. Pelo contrário, a avaliação permitiu-me fazer as perguntas difíceis e explorar todas as diversas opções, juntamente com a minha equipa de segurança nacional, as nossas lideranças militares e civis no Afeganistão e os nossos principais parceiros. À luz dos riscos envolvidos, o meu dever perante o povo americano – e as nossas tropas – não poderia ser mais solene.


A avaliação foi concluída. E, na qualidade de Comandante-Chefe, determinei que é do nosso interesse nacional vital o envio de mais 30 000 efectivos americanos para o Afeganistão. Após 18 meses, as nossas tropas começarão a voltar para casa. Estes são os recursos necessários para assumirmos a iniciativa à medida que capacitamos os afegãos para que seja possível a retirada responsável das nossas forças do Afeganistão.


Não tomo esta decisão de ânimo leve. Fui contrário à guerra no Iraque exactamente porque acredito em sobriedade na utilização do nosso poderio militar, considerando sempre as consequências das nossas acções a longo prazo. Estamos em guerra há oito anos, incorrendo custos enormes em termos de vidas e recursos. Anos de debate sobre o Iraque e o terrorismo deixaram em ruínas a nossa unidade relativamente a questões de segurança nacional e criaram um contexto altamente polarizado e partidário para esta iniciativa. E, por acabar de passar pela pior crise económica desde a Grande Depressão, o povo americano está, compreensivelmente, concentrado em reconstruir a nossa economia e criar empregos para as pessoas no nosso próprio país.


Sobretudo, sei que esta decisão exige ainda mais de vós – militares que, juntamente com as vossas famílias, já carregam nos ombros os fardos mais pesados. Como Presidente, assinei uma carta de condolências para a família de cada americano que sacrificou a sua vida nestas guerras. Li as cartas escritas pelos pais e cônjuges das tropas mobilizadas. Visitei os nossos corajosos guerreiros feridos no Hospital Walter Reed. Viajei até Dover para receber os caixões envoltos na nossa bandeira que transportavam os restos mortais de 18 americanos que regressavam a casa para a sua última morada. Vejo em primeira mão o terrível preço imposto pela guerra. Se não estivesse convicto de que a segurança dos Estados Unidos e do povo americano estão em jogo no Afeganistão, aprazer-me-ia ordenar o regresso imediato de todas as nossas tropas.


Portanto, não, não tomo esta decisão de ânimo leve. Tomo esta decisão porque estou convencido de que a nossa segurança está em jogo no Afeganistão e Paquistão. Este é o epicentro do extremismo violento que a Al-Qaeda pratica. É daqui que provieram os atentados de 11 de Setembro e é este o local onde novos atentados estão a ser planeados neste exacto momento. Não é um perigo inerte nem uma ameaça hipotética. Apenas nos últimos meses, apreendemos, dentro das nossas próprias fronteiras, extremistas que haviam sido enviados da região fronteiriça entre o Afeganistão e o Paquistão para cometer novos actos de terrorismo. O perigo apenas aumentará se a situação na região se deteriorar e a Al-Qaeda conseguir actuar com impunidade. Devemos manter a pressão na Al-Qaeda e, para tanto, temos de aumentar a estabilidade e capacidade dos nossos parceiros na região.


É claro que este encargo não é exclusivamente nosso. Esta guerra não é apenas da América. Desde o 11 de Setembro, os portos seguros da Al-Qaeda originaram atentados em Londres, Aman e Bali. Os povos e os governos tanto do Afeganistão como do Paquistão correm perigo. E os riscos aumentam ainda mais num país com armas nucleares como o Paquistão, pois sabemos que a Al-Qaeda e outros extremistas querem armas nucleares, e não nos faltam motivos para acreditar que as utilizariam.


Estes factos compelem-nos a actuar em conjunto com os nossos amigos e aliados. A nossa meta primordial é a mesma: desintegrar, desmantelar e derrotar a Al-Qaeda no Afeganistão e Paquistão, e prevenir a sua capacidade de ameaçar a América e os nossos aliados no futuro.


Para alcançar esta meta, perseguiremos os seguintes objectivos no Afeganistão. Temos de eliminar os portos seguros da Al-Qaeda. Temos de reverter o ímpeto do Talibã e negar-lhe a capacidade de derrubar o governo. E temos de reforçar a capacidade das forças de segurança e do governo do Afeganistão para que possam assumir a responsabilidade principal pelo futuro do Afeganistão.


Cumpriremos estes objectivos de três maneiras. Primeiro, adoptaremos uma estratégia militar que travará o ímpeto do Talibã e aumentará a capacidade do Afeganistão nos próximos 18 meses.


As 30 000 tropas adicionais que anuncio esta noite serão mobilizadas no primeiro semestre de 2010 – ao ritmo mais acelerado possível – para que possam enfrentar a insurgência e instaurar a segurança nos principais centros populacionais. Aumentarão a nossa capacidade de treinar forças de segurança competentes no Afeganistão e forjar parcerias com estas para aumentar o número de afegãos no combate. Ajudarão a criar as condições para que os Estados Unidos possam transferir a responsabilidade para os afegãos.


Por ser uma iniciativa de cunho internacional, solicitei aos nossos aliados a adesão ao nosso compromisso. Alguns já contribuíram com efectivos adicionais, e temos confiança de que haverá outras contribuições nas próximas semanas. Os nossos amigos lutaram, sangraram e sacrificaram as suas vidas ao nosso lado no Afeganistão. Agora devemos unir-nos para pôr um fim vitorioso a esta guerra. O que está em jogo não é apenas um teste da credibilidade da OTAN – o que está em jogo é a segurança dos nossos aliados e a segurança comum do mundo.


No conjunto, este acréscimo de tropas americanas e internacionais permitir-nos-á acelerar a transferência da responsabilidade às forças afegãs e a retirada dos nossos efectivos do Afeganistão em Julho de 2011. Como no Iraque, executaremos esta transição com responsabilidade, tomando em consideração as condições no terreno. Continuaremos a aconselhar e auxiliar as forças de segurança do Afeganistão com o objectivo de assegurar a sua capacidade de êxito a longo prazo. Mas deixaremos claro ao governo afegão – e sobretudo ao povo afegão – que terão a responsabilidade final pelo seu próprio país.


Em segundo lugar, trabalharemos com os nossos parceiros, a Organização das Nações Unidas e o povo afegão para implementar uma estratégia civil mais efectiva, de forma a que o governo possa tirar proveito do aumento da segurança.


Esta iniciativa deve fundamentar-se no desempenho. Passar cheques em branco é uma coisa do passado. O discurso de tomada de posse do Presidente Karzai transmitiu a mensagem certa sobre a mudança de rumo. E, no futuro, seremos claros sobre o que esperamos daqueles que recebem a nossa assistência. Prestaremos apoio aos ministérios, governadores e líderes locais que combatam a corrupção e sirvam os interesses da população no Afeganistão. A nossa expectativa é de que os ineficazes ou corruptos sejam responsabilizados. Concentraremos também a nossa assistência em áreas – como a da agricultura – que possam ter um impacto imediato nas vidas do povo afegão.


Há décadas que o povo do Afeganistão é vítima de violência. Foi confrontado com a ocupação pela União Soviética e, mais tarde, por combatentes estrangeiros da Al-Qaeda que utilizaram a terra afegã para os seus próprios fins. Por essas razões hoje quero que o povo afegão saiba que a América procura pôr um fim a esta era de guerra e de sofrimento. Não temos qualquer interesse em ocupar o vosso país. Apoiaremos os esforços do governo afegão no sentido de abrir as portas àqueles talibãs que abandonarem o uso da violência e respeitarem os direitos humanos dos seus concidadãos. Procuraremos estabelecer uma parceria com o Afeganistão baseada no respeito mútuo de forma a isolar aqueles que destroem; fortalecer aqueles que constroem; fazer chegar mais depressa o dia em que as nossas tropas deixarão o país; e forjar uma amizade duradoura em que a América seja vosso parceiro e nunca vosso protector.


Em terceiro lugar, actuaremos com a plena consciência de que o nosso sucesso no Afeganistão está inextricavelmente ligado à nossa parceria com o Paquistão.


Estamos no Afeganistão para evitar que um cancro se espalhe mais uma vez pelo país. Mas esse mesmo cancro lançou raízes na região fronteiriça do Paquistão. Por isso é necessária uma estratégia que seja eficaz em ambos os lados da fronteira.


No passado, no Paquistão, houve quem argumentasse que a luta contra o extremismo não é a sua luta, e que é melhor para o país ter uma actuação mínima ou procurar acomodar-se às exigências daqueles que praticam a violência. Mas nos últimos anos, durante os quais foram mortas pessoas inocentes desde Karachi a Islamabad, ficou claro que é o povo paquistanês o mais ameaçado pelo extremismo. A opinião pública mudou. O exército paquistanês lançou uma ofensiva contra os extremistas em Swat e no Waziristão do Sul . E não há dúvida de que os Estados Unidos e o Paquistão têm um inimigo comum.


No passado, a nossa relação com o Paquistão foi muitas vezes definida de forma restrita. Esse tempo acabou. Com vista ao futuro estamos decididos a reforçar uma parceria com o Paquistão alicerçada em interesses mútuos, respeito mútuo e confiança mútua. Reforçaremos a capacidade do Paquistão de identificar os grupos que constituem uma ameaça para os nossos países e, por outro lado, tornámos claro que não podemos tolerar um porto seguro para terroristas cujo paradeiro seja conhecido e cujas intenções sejam evidentes. Os Estados Unidos estão também a direccionar recursos substanciais para o apoio à democracia e ao desenvolvimento do Paquistão. A nível internacional somos o país que maior apoio dá aos paquistaneses deslocados devido aos conflitos armados. No futuro queremos que o povo paquistanês saiba que a América continuará a apoiar vigorosamente a segurança e prosperidade do Paquistão, muito depois de as armas se terem silenciado, para que o grande potencial do seu povo possa ver-se realizado.


São estes os elementos fundamentais da nossa estratégia: um esforço militar que visa criar as condições para uma transição; um reforço civil que apoia a acção positiva; e uma parceria eficaz com o Paquistão.


Reconheço que há vários factores de preocupação relativos à nossa abordagem. Assim, debruçar-me-ei brevemente sobre alguns dos argumentos mais proeminentes que ouvi e que pondero muito seriamente.


Em primeiro lugar, há aqueles que pensam que o Afeganistão é outro Vietname. Argumentam que não é possível estabilizar o país e que o melhor é fazermos uma rápida retirada. Penso que esta argumentação se baseia numa leitura equivocada da história. Ao contrário do que se passou no caso do Vietname, temos ao nosso lado uma grande coligação de 43 países que reconhecem a legitimidade da nossa actuação. Ao contrário do que se passou no Vietname, não enfrentamos uma revolta popular de base alargada. Mais importante ainda é o facto de, contrariamente ao que se passou no Vietname, o povo americano ter sofrido um ataque violento que partiu do Afeganistão e de continuar a ser um alvo a atingir pelos mesmos extremistas que conspiram ao longo da fronteira. Abandonar essa região agora – e basearmo-nos apenas em ataques à distância contra a Al-Qaeda – diminuiria de modo significativo a nossa capacidade de manter a pressão sobre a Al-Qaeda e criaria um risco inaceitável de ataques adicionais contra a nossa pátria e os nossos aliados.


Em segundo lugar, há aqueles que reconhecem que não podemos deixar o Afeganistão no estado em que actualmente se encontra, mas sugerem que prossigamos com as tropas que já lá temos. No entanto, isso apenas manteria um status quo em que haveria uma actuação mínima e permitiria uma lenta deterioração das condições no terreno. Em última análise essa abordagem acarretaria maiores custos e prolongaria a nossa permanência no Afeganistão, pois nunca conseguiríamos criar as condições necessárias para treinar as forças de segurança afegãs e dar-lhes o espaço necessário para que assumam o controlo.


Finalmente, há aqueles que se opõem ao estabelecimento de um prazo à transição para a passagem da responsabilidade aos afegãos. Clamam até por uma escalada mais dramática e sem um fim definido do nosso esforço de guerra – uma escalada que nos levaria a assumir um projecto de construção nacional que se poderia prolongar até por uma década. Rejeito esta alternativa porque estabelece objectivos que ultrapassam não só aquilo que é possível realizar com um custo razoável, mas também aquilo que precisamos de realizar para assegurar os nossos interesses. Além disso, a ausência de um prazo para a transição anularia o sentido de urgência que deve ser a base do trabalho a realizar com o governo afegão. Deve ficar claro que os afegãos terão que assumir a responsabilidade pela sua segurança e que os Estados Unidos não estão interessados em participar numa guerra sem fim no Afeganistão.


Como Presidente, recuso-me a estabelecer objectivos que ultrapassem a nossa esfera de responsabilidade, os nossos meios e os nossos interesses. Devo ponderar todos os desafios que a nossa nação enfrenta. Não me posso dar ao luxo de dar atenção a apenas um deles. Na verdade, vêm-me à mente as palavras do Presidente Eisenhower, que – ao falar da nossa segurança nacional – afirmou: "Cada proposta deve ser avaliada à luz de uma consideração mais abrangente: a necessidade de manter o equilíbrio nos programas nacionais e entre eles”.


Nos últimos anos perdemos o equilíbrio. Não tomámos em devida consideração a ligação entre a nossa segurança nacional e a nossa economia. Na esteira de uma crise económica, muitos dos nossos vizinhos e amigos estão desempregados e têm dificuldades em pagar as contas. Muitos americanos estão preocupados com o futuro dos seus filhos. Entretanto, a competitividade no âmbito da economia global tornou-se mais feroz. Não podemos simplesmente ignorar o preço dessas guerras.


Na altura em que acedi à Presidência o custo total das guerras no Iraque e no Afeganistão aproximava-se do trilião de dólares. É minha intenção fazer face a estes custos de forma aberta e honesta. A nossa nova estratégia no Afeganistão custará provavelmente cerca de 30 mil milhões de dólares em despesas militares este ano e trabalharei de perto com o Congresso para confrontar esses custos e diminuir o nosso déficit.


À medida que vamos pondo fim à guerra no Iraque e fazemos a transição para a passagem da responsabilidade ao Afeganistão, precisamos reconstruir a nossa força a nível nacional. A nossa prosperidade constitui um alicerce do nosso poder, financia as nossas despesas militares, assegura a eficácia da nossa diplomacia, rentabiliza o potencial do nosso povo e possibilita o investimento na nova indústria. Permitir-nos-á competir neste século com tanto sucesso como competimos no século passado. É por esta razão que o envolvimento das nossas tropas no Afeganistão não pode ser ilimitado – porque a nação que estou mais interessado em construir é a nossa.


Serei claro: nada disto será fácil. A luta contra o extremismo violento não terminará rapidamente e estende-se muito além do Afeganistão e do Paquistão. Será um teste prolongado à nossa sociedade livre e à nossa liderança a nível mundial. E, ao contrário dos grandes conflitos entre as potências e das linhas divisórias claras que definiram o século XX, o nosso esforço envolverá regiões turbulentas, estados falhados e inimigos de contornos indefinidos.


Como tal, teremos que demonstrar o nosso poder pela forma como pomos fim a guerras e evitamos conflitos – e não só pela forma como fazemos a guerra. Temos que utilizar o nosso poder militar de forma ágil e precisa. Onde quer que a Al-Qaeda e os seus aliados tentem estabelecer uma base – quer seja na Somália, no Iémen ou em qualquer outro local – deve ser confrontada com uma pressão crescente e parcerias fortes.


Não podemos contar apenas com o poderio militar. Temos que investir na nossa segurança nacional pois não nos é possível capturar ou matar todos os extremistas violentos que se encontram no estrangeiro. É necessário melhorar e coordenar a nossa informação de forma a mantermo-nos sempre um passo à frente das redes de extremistas.



Será necessário desmantelar os instrumentos de destruição em massa. Por esse motivo, um dos pilares centrais da minha política externa é assegurar que elementos soltos de material nuclear não caiam em poder de terroristas, impedir a disseminação de armas nucleares e perseguir como objectivo um mundo sem elas – porque é preciso que todas as nações compreendam que a verdadeira segurança nunca advirá de uma corrida sem fim a armas cada vez mais destrutivas; a verdadeira segurança virá para aqueles que as rejeitarem.

Teremos que usar de diplomacia porque nenhuma nação pode fazer face sozinha aos desafios de um mundo interligado. Durante este ano renovei as nossas alianças e forjei novas parcerias. Forjámos também um novo começo entre a América e o mundo muçulmano – um começo que reconhece o nosso interesse mútuo em romper um ciclo de conflito e que promete um futuro no qual aqueles que matam inocentes são isolados por aqueles que defendem a paz, a prosperidade e a dignidade humana.



E, por fim, temos que nos valer da força dos nossos valores – pois os desafios que enfrentamos podem ter mudado, mas aquilo em que acreditamos não deve mudar. Assim, devemos promover os nossos valores vivenciando-os no nosso próprio país – razão pela qual proibi a tortura e encerrarei a prisão na baía de Guantánamo. É preciso tornar claro aos homens, mulheres e crianças de todo o mundo que vivem sob a opressão da tirania que os Estados Unidos defenderão os seus direitos humanos e cuidarão da luz da liberdade, justiça, oportunidade e respeito pela dignidade de todos os povos. É isso que somos. Essa é a fonte, a fonte moral, da autoridade da América.


Desde os dias de Franklin Roosevelt, e do serviço e sacrifício dos nossos avós e bisavós, o nosso país carrega um fardo especial nos assuntos mundiais. Derramámos sangue Americano em muitos países, em múltiplos continentes. Utilizámos a nossa receita pública ajudando outros a construir a partir dos escombros e a desenvolver as suas economias. Juntámo-nos a outros para desenvolver uma arquitectura de instituições – das Nações Unidas à NATO e ao Banco Mundial – que contribui para a segurança e a prosperidade comuns dos seres humanos.


Nem sempre nos agradeceram esses esforços e por vezes cometemos erros. Mas, mais do que qualquer outra nação, os Estados Unidos da América defendem a segurança mundial há mais de seis décadas – um período de tempo que, apesar de todos os problemas, viu ruir muros, abrirem-se mercados, biliões de pessoas salvas da pobreza, progressos científicos sem paralelo e o avanço das fronteiras da liberdade humana.


Contrariamente às grandes potências do passado, não procurámos dominar o mundo. A nossa união teve como fundamento a resistência à opressão. Não procuramos ocupar outras nações. Não exigiremos os recursos de outra nação, nem visaremos outros povos porque a sua fé ou etnicidade é diferente da nossa. Aquilo por que lutámos – e continuamos a lutar – é um futuro melhor para os nossos filhos e netos. E acreditamos que as suas vidas serão melhores se os filhos e netos de outros povos puderem viver em liberdade e ter acesso a oportunidades. (Aplauso.)


Como país não somos tão jovens – e talvez não tão inocentes – como éramos quando Roosevelt era Presidente. Mas somos, mesmo assim, herdeiros de uma luta nobre pela liberdade. Agora devemos invocar todo o nosso poder e persuasão moral para enfrentar os desafios de uma nova era.


Em última análise a nossa segurança e liderança não advêm apenas da força das nossas armas. Vêm do nosso povo – dos trabalhadores e das empresas que reconstruirão a nossa economia; dos empresários e investigadores que criarão novas indústrias pioneiras; dos professores que educarão as nossas crianças e do serviço prestado por aqueles que trabalham em casa nas nossas comunidades; dos diplomatas e dos voluntários do Corpo de Paz que, no estrangeiro, difundem a esperança; e dos homens e mulheres militares que fazem parte de uma linha contínua de sacrifício que tornou realidade na Terra um governo do povo, pelo povo e para o povo. (Aplauso.)



Este conjunto vasto e variado de cidadãos nem sempre estará de acordo sobre todas as questões – nem devemos estar. Mas sei, por outro lado, que enquanto país não podemos manter a nossa liderança, nem enfrentar os importantes desafios do nosso tempo, se nos deixarmos dividir pelo rancor, cinismo e partidarismo que recentemente tem envenenado o nosso discurso nacional.


É fácil esquecer que quando esta Guerra começou estávamos unidos – congregados na memória recente de um ataque horrendo e na determinação de defendermos a nossa pátria e os valores que nos são queridos. Recuso-me a aceitar a ideia de que não conseguimos engendrar novamente essa unidade. (Aplauso.) Acredito com todas as fibras do meu ser que, enquanto americanos, podemos ainda unir-nos em torno de um propósito comum, pois os nossos valores não são meras palavras escritas em pergaminho – são um credo que nos chama à união e que nos tem conduzido através das mais escuras tempestades enquanto uma nação, enquanto um povo.


América – estamos a viver um momento muito difícil. A mensagem que enviarmos no meio destas tempestades tem que ser clara: que a nossa causa é justa e a nossa resolução inabalável. Avançaremos confiantes de que o que é certo é base de poder, decididos a forjar uma América mais segura, um mundo mais seguro e um futuro que represente não os nossos medos mais profundos mas sim as nossas maiores esperanças. (Aplauso.)


Obrigado. Deus vos abençoe. Deus abençoe os Estados Unidos da América. (Aplauso.) Muito obrigado. Obrigado. (Aplauso.)


FIM

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