A Opinião de Celso Manguana*

Do livro «Pátria Que Me Pariu» às contas da Sarita

Maputo ( Canal de Moçambique) - Ontem, o autor destas linhas teve a certeza mais que absoluta que a poesia é uma disciplina menor. Não que não me tivesse apercebido antes. Tentou acreditar no que não se apercebia.
Vou contar a Estória: um dia, deve ter sido por acaso, estou a fazer uso da minha humildade, escrevi um livro cujo título é " Pátria que me Pariu". Porque o livro era premiado, pelo FUNDAC, tive direito, para além da edição, a 250 exemplares, de que mais de metade ofereci a alguns amigos. Outros vendi também a meus amigos. Há amigos, e amigos.
Bom, a Sarita! O propósito destas linhas, foi o seguinte: a Sarita, de todas as pessoas a quem ofereci, ou vendi o livro, muito provavelmente, foi a pessoa que deve ter feito melhor uso do livro.
Quem é a Sarita? Trabalha numa barraca onde eu sou cliente habitual.
Qual é a estória? Tão simples como isso, tenho a impressão que das pessoas a quem ofereci ou vendi o meu livro, a moça deve ter sido a pessoa que melhor fez uso dele.
Pronto, a Sarita, a quem ofereci um livro, usou os espaços em branco, entre os poemas, para fazer as contas dos muitos seus clientes na barraca. Confesso que é o único livro que tenho. Raptado à Sarita.
A partir da Sarita deu-me para pensar nos muitos livros que ofereci e, devem servir não só para fazer contas, mas mais. Talvez para acender lume, outro, talvez, para disfarçar a falta de papel higiénico. E quantos os têm nas estantes sem o terem lido?
Coitado de mim que pensei que um livro de poesia servia para muito mais.
Eu que acreditava que a literatura era uma carreira.
Mas a Sarita ensinou-me uma lição bonita: No próximo livro, aumento a quantidade de páginas brancas, nem que seja para também aumentar a quantidade de vales que a Sarita me pode dar. Porque afinal, a poesia não dá tanto assim.

(Celso Manguana)
(*) 1º Primeiro Prémio Fundac «Ruy de Noronha» de Literatura.