Saturday 1 March 2008

A OPINIAO DE FLORENTINO DICK KASSOTCHE


CRONICONTOS (DES)FARDADOS

fdique@yahoo.com

O meu Secretário-geral da AEMO

Cada um idealiza a sua esposa, seus filhos, seu presidente, seus ministros, e por ai fora. E hoje, quase nas vésperas das eleições gerais na Associação dos Escritores Moçambicanos, quero também idealizar o meu SECRETARIO-GERAL. Confesso, não vou ser muito ambiciono como gostaria de ser, mas na medida do possível vou, aqui, deixar escrito aquilo que penso que deve ser o perfil de um Secretario-Geral da AEMO, uma Associação que devia ser porta-voz de toda uma sociedade civil.
Estou a imaginar vozes discordantes com aquilo que penso ser o meu SG, e os mesmos a morderem-me com palavras e pensamentos, como alguns já tiveram a ousadia de me telefonar, pedindo-me silêncio absoluto a todo um processo de candidaturas e eleição de um Homem que será também meu CHEFE na CASA dos ESCRIBAS; mas como sou da banda dos que não recebem ordens insípidas, cá estou para registrar o que penso.
Antes de entrar propriamente no meu tema, que é o perfil de um SG da AEMO, gostaria de fazer uma pergunta retórica: já imaginou, caro leitor, ter-se, hoje, num mundo globalizado, um presidente em Moçambique que não saiba balbuciar inglês ou francês? Já imaginou, caro leitor, ter um Ministro dos Negócios Estrangeiros que não saiba expressar-se em alguma língua internacional, diferente do Português? Já imaginou ainda um Governador do Banco que não saiba as línguas que comandam o mundo financeiro?
Bem, isso é para dizer, por outras palavras, que eu gostaria que o meu SG da AEMO fosse capaz de, participando numa conferência internacional sobre a literatura e cultura, dialogar com os outros escritores num à-vontade, que lhe desse mais valia como representante do meu POVO e da minha MALTA ESCRIBA. Que não tivesse medo de se aproximar dos outros SGs de outros países, e falar-lhes na sua língua e linguagem. E ainda sobre este assunto, Joaquim Chissano era admirado por muitos dirigentes e população anônima mundial pela capacidade que tinha de se expressar em muitas línguas: português, inglês, francês, ki-swahili, espanhol....
Lembro-me, numa dessas Cimeiras da União Africana, quando ele ainda era Presidente – Joaquim Chissano respondera as perguntas que eram postas na língua em que as mesmas eram dirigidas; e os jornalistas ficaram de boca aberta pela capacidade que ele tinha de saber tocar o coração dos outros.
Na vida real, não há melhor coisa, quando se trata de relacionamentos de gente diferente, que dirigir-se na língua do seu interlocutor, que ele, de certeza, ficará emocionado e abrirará o seu coração doutro jeito-maneira.
Ainda ao falar-se das línguas - um jovem escritor fora a Cuba, numa delegação para participar num evento literário. Depois de voltar, eu perguntara:
“Como é que foi o evento? Com quantos escritores tiveste a honra de conversar? Conseguiste fazer algumas amizades literárias?”
E ele, na sua modéstia, respondeu-me:
- Foi bonito ir a Cuba e estar presente em todos aqueles momentos literários, mas quando se tratava de conversar com os colegas da escrita de outros países, o meu pouco inglês fugia-me, e nessas condições fui obrigado a exilar-me no meu quarto, ou encostar-me aos mais velhos que sabiam nadar em francês e inglês.
Admirei a sua sinceridade, aliás, o factor língua é muito importante para alguns cargos públicos, por mais que sejam puramente DOMESTICOS.
Mais do que a língua, o meu SG deve ser um ESCRITOR na sua essência da palavra. Um escritor tem obras publicadas. Um escritor tem uma agenda literária. Um escritor tem qualquer coisa que se esconde-estampada dentro da sua personalidade que lhe identifica com a escrita e com o mundo das artes.
E ao falar de escritor – sei que esse é tema para debate – um escritor não deve ser confundido com um jornalista; com um músico, com um economista, com um político, embora essas PESSOAS possam ser escritoras. Afinal, num Moçambique em que a escrita é COISA SECUNDARIA, o escritor é, antes de mais, homem de uma profissão, a qual lhe alimenta, ou seja, da sua sobrevivência. O escritor é, antes de qualquer coisa, um jornalista, um professor, um economista, um administrador, enfim, mas que não se confunda a VONTADE DE SER E O SER-SE ESCRITOR.
Há, por exemplo, bons jornalistas que não são escritores, como escritores que não são jornalistas, bem como há escritores que são jornalistas e vice-versa. A palavra jornalista, neste caso, pode ser substituída por outras....
Repito – o meu escritor deve ser um homem que não precisa de gritar que é escritor, bastando, apenas a sua presença, a sua loucura com a vida, a sua amizade com a palavra, o seu nome, a sua obra. O meu SG não tem tribo, cor, idade, habilitações, gênero – ele é, em si, a soma de todas as tendências, e representa as unidades que se fazem INTEIRA num Homem consensual.
Há uma geração, que por imperativos históricos, não lhes perguntamos por habilitações. Mas o meu SG, se nasceu depois da independência, ou nos anos setenta, deve ter, no mínimo, um bacharelato.
E ao falar de habilitações literárias, há coisas que só são perceptíveis quando se passa por uma escola. Admiro os autoditadas – mas é sempre bom ter as chaves de conhecimento a partir de um processo de ensino aprendizagem, que o autodictatismo não nos dá as ferramentas necessárias para demonstrar, por exemplo, o porque é que três elevado a zero é igual a um.
O meu SG deve ter um programa, e que no mesmo conste uma filosofia de trabalho e de divulgação da actividade literária, primeiro, para o MOÇAMBIQUE real, e em seguida, fazer-se ouvir no além-fronteiras.
Que na Agenda do meu SG conste também um WEBSITE dos escritores moçambicanos, onde eu possa buscar tudo relacionado com a AEMO e seus membros, e evidentemente, as suas produções literárias.
Que no programa do meu SG haja uma teoria de como fazer valer o Know-How dos escritores nas áreas de publicidade, marketing, Política, etc, fazendo com que o escritor possa viver das suas habilidades literárias, e não pedinte eterno de alguns PATROCINADORES oportunistas.
Em suma: o meu SG da AEMO deve ser poliglota, idealista, ESCRITOR (de facto), escolarizado, afável, carismático, respeitoso, sonhador, enfim, um HOMEM que me inspire confiança e vontade de seguir os seus ideais.

Nota: Quando o meu-nosso SG é distinguido para outras tarefas do país, devia ser orgulho para a classe dos escritores. Devemo-nos orgulhar do Hélder Muteia, do Armando Artur e do Juvenal Bucuane, por terem sido distinguidos durante ou depois dos seus mandatos com outros cargos importantes da vida da Nação. Não foram eles que pediram para ser nomeados, mas foram distinguidos, porque mereceram. Essa linguagem de que pessoas se aproveitam da cadeira de SG para serem promovidas está, para mim, cheia de invejionices.

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