Tuesday, 9 September 2008

Académicos e jovens analisam o impacto da globalização na cultura moçambicana


No Museu Nacional de Arte

"Um dia, eu e um grupo de estudantes percorremos 11 creches em Maputo das 7 às 11 horas e constatamos que nessas creches, sem excepção, as crianças ficam a ver telenovelas ao lado das titias com o comando na mão a percorrer canal por canal. E estamos falando de moldar pessoas" – Tomás Vieira Mário, Presidente do MISA-Moçambique "Não vou negar, existe sim muita música jovem sem conteúdo e sem mensagem. Ela não tem qualidade porque o país é pobre e nós não temos condições para gravar no estrangeiro onde há estúdios de qualidade" – Dama do Bling, cantora moçambicana

Maputo (Canal de Moçambique) – O Museu Nacional de Arte realizou no fim da tarde da última quinta-feira (04.09.08), um debate subordinado ao tema «Cultura e os Desafios da globalização». O encontro que tinha como convidados Mia Couto, Tomás Vieira Mário e o professor Doutor Lourenço do Rosário como oradores, foi bastante concorrido. Concorrido não terá sido pela presença dessas figuras, mas porque ao lado delas estava a famosa cantora moçambicana Ivania, vulgarmente conhecida por Dama do Bling, cuja musica é considerada por certos críticos como “sem conteúdo e sem mensagem”.
Dama do Bling, igual a si mesma, segundo Lourenço do Rosário, na sua intervenção depois de Mia Couto, impressionou os convidados e os jovens presentes no debate pela forma como defendeu a actual forma de a juventude fazer música.
Não faltaram palmas. Mas todas as cabeças se puseram a abanar. A razão foi que ela, sem papas na língua, disse que "a nossa música é chamada de alienada, desvalorizada, sem conteúdo e sem mensagem, tendo em conta aquilo que são os nossos valores culturais", porque "actualmente estão a nascer novos valores".
"A música e os vídeos clipes que foram feitos há dez anos não podem ser os mesmos com os actuais. Nós os jovens não nos podemos basear naquilo que foi há vinte anos porque estaríamos a morrer", disse peremptoriamente para de seguida acrescentar que "sublinho estaríamos a morrer".
Entretanto, a irreverente Dama do Bling, como ela já se intitulou, viria ainda a referir que "eu tenho 28 anos e daqui a 2 anos não poderei fazer o que faço hoje. O que adianta ficar cinco meses a tentar fazer uma música se posse fazê-la em uma semana com base no computador e na internet? Quem vai negar a genuinidade e qualidade da minha música se a novas tecnologias me permitem fazer isso?", indagou ela.
A um dado passo, Do Bling, disse sem evasivas que "eu vivo de música e vou fazer tudo o que for possível para vender o meu peixe. Nunca vou fazer uma música virada para os tempos passados porque não podemos negar o futuro e o progresso", disse.
"Não vou negar, existe sim muita música sem conteúdo e sem mensagem porque o país é pobre e nós não temos condições para gravar no estrangeiro onde há estúdios de qualidade". "A música que nós fazemos é para fazer as pessoas sonharem. Porque é que vamos estar toda a hora a falar do sofrimento e a mostrar estradas esburacadas", disse, finalmente reconhecendo que algumas músicas actuais feitas pela juventude, não poucas vezes, para além de desinformam à sociedade, constituem um atentado ao pudor. Alias, o próprio Mia Couto exemplificou que a música “maboazuda”, do cantor Zico da Silva, "é imoral".
De referir que a interlocutora apontou também que a falta de conteúdo e mensagem nas músicas da juventude, algo que faz com que se diga que "os valores culturais estejam ameaçados", se prende com a "falta de patrocínio por parte do Governo e dos empresários".
Sobre o mesmo assunto, Lourenço do Rosário entende que "é preciso que o Governo regulamente a lei do mecenato de modo que interesse aos empresários que constituem a chave do patrocínio das acções culturais em Moçambique".

Moçambique não tem política cultural de informação

Enquanto isso, o presidente do MISA-Moçambique, Tomás Vieira Mário, considera que no País, os órgãos de informação anda não desenharam na sua missão uma política cultural de informação com vista a transmitir valores, educando dessa feita à sociedade.
"Em Moçambique ainda nos ressentimos da falta de políticas culturais de informação para o público tal como acontece noutros países", disse Vieira Mário para de seguida revelar que, nas creches, por exemplo, locais onde supostamente as crianças são educadas, o cenário é o contrário. O único entretenimento, com a monitoria das "titias", tem sido as telenovelas, minando sobremaneira a instrução das crianças.
"Um dia, eu e um grupo de estudantes percorremos 11 creches em Maputo das 7 às 11 horas e constatamos que nessas creches, sem excepção, as crianças ficam a ver telenovelas ao lado das titias com o comando na mão a percorrer canal por canal. E estamos falando de moldar pessoas", comentou Vieira Mário, claramente agastado.

(Emildo Sambo) In Canal de Mocambique

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