Lei sobre Violência Doméstica transforma todo homem em diabo
O legislador apenas penaliza o homem e não considera no seu texto que a mulher possa também ser protagonista da violência doméstica. A lei apenas, explicitamente, fala do homem como agressor, esquecendo que um lar é constituído por homem e mulher e que qualquer um deles pode ser agressor. É que apesar de ser comum o homem violentar a mulher, não deixa de ser verdade que nos dias que correm, homens há, que diariamente sofrem, igualmente, violência protagonizada pelas respectivas companheiras, sobretudo na sua vertente psicológica. A actual lei passa por cima desse fenómeno. Considera, unicamente, o homem como único protagonista da violência doméstica.
Maputo (Canal de Moçambique) – O homem que violentar a mulher com a qual convive ou conviveu, seja ela sua esposa, com qual esteja oficialmente casada, unidos factualmente, ou até que tenha mantido simples relações amorosas com ela, pode ser retirado da sua casa sem direito a levar consigo nenhum bem imóvel da residência.
A decisão é tida como uma medida cautelar de entre várias estatuídas na Lei de Violência Doméstica contra a Mulher aprovada ontem na generalidade pela Assembleia da República, diga-se, por unanimidade e consenso de ambas as bancadas.
Outras medidas cautelares, alegadamente, contra a violência doméstica contra a mulher são a “suspensão do poder parental, tutela e curadoria do agressor no âmbito das relações domésticas; proibição do agressor de celebrar contratos sobre bens móveis e imóveis comuns; garantir o regresso seguro de mulher que foi obrigada a abandonar a sua residência por razões de segurança”, entre outras.
O que diz a lei
A lei em referência não penaliza somente a violência física contra a mulher. Penaliza igualmente a violência psicológica; moral; sexual; patrimonial e; social. (artigos 13 a 19). A lei contém glossário que define cada tipo de violência referida. Por exemplo, define a violência sexual como sendo “qualquer conduta que constrange a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que induza a comercializar ou utilizar de qualquer modo a sua sexualidade; que impeça a usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimónio, à gravidez, ao aborto ou a prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; que limite ou anule o exercício dos seus direitos sexuais reprodutivos”.
Homem como agente infractor
As primeiras 3 alíneas do artigo 5 da lei em referência definem o homem como sendo o agente da infracção da violência doméstica. “A violência doméstica contra mulher pode ser praticada pelo homem com quem está ou esteve unida por casamento; pelo homem com quem vive ou viveu em união de facto; pelo homem com quem tem ou teve relações amorosas”, lê-se na lei.
A alínea d) do mesmo artigo define “qualquer pessoa unida com ela por laços familiares” como sendo possível agente infractor da violência doméstica contra a mulher.
Como se nota, a lei não admite a possibilidade da penalização da mulher que violenta o seu marido.
Penas agravadas
Como penalização da violência cometida contra a mulher, a lei que passou ontem no Parlamento estabelece no seu artigo 7 que “em todos os crimes cometidos no âmbito desta lei as penas são elevadas a um terço nos seus limites mínimo e máximo”.
É ainda penalização dos mentores e actores da violência doméstica contra a mulher, a obrigação de prestação de trabalhos a favor da comunidade.
Lei “controversa”
A lei ontem aprovada é tida como controversa por alguns círculos de opinião, pelo facto de, por um lado definir o homem como exclusivo agente da infracção - violência doméstica -, e por outro, não prever a penalização da violência contra o homem praticada pela mulher, o que tem acontecido com bastante frequência ultimamente. Dados estatísticos oficiais confirmam que inúmeros homens são hoje em dia espancados pelas respectivas esposas ou companheiras, mas nem isso valeu para que a lei seja explicita sobre este tipo de casos.
Há violência contra homem
De acordo com dados da PRM em Manica, só para dar um exemplo, “de Janeiro a Março de 2008, 155 homens denunciaram maus-tratos perpetrados pelas suas mulheres, que resultaram em agressões físicas, violência sexual, expulsão de casa e submissão a trabalhos forçados”. E de Janeiro a Março de 2009, segundo a mesma fonte, “185 queixas deram entrada no Gabinete de Atendimento à Mulher e Criança Vítimas da Violência Doméstica” (GAMCVD), da Polícia da República de Moçambique (PRM) em Manica.
Ao que tudo indica, apesar destes dados que relatam somente acontecimentos de uma só província – do total de 11 existentes no País - o legislador achou que ainda altura não é altura de incluir a violência doméstica contra o homem nos crimes que merecem uma penalização mais severa e plasmada em lei específica.
O lei ontem aprovada foi proposta pela Comissão parlamentar dos Assuntos Sociais, do Género e Ambiente (CASGA), em parceria com diversas organizações femininas nacionais e Liga dos Direitos Humanos. Foi previamente debatido exaustivamente nos mídias e noutros círculos sociais, mas sempre faltou consenso quanto aos pontos controversos acima referidos.
Outras leis aprovadas pela AR
A AR aprovou ainda ontem, em definitivo, o projecto de Lei de revisão do Estatuto da Ordem dos Advogados de Moçambique; a Lei da Revisão da Lei do Ensino Superior; e a proposta da Lei da Aviação Civil, na generalidade.
Encerramento adiado
Mais uma vez a comissão permanente da AR decidiu adiar o término da presente X Sessão, que esteve inicialmente previsto para sábado passado dia 27, tendo depois passado para hoje dia 30. Agora já não termina hoje. Está previsto que finde só no próximo dia 20 de Julho. A justificação da comissão executiva é de que é preciso dar mais tempo às comissões de trabalho para analisarem profundamente as propostas e projectos de lei que o plenário da AR deve aprovar. As sessões plenárias serão interrompidas a partir do dia 1 de Julho até ao dia 10 do mesmo mês.
(Borges Nhamirre)
2009-06-30 06:01:00
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