Saturday 12 January 2008

Mocambique na SADC

Politica



Carlos Jeque: Discurso político sustenta integração na SADC – afirma Carlos Jeque concorrente derrotado das presidenciais de 2004



APESAR de constrangimentos de vária ordem, como por exemplo, a decadência das indústrias nacionais, o elevado índice de desemprego, a baixa produção agrícola, entre outras de natureza económica, o país não parou durante o ano findo, tendo registado alguma evolução, particularmente na arena política, onde, mais uma vez, a paz e estabilidade vincaram. Estas considerações foram tecidas ao “Notícias” pelo político independente, Carlos Jeque, para quem tal estabilidade ajudou o país a construir um discurso que lhe permitiu integrar o primeiro lote de países que decidiram avançar com a integração a nível da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral. Maputo, Sábado, 12 de Janeiro de 2008:: Notícias
Na análise que faz da preparação e integração do país no espaço da SADC, Carlos Jeque afirma que Moçambique, em termos económicos, não está em condições de competir, em pé de igualdade com a África do Sul e outros países da região, daí que deveria ter negociado um fundo de compensação para “potenciar algumas indústrias e serviços” Debruçou-se, igualmente, sobre a vida política nacional, destacando a realização das terceiras eleições autárquicas nacionais. Para ele, a grande perturbação dos processos eleitorais nacionais têm lugar no período pós votação, ou seja, na altura da contagem dos votos, daí que apela a todos os partidos políticos e coligações de partidos que participarem nas eleições que evitem criar distúrbios que possam pôr em causa a paz e estabilidade que o país vive há mais de uma década. Segundo disse, em caso de reclamação, os vencidos deverão agir dentro da urbanidade e de acordo com o previsto na lei “para se evitar que Moçambique se transforme num segundo Quénia”. Também mostra-se reticente no que respeita à estratégia do Governo no sentido de contrabalançar as importações, afirmando que não é com a batata, cebola, alho ou rebolho que Moçambique vai compensar as importações que faz “antes pelo contrário, a maior parte deste tipo de produtos consumidos em Moçambique vêm da África do Sul”. Na conversa, o jurista considerou “inconcebível” que o Chefe de Estado promulgue leis inconstitucionais ou feridas de inconstitucionalidade e exigiu que Armando Guebuza tome uma decisão em relação aos seus assessores para a área jurídica, para além de se ter congratulado pelo sucesso conseguido na primeira fase do recenseamento eleitoral, actividade esta que apesar de ter iniciado de forma conturbada, conseguiu inscrever mais de 7.5 milhões dos 10.2 milhões de cidadãos previsto para serem inscritos ao longo de todo o processo. De seguida, acompanhe a referida conversa:

NOTÍCIAS (NOT) – O presente ano vai ser, politicamente, marcado pela realização das terceiras eleições autárquicas, um processo eleitoral que vai ter lugar depois da polémica sobre a realização ou não das eleições provinciais inicialmente previstas para o ano passado e que acabaram por ser adiadas. Como antevê este processo tendo em conta o que se passou em 2007?

CARLOS JEQUE (CJ) – Penso que este ano teremos umas eleições autárquicas bem sucedidas porque tudo já está estabelecido e o recenseamento eleitoral vai decorrer num período normal aceitável e aceite por todos. A grande perturbação dos processos eleitorais nacionais se verificam após a votação, na contagem dos votos. Antes, é a problemática da aprovação das leis e outros dispositivos legais e neste caso tal problema está já esgotado, ultrapassado, pois, as leis já foram aprovadas e estão em vigor. Portanto, temos de nos precaver para que não aconteçam distúrbios na fase de contagem dos votos. Que os vencidos, querendo protestar, façam-no dentro das regras estabelecidas e com urbanidade sob pena de nos acontecer o que se está a viver no Quénia, um país até agora tido como exemplo de estabilidade e democracia em África.

NOT – Os números divulgados pelo Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE) em torno do recenseamento eleitoral causaram-lhe alguma surpresa tendo em conta que esta inscrição iniciou com muita turbulência? Sete milhões e meio de eleitores inscritos...

CJ – Não é surpreendente visto que, sobretudo a camada jovem, tem se entregue, nos últimos dois anos, em tarefas do país. Esse é um fenómenos social que tenho estado a analisar mercê das conversas que tenho mantido com esta camada da sociedade. . Parecendo que não, os jovens querem, agora, assumir a liderança e participar na tomada das grandes decisões nacionais. É certo que eles não tem ainda um espaço desejável para o efeito mas já é visível tal manifestação. Portanto, há um chamamento dos jovens para intervirem na sociedade porque o desenvolvimento de uma sociedade também depende da intervenção deles. São gerações que vão passando e se há uma que fica estática, a situação desta não é boa e o país não vai para aí além...

NOT - ... mas na arena política tem se visto pouco jovens, sobretudo no seio dos partidos políticos, com a oposição na dianteira dessa situação.

CJ – Há um certo desencanto dos jovens com os partidos políticos, com todos os partidos, sem excepção. Não encontram respostas para as suas necessidades por parte da Frelimo, que é o partido que está no poder. Apesar deste facto, há uma aderência de jovens em todos os eventos. Os partidos da oposição, desencantam profundamente os jovens porque eles não vêm, nesses partidos, como partidos políticos com potencialidade para serem uma alternância ao partido que está no poder há mais de 30 anos. Então, naturalmente que os jovens vão assumindo o papel de manifestação dos eus interesses através da sua aderência aos centros de recenseamento. Por um lado, há um apelo de todos os partidos políticos, aliada à consciência nas famílias de que é importante recensear; por outro lado, os jovens aderem ao recenseamento como uma medida cautelar, pois, estão com receio que amanhã possam ter qualquer entrave quando pretenderem realizar qualquer coisa, como seja matricular, procurar emprego, obter passaporte... tão com receio que nessa hora sejam lhes exigido o cartão de eleitor e dizerem que não o possuem e assim ficarem impedidos de realizar tal desejo. Também é preciso ficarmos atentos a este fenómeno, sobretudo na altura da votação. Se os jovens aparecerem massivamente nos postos de votação, significará que abraçaram a causa e estão desejosos de participar na tomada de decisões no país e, caso contrário, ficará confirmada a teoria de que afluíram aos postos de recenseamento por medida cautelar.

FRELIMO ESTEVE SEMPRE PREPARADA

NOT – O líder da Renamo, Afonso Dhlakama, afirma que as “provinciais” não tiveram lugar porque a Frelimo não queria, pois, não estava preparada e que a problemática da falta de meios e de tempo para organizar todo o processo não passou de mera desculpa para legitimar esse não querer...

CJ - ...a Frelimo esta preparada para as eleições. Aliás, a Frelimo está sempre preparada para as eleições. Basta ver que ao longo do ano passado, a Frelimo realizou uma série de reuniões, desde o congresso, reuniões de quadro, do comité central, até aos encontros de base, dos distritos e localidades, tudo para preparar a sua máquina para o sufrágio. Penso que a oposição era a menos interessada na realização das eleições nos prazos inicialmente previstos porque não estavam preparados, de tal sorte que, não acompanhamos nenhuma conferência de nenhum partido da oposição que estivesse a preparar a sua participação nas eleições para as assembleias provinciais. Eles se circunscreveram sempre nos discursos de circunstância, quando os jornalistas aparecesse, quando a televisão aparecesse... Uma iniciativa dos partidos políticos da oposição no sentido de mostrarem à sociedade que estão a preparar ou que estão preparados para as eleições, naturalmente que não vimos nada. Continuamos com a mesma situação. Penso que este discurso do líder da Renamo é um discurso que ele proferiu sem se recordar que ao longo do ano 2007 e em 2006, aliás, logo após as eleições em 2004, a Frelimo desdobrou-se sempre em reuniões periódicas com as bases, com seus quadros a nível de todo o país.


Não é com batata com cebola que se vai fazer o equilíbrioO PAÍS NÃO ESTÁ PARADO

Maputo, Sábado, 12 de Janeiro de 2008:: Notícias
NOT – O ano de 2007 terminou, em termos económicos, com o Governo a dizer que o país cresceu em 7.5 por cento em termos globais. A realidade do dia a dia do cidadão comum reflecte esses números?

C.J. – Como esses números são apresentados à sociedade, eu ponho sempre reticências. O que é que querem dizer com 7.5 por cento: 7.1 por cento; inflação de um dígito. Afinal, o que é que de facto querem dizer? É isso que a sociedade ainda não entendeu. Porquê? Porque nós ainda não temos indústria. O comércio é o que todos nós vemos; emprega um número pouco significativo da massa laboral moçambicana. Há um índice elevadíssimo de desemprego. Não tendo indústrias; com poucas empresas grandes que possam empregar, por exemplo, trezentas, quatrocentas pessoas, e com índice elevadíssimo de desemprego, capaz de cair na ordem, da população activa, de três ou mais milhões de pessoas; sem um comércio, de facto mais abrangente e no sentido de ser mais incisivo em termos económicos; e com muitas unidades comerciais a sonegarem os impostos; com um orçamento que, em metade, é subsidiado externamente, tenho grandes dificuldades em compreender como é que hoje se pode falar num crescimento de 7.5 por cento e numa inflação de um dígito. Não compreendo quais são os indicadores que suportam isso em termos reais. Agora, em termos técnicos, podem nos apresentar esses números.

NOT – Na perspectiva do Governo, o país cresceu porque foram construídas mais escolas, hospitais, os moçambicanos tem mais acesso à água, à casas de alvernaria, que os nacionais tem maior poder de compra...

C.J. – Não sei se quando fazem essas afirmações têm em consideração o comércio informal, as barracas, porque à nossa frente está sempre uma pessoa no passeio a vender tomate, cebola, alho... vendem para depois irem comprar o pão, o fósforo, se tem “credelec” vai pagá-lo para uma semana... Não sei se facto é esse o desenvolvimento que querem dizer porque não me parece que em termos clássicos, é mesmo isso.

NOT – Na sua opinião, o país está ou não a desenvolver?

C.J. – Não se pode dizer que o país está parado. Moçambique é um país pouco apetecível para investimentos estrangeiro porque não tem riquezas naturais....

NOT - ... mas temos o gás natural, temos uma costa rica, temos praias...

C.J. – Nem todos os países estão interessados no gás e a nossa costa rica não está a ser aproveitada. Portanto, nós não temos petróleo, diamantes, minas de ouro, de prata, como, por exemplo tem Angola. O caju, que era uma das bases da economia moçambicana desapareceu completamente; o camarão que era um dos pilares de exportação, ninguém sabe o que está a acontecer com ele, não é verdade? Torna-se difícil aceitar essa ideia, quando as pessoas querem dizer que nós estamos em boas condições para aceitar isso. Eu ponho sempre reticências.

NOT – Se o país não está parado e não está a desenvolver, o que é que se passa?

C.J. – O país está estável. O que foi feito não se está a perder. Agora, por exemplo, vejo empresas que eram autênticos gigantes na sua área de actuação, estão a perder-se isso porque a inspecção do trabalho circunscreveu-se a uma ou outra empresa. Na minha opinião falta aqui uma estratégia de defesa do trabalhador que passa por seriar as empresas e na hora fazer-se o acompanhamento das deficitária. Isso porque a deficiência das empresas muitas vezes é criada, daí que não entendo como empresas como “Custódio e Irmãos” fica 14 meses sem pagar salários , ou “Transportes Oliveiras” a desaparecer.

INTEGRAÇÃO É BASEADA NUM DISCURSO POLÍTICO

Maputo, Sábado, 12 de Janeiro de 2008:: Notícias
NOT – Esse quadro económico que traça, desencoraja qualquer um a dizer que Moçambique está preparado para entrar em pé de igualdade com qualquer outro país na integração regional a nível da SADC.

C.J. – Uma coisa é o discurso político, que eu acho que está muito bem construído, outra coisa é a realidade porque nem a nível da indústria de prestação de serviço, nem a nível da indústria, não estamos preparados. Aliás, não estamos preparados a todos os níveis. A nível da banca, não estamos preparados; a nível do turismo, não estamos preparados; não sabemos quais são as exportações que podem contrabalançar com as importações que vão ser feitas ou que tem sido feitas ao longo destes anos todos. Não podemos falar do tomate, da cebola e da batata, como produtos que vão contrabalançar as importações porque se até nós consumimos, maioritariamente, tomate que vem da África do Sul, cebola, que vem da África do Sul.... tenho dificuldades em entender porque é que dizem que nós vamos entrar para esse processo em pé de igualdade. Eu Não posso desencorajar, não devo desencorajar um discurso político, porquê? Porque ao longo destes anos todos, Moçambique lutou por unidade política no sentido de criação de amizade que conduziu a esta fase. Vivemos em paz. Esta nossa zona vive pacificamente e uma das formas de evitar conflito entre estados é, exactamente, haver uma identidade em múltiplos aspectos. A identidade política, quase que praticamente se conseguiu; a identidade económica, é um processo longo, difícil e doloroso para países como o nosso. Então, vamos para a integração de uma maneira como vai um indivíduo para uma competição sabendo, à priori, que o adversário que lhe calhou naquela jornada é mais forte, portanto, deve entrar com todas as potencialidades que, às vezes, ajudam, como aconteceu na história do Davide que venceu o Golias. Isso aconteceu porque o Davide teve a sorte e uma estratégia.

NOT – E nós, teremos sorte (espero que sim) e estratégia para nos darmos bem?

C.J. – A única estratégia que nós temos é uma estratégia política, que granjeia sempre amizade com outros países e que, naturalmente, quando toca o aspecto económico aí já se diz, amigos, amigos.... negócios à parte.

NOT – O país poderá ser penalizado por isso?

C.J. – Vamos sim e porquê? Na Comunidade Europeia o que aconteceu foi que se criou um fundo de compensação para apoiar os países que apresentavam desequilíbrios económicos muito fortes. No caso de África Austral, Moçambique é um deles. Na Europa, alguns países tiveram que se sacrificar para se conseguir criar um bloco que estivesse ao mesmo nível que os Estados Unidos, China, Japão e, na altura, União Soviética, hoje Rússia. Ora, o fundo de compensação foi para a aderência de países como Espanha, Portugal, Grécia... Moçambique não está a beneficiar de nenhum fundo de compensação. Não tem meios para desenvolver determinadas indústrias, não tem meios para criar um certo equilíbrio na prestação de serviços. Por exemplo, na área do turismo, temos potencial e essa poderia ser a nossa “arma” de troca mas ela não está a servir-nos. Olha, não basta dizer que já temos acesso à praia do Bilene; Já temos acesso à Ponta de Ouro.... porque ir para água, tudo muito bem. Mas quando saio da água às 15.00 horas para onde é que vou? O turista sai da praia para o hotel ou “bangaló”. Mas o turismo não é só isso, o turismo é isso e mais algumas coisas à volta que criam a atracção turística, onde se pode passear no período da manhã, à tarde ou à noite. Coisas que pode ver de interesse nacional. Nós não temos isso. Podemos, sim, ter um hotel de cinco estrelas perto de uma praia, as melhores casa de campo de praia do mundo mas faltam as actividades complementares de laser e diversão. A pergunta que fica no ar é: O que é que nós temos? O que é que estamos a fazer?


É INCONCEBÍVEL QUE O PR CRIE NORMAS INCONSTITUCIONAIS

Maputo, Sábado, 12 de Janeiro de 2008:: Notícias
NOT – Como vê o facto da Presidência da República ter aprovado normas que mais tarde vieram a mostrar-se feridas de inconstitucionalidade e ilegalidade?

C.J. – É, simplesmente, inconcebível; é inadmissível, é gravíssimo, quando o Presidente da República vai promulgar leis inconstitucionais ou feridas de inconstitucionalidade (porque pode ser uma norma e não a lei toda). A partir do momento que aparece a segunda inconstitucionalidade, há obrigação do Presidente da República de tomar uma posição em relação às pessoas que estão à volta dessas tarefas.

NOT – Há, também, o Conselho Constitucional, a quem o Presidente pode recorrer em caso de dúvida.

C.J. – Repare, o Presidente da República apanha pela tabela mas não há nenhum Presidente no mundo que sabe de tudo. Ele tem os seus assessores. São os assessores que aconselham o Presidente da República, antes de promulgar a lei, eventualmente, eles pela sua modéstia, sugerem para se consultar o Conselho Constitucional. ao Presidente da República dizem para assinar e ele assina. Quando o Ministro da Saúde diz algo ao Presidente da República ele faz fé e acredita porque o Presidente da República não é médico, não cursou medicina. Ele confia no seu ministro. Nestes casos, o Presidente da República é, de facto culpado, porque é ele que subscreve o documento mas na verdade não se pode olhar só para ele. Dai que afirmamos que os assessores do Presidente da República para a área jurídica mostram uma certa mediocridade porque é inadmissível que tal a situação aconteça, em qualquer parte do mundo. Em dois anos e meio de governação quatro inconstitucionalidades, cinco, com a que travou! É mau, quando se tem em conta que estamos a falar de um Presidente de um partido que governa há mais de 30 anos. Será que não haverá mais, se analisarmos as coisas com mais profundidade, provavelmente. Quatro inconstitucionalidades em dois anos e meio, quando o anterior só teve uma em 15 anos. É grave! Na minha opinião, bastava só duas inconstitucionalidades para ele tomar uma posição em relação aos seus assessores. Aliás, se ele tomou a decisão, corajosa, diga-se, de mudar dois ministros da Agricultura em dois anos e meio, qual é o problema dele afastar os seus assessores para a área jurídica? Pessoas essas que estão a lhe criar embaraços a nível nacional e internacional. Internacional porque quando se verificam as inconstitucionalidades num determinado país o exterior está atento porque tem a ver com os investimentos. Os investidores querem ir para um país onde, de facto, existe um Estado de Direito e existe legalidade. Quando se cai de inconstitucionalidade em inconstitucionalidade, provavelmente, haverá muitas ilegalidades que não estão a ser reveladas. O Chefe de Estado deve também pensar nisso.

Mussá Mohomed, In Noticias

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