Friday 14 August 2009

A Opiniao do Noticias

Editorial

ESTA semana foi, definitivamente, marcada por uma estranha visita do presidente malawiano, Bingu Wa Mutharika. E, por muitas voltas que se dê ao assunto e se use uma lustrosa linguagem diplomática, dificilmente se pode desassociar os insólitos actos por ele praticados em solo moçambicano, atípicos de uma visita de Estado, do seu desconforto circunstancial derivado da invasão e destruição do posto fronteiriço de Caloca em Ngaúma na província do Niassa. Nem no último dia da sua partida conseguiu dar uma explicação plausível da atitude de seus policiais. Maputo, Sexta-Feira, 14 de Agosto de 2009:: Notícias
Vamos explanar a nossa reflexão, primeiro sobre os actos de praxe condizentes com um programa de uma visita oficial, que não aconteceram, em segundo lugar estabelecer a relação com o incidente de Ngaúma com o estranho comportamento de Wa Mutharika em Maputo com relação ao assunto e por fim lançarmos um brevíssimo olhar sobre os interesses mútuos da cooperação bilateral.

Wa Mutharika foi recebido na segunda-feira com pompa e circunstância por Armando Emílio Guebuza, para cumprir um programa previamente anunciado à Imprensa. Neste contexto devia ir a Beira no dia seguinte, onde Malawi tem interesses económicos. Beira se engalanou ao ritmo usual das batucadas de circunstância. Até o clero lá esteve no aeroporto. Gastou-se tempo e dinheiro e o bom do presidente malawiano não desembarcou do avião porque nunca saiu de Maputo. No terceiro e último dia, não foi ao Instituto de Investigação Agronómica de Moçambique e não teve programa que se conheça. Foi anunciada uma partida de regresso antecipada mas, atrasada em três horas, porque alegadamente, o avião que o trouxe e parqueado há dias em Mavalane, “zona libertada da humanidade” estava avariado. Da África do Sul veio outro avião e lá seguiu de regresso deixando para trás explicações inconsequentes.

Não temos a intenção de fazer uma tempestade em um copo de água. E, por isso, tratamos o assunto de Ngaúma como um incidente. Aborrecido, provocatório, que fere a nossa auto-estima mas, de facto, devia ser apenas um incidente. Mesmo compreendendo que cidadão nenhum aceita com indiferença receber informações de que forças estrangeiras fardadas e armadas cruzaram a fronteira, lançaram gás lacrimogéneo em assalto a um posto de guarda fronteira e destruíram armamento.

Partindo deste pressuposto, o que esperávamos, no quadro de boa vizinhança era ouvir do vizinho-chefe ou de sua delegação, no primeiro dia da visita, alguma explicação pública e quiçá, um pedido de desculpas. Mas, nada. Nosso espanto foi ouvir de Wa Mutharika no seu acelerado regresso, que ele só tomou conhecimento do assunto em Maputo, portanto sete dias depois de o acto provocatório ocorrer. E, quando pensávamos que já estávamos suficientemente estupefactos, eis que brinda-nos com a insólita justificação de que não foi a Beira porque precisou de ficar em Maputo ao telefone para estabelecer contactos com as suas instituições para receber informações preliminares sobre o que aconteceu em Ngaúma. Assim mesmo!

Seja como for, o que Wa Mutharika fez no aeroporto através de suas declarações, intencionalmente ou não foi, efectivamente, em nosso entender, ele próprio estabelecer um nexo entre os acontecimentos atípicos que rodearam a sua visita a Moçambique e o incidente de Ngaúma. Um incidente que as autoridades malawianas, por razões que ainda desconhecemos, o subestimaram bastante e que presumimos que terá gerado frio na diplomacia silenciosa que rodeou esta visita.

Mas serviu, acima de tudo, infelizmente e despropositadamente, para reavivarmos a memória sobre os longos e tristes momentos históricos da nossa relação de vizinhança que atravessam o período colonial, os constrangimentos inerentes à guerra de libertação de permeio o “apartheid” e a guerra de desestabilização, quebrados somente no período pós-Kamuzu Bana, no tempo de Bakili Muluzi, hoje vilão naquele país por razões que não nos interessam aqui abordar.

Pois bem. Cá entre nós. Se a ideia é reforçar a fronteira contra o contrabando de ouro, pedras preciosas e a demanda informal de milhares de toneladas de milho que anualmente atravessam a fronteira a partir de Angónia, Tsangano, Milange e Mandimba que o façamos de forma bastante séria para que não nos invadam e destruam nossos postos fronteiriços enquanto cozinhamos.

Finalmente, aguardamos pela promessa pública de Bingu Wa Mutharica de brevemente fornecer explicações sobre o incidente para que isso não assombre as relações bilaterais. Ambos os países têm interesses económicos estratégicos em relação aos quais, sobretudo a população de Malawi, nossos irmãos vizinhos, não devem ficar prejudicados. É preciso viabilizar o porto de Nacala, a linha-férrea, o porto da Beira para que os malawianos vivam melhor e Moçambique ganhe dinheiro. A intenção do canal fluvial “Chire-Zambézia” tem que simbolizar essa boa vizinhança desejável.
Maputo, Sexta-Feira, 14 de Agosto de 2009

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