FUNGULAMASO: Guebuza e Chissano: a competição
Escrito por Carlos Serra
O “Magazine Independente” desta semana reportou que o consórcio TIKO, da Fundação Joaquim Chissano, comprou uma empresa de nevagação aérea.
Esse tema levou-me a recordar aqui um pequeno trabalho que publiquei em Janeiro no meu blogue.
Se formos à base de dados Hermes da Pandora Box, vamos saber que as dinastias de Chissano (foto do lado esquerdo) e de Guebuza (foto do lado direito) estão em múltiplas empresas. Os dados do Africa Confidential, do Africa Intelligence e do Indian Ocean Neusletter também mostram isso.
Essas duas dinastias são como que dois sistemas solares regidos por um êmbolo, a Frelimo, pois Chissano e Guebuza são figuras tutelares do partido.
Uma hipótese: em cada um dos sistemas solares, giram planetas e cometas empresariais, regidos pela força de gravitação clientelista e por laços de partilha de respeito, hierarquia e vassalagem. Cada um dos sistemas solares contém múltiplos elos dos mais variados tipos, múltiplas argamassas, são como que rizomas, tentáculos poderosos. Querer criar uma rede empresarial em Moçambique implica conhecer bem as regras do jogo ou as regras dos jogos nos dois sistemas solares. Implica conhecê-las e aceitá-las. Fora das órbitas dos dois sistemas, fora do apoio político do partido Frelimo, a independência empresarial é difícil, creio, especialmente se visar também um sistema solar, autónomo.
Por hipótese, as duas dinastias serão — se não são já — as dinastias empresariais hegemónicas do país dentro de cinco a dez anos, com poderosos impérios distribuídos pelos mais variados tipos de actividade e de partilha de acções, ainda que eu ignore qual o seu raio de acção ao nível do capital bancário. E ainda que ignore, também, se há zonas de conflito entre os dois sistemas solar-empresariais.
Mas há um outro tipo de capital a ter em conta: o capital político-prestigial.
Aqui, com muitos mais anos de proeminência e de visibilidade, Chissano talvez leve vantagem sobre Guebuza. Considerado percutor da democracia liberal no país, construiu e foi construído como um gestor do equilíbrio político, do meio termo, como um elegante homem de diálogo cuja acção e cujo impacto ultrapassaram, há mais de 30 anos, as fronteiras do nosso país. Sistematicamente chamado para ser negociador-chefe em vários conflitos internacionais, Chissano viu o seu percurso político consolidado com o prémio Mo Ibrahim. Poderá, um dia, vir a ser o presidente da União Africana. É como se — permitam-me a imagem — tivéssemos dois presidentes: o interno (Guebuza) e o externo (Chissano), o nacional e o internacional.
Quanto a Guebuza, ele tem por agora apenas, creio, um papel nacional, o do presidente do país. Não sei se o seu papel nos acordos de paz de Roma foi e é decisivo para lhe dar o selo de estadista internacional no género de Chissano. Bem mais carismático do que Chissano, bem mais interventor, milenarista, desejoso de criar um Moçambique diferente, Guebuza é, como já aqui um dia escrevi, uma espécie de espírito de Samora enxertado no corpo de Chissano actuando no neo-liberalismo. É, se preferirdes, um neo-samoriano de um período histórico distinto do de Samora Machel.
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