Thursday 10 December 2009

A Opiniao de Carlos Manuel Serra

A Opiniao de Carlos Manuel Serra
Cimeira de Copenhaga - Discutindo o destino da Humanidade

Ao regressar de Bali, depois de uma longa, rica e espantosa semana de trabalho, enquanto via o tempo a passar, durante as longas escalas nos aeroportos, bem como nas mais de 14 horas de voo, divididas em três escalas diferentes, fui pensando nas diversas lições apreendidas com os colegas e companheiros de luta de outros países, especialmente da Indonésia, que tal como nós, estão a sofrer os impactos devastadores do aquecimento global e mudanças climáticas consequentes.

Recordo-me das palavras de um líder comunitário da aldeia de Tenganan, no alto da região montanhosa da ilha de Bali, que, uma vez questionado se porventura a comunidade já estaria a sofrer os impactos do aquecimento global, respondeu em termos imediatos, claros e objectivos: “Sim, sem dúvida, a estação das chuvas inicia cada vez mais tarde, chove muito menos e as temperaturas têm vindo a bater recordes sucessivos!”

Decorre do dia 7 a 18 de Dezembro a 15.ª Cimeira do Clima, na cidade dinamarquesa de Copenhaga, que reúne 192 Estados Parte da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, tendo como grande finalidade lançar as bases para um acordo internacional que substitua o desajustado e moribundo Protocolo de Quioto a seguir a 2012 (este expira em Janeiro de 2013). Fundamentalmente, espera-se definir uma espécie de esqueleto ou estrutura fundamental de um acordo que deverá ser preparado e ultimado no decurso de 2010.

Em Quioto alcançou-se um compromisso de reduzir as emissões de gases com efeito estufa em 5,2% aos níveis de 1990, no período entre 1998 e 2002, meta demasiado insuficientes para fazer face à crente ameaça representada pelo aquecimento global. Aliás, devido às enormes divergências e interesses diferenciados, este Protocolo só veio a entrar em vigor em Fevereiro de 2005, quando se alcançou, com a ratificação russa, o número de ratificações necessárias em função das emissões de gases com efeito estufa (países perfazendo 55% do total de emissões aos níveis de 1990).

Recordo que as duas cimeiras do Clima antecessoras, realizadas na Indonésia (Bali, 2007) e na Polónia (Poztnan, 2008) não foram felizes quanto ao compromisso de reduzir as emissões de dióxido de carbono a números susceptíveis de restabelecer o equilíbrio climático, talvez porque não estavam ainda criadas as condições para alcançar o necessário consenso.

Ora, segundo o Painel Intergovernamental das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas defende que, na Cimeira de Copenhaga, se deverá alcançar um compromisso no qual os países desenvolvidos se comprometam a reduzir as suas emissões de gases de efeito estufa em 40% até ao ano de 2020, aos níveis de 1990, de modo a conseguir que o aumento da temperatura da Terra se mantenha abaixo dos 2° Célsius, limite considerado razoável para garantir a subsistência do equilíbrio planetário. E mais, até 2050, as emissões globais precisarão de reduzir para metade do que eram em 1990, de modo a evitar um aquecimento global com dimensões incomportáveis, e que seguramente poderá por em risco, irreversivelmente, as condições de habitabilidade do Planeta.

No caso dos países em vias de desenvolvimento, defende-se uma redução gradual das emissões de gases com efeito estufa, compensada devida e justamente com o aumento da ajuda internacional, através de diversos mecanismos, entre os quais se destaca, sem margem para dúvidas, o REDD (Redução de Emissões oriundas da Desflorestação e Degradação), visando a definição de “políticas e incentivos em questões relacionadas à redução de emissões provenientes de desmatamento e degradação de florestas em países em desenvolvimento”.

Para já, a expectativa em torno do evento é enorme, desde logo porque, seguramente, se alcançará o recorde histórico em conferências do género no que diz respeito à participação de chefes de Estado ou de Governo, e que foi de 105, na Conferência do Rio de Janeiro, realizada em 1992). A presença em massa das lideranças políticas em Copenhaga significa a enorme importância que o tema capitaliza, contribuindo para acreditar no sucesso do encontro. Este optimismo foi alias enfocado pela declaração de Yvo de Boer, Secretário Executivo da ONU para as Mudanças Climáticas, no Domingo, dia 6 de Dezembro, numa conferência de imprensa, ao afirmar que, em 17 anos de negociações sobre o clima, nunca houve tantas nações juntas a fazerem promessas tão firmes.

Por outro lado, várias foram as promessas de redução por parte de inúmeros países. Nota de destaque para a Alemanha, ao anunciar que reduzirá, até 2020, até 40% das suas emissões aos níveis de 1990, bem como para a Noruega e o Japão, com metas de 30% e 25%, respectivamente, no mesmo horizonte temporal.

Em termos de organizações internacionais, surge na dianteira a União Europeia, que anunciou, na pessoa do Presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, ser pouco provável comprometer-se a um limite superior a 20% de reduções, caso outras nações e organizações não assumam obrigações de natureza idêntica. Se o fizerem, a União Europeia poderá comprometer-se a reduzir as suas emissões até 30%.

Os Estados Unidos de América, que não ratificaram o Protocolo de Quioto, levam para Copenhaga o compromisso de reduzir as suas emissões de dióxido de carbono em 17% aos níveis de 2005, meta considerada insatisfatória para muitos, tratando-se de um dos maiores poluidores e aquecedores do Planeta (ocupam presentemente o 2. ° lugar, imediatamente a seguir à China).

No que diz respeito aos países em ascensão, uma nota de destaque para a China e para a Índia, os dois países mais populosos do mundo, cujos governos anunciaram que irão providenciar, voluntariamente, a redução da intensidade das emissões de carbono por unidade de PIP (produto interno bruto) aos níveis de 2005 em 40-45%, no primeiro caso, e 20-25%, no segundo caso. O Brasil, por seu turno, não só anunciou que irá reduzir até 38.9% das suas emissões até ao ano de 2020, como ainda levou consigo, para Copenhaga, a apresentação de 18 projectos em curso referentes ao mecanismo de financiamento REDD, a titulo de modelo, sendo que 16 referentes à floresta da Amazónia e 2 sobre a Mata Atlântica. Finalmente, temos o caso da África do Sul, que anunciou o compromisso de reduzir as suas emissões em 1/3 até 2020.

Pela positiva, Copenhaga ficará certamente para a história pelo número de participantes e de compromissos individuais na luta contra as mudanças climáticas; resta saber se, como resultado final, não se saldará em mais um fracasso, adiando, mais uma vez, o tão necessário e fundamental consenso na redução de gases com efeito estufa. Para já, um compromisso de 20% por parte dos países desenvolvidos constitui uma meta demasiado baixa e desajusta, fazendo recear a subida da temperatura, um agravamento dos fenómenos climáticos extremos (secas, inundações, terramotos, ciclones), do aumento do degelo e do nível das águas do mar, da redução da biodiversidade, especialmente nos países do hemisfério Sul, no qual Moçambique se encontra.

Naturalmente que em Copenhaga não estará em discussão a essência da questão – o modelo económico actualmente dominante, de tendência neo-liberal, e que assenta na maximização do lucro, no endeusamento do consumismo (ainda que do meramente supérfluo e/ou acessório) e do esbanjamento, no enfoque cada vez maior na especulação em vez da produção, da liberalização, na desregulação das trocas comerciais e na privatização crescente do Estado, o que contribuiu sobremaneira para o aumento global e exponencial da pobreza, por um lado, e dos danos ambientais, por outro lado. Não sendo em Copenhaga, em algum momento se terá que equacionar verdadeiramente a construção de uma nova ordem económica mundial, pois a actual já demonstrou, seguramente, estar em crise e ser altamente prejudicial para o Planeta, para a humanidade e para todas as demais espécies.

Regressando a Bali, recordo-me da importância que, para o Hinduísmo, representa o número 3, e que, em linhas muito gerais, significa o respeito para com o Criador, o respeito para com o ambiente e o respeito para com os demais seres humanos. Talvez devêssemos todos apreender um pouco mais com os praticantes desta religião…

Carlos Manuel Serra
Texto 'emprestado do blog do Professor Carlos Serra, http://oficinadesociologia.blogspot.com/.
Posted by MANUEL DE ARAÚJO at Thursday, December 10, 2009 0 comments

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