Tuesday, 23 September 2008

MILITARIZACAO DA POLICIA: UM PERIGO AO RESPEITO DOS DIREITOS HUMANOS


Temos vindo a assistir com alguma preocupacao a militarizacao da nossa policia. Desde 1977, que a nossa policia, que por alguma razao nao se chama exercito, tem estado a ser tomada de assalto por militares. Se nos primordios da independencia nacional, quando esta area era dirigida pelo actual Chefe de Estado, na sua qualidade de Ministro da Administracao Interna, esta tendencia poderia ter alguma explicacao, exiguidade de quadros e a necessidade de 'afectar' combatentes da luta armada, pensamos nos que nos dias que correm ja nao se justifica.

Em 1992, com a assinatura dos acordos de paz entre o governo e a entao guerrilha, a Renamo, assistimos com alguma estupefaccao e perante o olhar cumplice da sociedade civil e da comunidade internacional a um segundo ciclo da militarizacao da nossa policia. Porque os Acordos de Roma previam a partilha do comando quer no exercito, quer na marinha quer na forca aerea, o regime decidiu colocar estrategicamente varios militares na policia, transformando a nossa policia num verdadeiro exercito camuflado. Precavendo-se assim para o que desse e viesse. Os estrategas da guerrilha ou nao viram esse tiro de mestre ou entao fizeram ouvidos de mercador e engoliram a isca. A capacidade ofensiva das FADM foi entao a luz desta manobra transferida a policia com todas as consequencias que dai possam advir.

Nos pos-guerra, a subida de Almerino Manhenje para os comandos dos Assuntos de Seguranca na Presidencia da Republica de Joaquim Alberto Chissano e a sua nomeacao para cumulativamente dirigir o Ministerio do Interior, que no nosso pais superintende a nossa policia, foi a face mais visivel desse esforco de consolidacao do pensamento, visao, estrategia, disciplina e tactica militar na nossa policia.

Quando esperavamos uma mudanca de comportamento, e perante o silencio cumplice quer da sociedade civil quer da comunidade internacional, eis que no governo de Armando Emilio Guebuza vimos esta tendencia a reforcar-se, com a nomeacao para o cargo de vice-Ministro do Interior, de um militar de carreira. Como se isto nao fosse suficiente, vimos recentemente a nomeacao do ex-comandante da Forca de Intervencao Rapida (FIR), artificial e convenientemente chamada de Policia de Intervencao Rapida (PIR), para a provincia de Sofala (epicentro da oposicao), e eis que o 'Noticias' de hoje, nos bafeja com uma outra noticia: a nomeacao por Jose Pacheco de mais um militar, Alfredo Mussa, a frente da nossa policia na nossa linda, pacata mas apetitosa provincia de Inhambane!

Porque e que nos preocupa a militarizacao da policia?

A primeira razao tem a ver com as funcoes de uma e de outra. Aos militares cabe a honrosa tarefa de proteger a soberania nacional, dentro e fora do territorio nacional, com accoes quer ofensivas, defensivas, de accao ou de persuasao. O alvo dos militares e muitas vezes e latu sensu o 'inimigo externo'! E para essa missao, a formacao, os treinos, a doutrina, a visao estrategica, a tactica, a disciplina, o fardamento, os meios, os instrumentos incutidos e postos a disposicao aos militares devem ser diferentes dos postos a disposicao da policia.

A policia cabe a missao de fazer cumprir a Lei e a Ordem. Manter a paz interna e subordinar-se aos dictames da Constituicao da Republia e das decisoes das Magistraturas quer da PGR quer Judicial e outra. Para cumprir cabalmente com essa nobre missao os treinos, a formacao, a doutrina, a visao estrategica, a tactica, a disciplina, o fardamento, os meios, os instrumentos incutidos e postos a disposicao da policia devem ser diferentes aos fornecidos ao militares.

Normalmente, pelo facto de a natureza do alvo ser diferente, por exemplo, a policia nao deve usar armas de guerra, vulgo AKM, pois essa arma foi fabricada para 'eliminar' o adversario. A policia, ao disparar, a prior, tem como objectivo nao eliminar de per si o alvo, mas sim imobiliza-lo para que possa ser levado ao juiz, que e a unica pessoa num estado de direito que tem o direito de julgar e quica de condenar.

Quando o policia usa uma AKM e dispara contra um suspeito, tirando-lhe a vida por hipotese, esse policia, salvo o excepcionalmente permitido por legislacao internacional e nacional (quando se esta perante um caso em que esta em perigo a vida do policia ou de outras individualidades), esta a colocar-se nao apenas na posicao de policia, mas tambem a usurpar os poderes decisorios e condenatorios do juiz. E mais, esta a violar duplamente a Constituicao da Republica, a nossa Lei Mae, porque esta a aplicar uma sentenca a um suspeito,sem lhe dar a oportunidade de defesa e pior ainda, esta a aplicar uma pena proibida na nossa Constituicao, e por consequencia nao prevista na nossa Lei Penal, a Pena de Morte, violando varias convencoes internacionais de que o nosso estado e membro!

Ao policia se exige que na nossa actuacao se guie e respeita varias regras e principios, onde reina e impera o 'principio da proporcionalidade', ou seja que a forca que o policia for a usar para 'desmobilizar' o suspeito, nao deve ultrapassar o estritamento necessario, deve ser quando muito proprorcional ao perigo real ou hipotetico. Ou seja, o policia nao deve por exemplo partir o braco de um jovem so porque apanhou este a roubar um rebucado, ou dar um tiro num par de jovens, so porque os apanhou a fazerem amor na via publica ou na praia!

Que saiba, nao se ensina e nem se exige tal regra aos militares nas suas accoes contra o seu alvo. Pelo contrario, pelo pouco que sei, a 'maximizacao do dano' ao inimigo, causando o maior numero de baixas possivel, parece ser o apanagio dos militares.

Como podemos ver estas duas formas de pensar, de estar e de agir sao no minimo contraditorias. Quando colocamos um militar na policia sem a formacao necessaria, e com um armamento de guerra, o que podemos esperar a prior, e que ele tente 'maximizar o dano' no suspeito, dai nao nos surpreender, quando a nossa querida irma, Alice Mabota ou o mano Custodio Duma nao se fartam de gritar aos quatro ventos de que 'o Estado mocambicano e o maior violador dos direitos humanos'!

E mais, ao policia se exige o conhecimento senao pormenorizado da Lei Mae e de outra legislacao avulsa, pelo menos um conhecimento razoavel, pois ele deve obediencia a Lei, o que a prior nao e tao comum exigir-se tanto aos militares em combate (ha normas internacionais que regulam as actividades dos militares no campo da batalha), apesar de o seu conhecimento ser obrigatorio a qualquer cidadao que se preze.

E porque ultimo, dizer que a militarizacao da policia afecta a moral dos policias de carreira, pois eles tambem almejam a subir a posicoes de lideranca nas areas em que se especializaram! Nenhum geologo gostaria de ter um agronomo a ensinar-lhe como classificar uma rocha, do mesmo modo que nenhum agronomo gostaria de ter um pedreiro a ensinar-lhe a plantar batatas!

Poderiamos dar mais razoes, mas achamos que estes exemplos sao suficientes para ilucidar a razao porque nos preocupa a militarizacao da nossa querida policia!

Um abraco Patriotico,

E tenho dito,
MA

Inhambane com novo comandante da Polícia

O MINISTRO do Interior, José Pacheco, empossou ontem, em Maputo, um militar para comandante da Polícia a nível da província de Inhambane. Trata-se de Alfredo Mussa, coronel das FADM, que recebeu das mãos de Pacheco a patente de adjunto de comissário da Polícia. Mussa substitui neste cargo José Naftal.

Não foram avançadas as razões que forçaram a cessação de funções de Naftal, muito menos a sua nova colocação. Falando momentos depois de patentear e empossar o novo comandante da Polícia em Inhambane, Pacheco disse que a expectativa é de que Mussa irá usar de todo o seu saber e experiência acumulados para dignificar a classe de membro das Forças de Defesa e Segurança, particularmente da Polícia da República de Moçambique (PRM).

Segundo Pacheco, a indicação de Mussa para este cargo é reconhecimento do engajamento positivo que demonstrou no cumprimento de várias missões que até hoje lhe foram conferidas – (AIM)

2 comments:

Anonymous said...

Definitivamente estamos mal. Nao sabemos quais sao os objectivos, e nem o que esta por detras desta militarizacao da policia, mas esta abre um grande espaco para frustracao de policias de carreira com todas as consequencias que ja conhecemos.
Sera que toda a turma que foi a Nachingweia em 1974 para formar o Corpo da Policia de Mocambique e fraca e incompetente??
Sera que as diversas turmas que foram a RDA e Cuba formarem se na area de policia nao servem??
Sera que das turmas de Portugal, alem da competente (mas tambem bonita)General Arsenia Massingue nao se aproveita mais alguem??
Um dos argumentos que justifica a entrada dos militares na policia e o rigor e disciplina que estes possuem contrastando com a anarquia que reina na policia.
Agora, quem podera melhor por fim a anarquia? o dono da casa ou o visitante em comissao de servico????

Anonymous said...

Gostei deste artigo.Ilucida e, muito bem, a quem ainda não via a seriedade do assunto.