Tuesday, 31 May 2011

PARLAMENTO JUVENIL DE MOÇAMBIQUE

Revisão da Constituição da República de Moçambique

I. PREÂMBULO
O Parlamento Juvenil, movimento de advocacia dos direitos e prioridades da juventude, fundado à 10 de Dezembro de 2008, apresenta a presente Declaração de Posição sobre a Constituição da República de Moçambique, à Assembleia da República, ao Governo, ao Sistema de Administração da Justiça, ao Conselho Constitucional, à Comunicação Social, aos jovens moçambicanos e à Sociedade no geral.
Esta declaração representa a aspiração concreta dos jovens moçambicanos, visando agir em conjunto para dar resposta à Carta Africana da Juventude que, no seu artigo 26 sobre as Responsabilidades dos Jovens, recomenda a participação da juventude na tomada de decisões, no processo de elaboração de políticas públicas e no processo de implementação de soluções concertadas para os desafios da nação, priorizando abordagens intersectoriais na elevação do compromisso ao mais alto nível do poder decisório e estimulando mudanças políticas e sociais que favoreçam a democracia e a boa governação.
Como sempre temos referido, a consolidação da nação moçambicana teve sempre como factor catalítico o movimento da juventude. E hoje, tal como no passado, o potencial de liderança na condução do processo de desenvolvimento concentra-se nos jovens, não só pelos seu peso demográfico, como também por constituírem a fracção economicamente mais activa, o que os torna a força motriz necessária para o progresso.
Este documento, resulta da consulta massiva e participação activa de jovens moçambicanos do Rovuma ao Maputo, através de conferências regionais que incluíram jovens das 11 províncias do país, dentre eles académicos, políticos, jornalistas, no sector informal, líderes, médicos tradicionais, agricultores, membros de organizações diversas e, empresários.
Estas conferências, realizadas em parceria com a Fundação Konrad Adenauer, assumiram um carácter didáctico e pedagógico uma vez que tiveram como facilitadores os constitucionalistas Armindo Rita e Eduardo Chiziane, que numa primeira fase potenciaram aos jovens de conhecimentos e técnicas para uma compreensão e asserção crítica da lei-mãe valorizando uma metodologia participativa, e numa segunda fase orientaram trabalhos de grupo e debates acesos que culminaram com a emissão de propostas sobre os pontos principais que constam da presente declaração.
A juventude em todo o mundo é uma fonte inesgotável de energia e ideias catalisadoras. A nossa luta visa autonomizar aos jovens para que possam agir. Agir pelo Estado de Direito Democrático, pois só a democracia garante-nos benefícios permanentes e esperança em um país de progresso e justiça social.
Todas as propostas patentes neste documento são fruto de debates abertos, participativos e inclusivos, onde a juventude constituiu-se o centro da decisão.
Esperamos que estas contribuições sejam objecto de consideração, consulta e reflexão por quem de direito, porque um país é o que é pela juventude que tem e, um país é o que é pelo debate público que tem. O discurso político actual recomenda o diálogo social e a participação como chave para o desenvolvimento.
O nosso muito obrigado!




DECLARAÇÃO DE POSIÇÃO
O Parlamento Juvenil, preocupado com a violação dos direitos e liberdades fundamentais plasmados na Constituição da República, com o crescente índice de injustiça social, com a fraca satisfação dos direitos sociais, com a promiscuidade entre os três poderes, com a crise económica nacional e internacional, com o actual cenário político sombrio que caracteriza o continente africano e com o actual estágio do Estado de Direito Democrático em Moçambique que mais se parece com um Estado de deveres, caracterizado pela falta de equilíbrio entre direitos e deveres fundamentais dos cidadãos:
Considerando,
1. Que os jovens, apesar de constituírem a maioria da população moçambicana, continuam os eternos preteridos nos processos de tomada de decisão, debatendo-se com várias dificuldades, entre elas o acesso à direitos fundamentais como a vida e o acesso a direitos sociais como educação, saúde, emprego, habitação, etc.
2. Que se assiste a um sistemático incumprimento dos direitos básicos da juventude, à luz da Constituição actual, Resoluções, Declarações e Convenções nacionais, regionais e de escala planetária de que o país é signatário;
3. Que a aparente promiscuidade entre os três órgãos detentores do poder no país perigam a estabilidade política e o acesso à justiça social;
4. Que as manifestações e golpes de Estado sistemáticos em África são o reflexo de regimes que não valorizam o debate público, a consulta massiva e os direitos fundamentais de um Estado de Direito Democrático;
Reconhecendo,
5. Que a actual Constituição da República de Moçambique constitui um exemplo em África e no mundo pelo nível de direitos e garantias que oferece aos seus cidadãos;
6. A existência de condições temporais e circunstanciais favoráveis à Revisão da Constituição (5 anos e a não prevalência de Estado de sítio);
7. Os esforços da Assembleia da República com vista a ajustar a CRM à nova conjuntura internacional, caracterizada pela dinâmica do novo contexto político, económico e social interno e externo;
8. A criação de Assembleias Provinciais como um importante avanço no processo de descentralização e fiscalização das actividades do Executivo;

Acreditando,
9. Que estão conscientes da existência de questões na Constituição da República cuja revisão exige Referendo, como garante da consulta e participação massiva do povo moçambicano;
10. Que a revisão da CRM tem como objectivo aprofundar a democracia e garantir uma melhor realização das necessidades do povo moçambicano;
Reafirmando,
11. Que nós, jovens, estamos cientes de que a justiça, a paz e a democracia só serão efectivamente alcançados com o nosso engajamento activo, sério e consequente em todos os domínios da vida político, económica e social do país;
Evocando,
12. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Carta Africana dos Direitos dos Povos, a Carta Africana da Juventude, entre outras recomendações internacionais de que o país é signatário;
13. O nosso interesse na satisfação da unidade nacional, na valorização da nossa diversidade etnolinguística e na estimulação dos valores característicos do nosso povo, como seja o espírito de sacrifício e da unidade na diversidade;
Lembrando,
14. As virtudes e os valores tradicionais histórico-culturais das civilizações africanas sobre as quais se baseia a concepção dos Direitos dos Povos, que hoje não pode ser deliberadamente escamoteada;

APELAMOS:
• A manutenção do actual Sistema de Governo Presidencialista – eleição do Presidente da República por sufrágio universal, directo e secreto, no qual o Presidente da República assume o papel de Chefe de Estado e de Governo. Entendemos que o problema de fundo não é em si o Presidencialismo mas sim a natureza atípica do Presidencialismo Moçambicano. Assim, recomendamos a purificação do sistema presidencialista em Moçambique através de:
o Presidente da República sem poderes para dissolver o órgão legislativo (Parlamento) e o órgão legislativo com poderes para destituir o Presidente da República caso este cometa um crime contra a Constituição da República;
o Retirada do poder de iniciativa legislativa por parte do Presidente da República, reservando-lhe apenas o poder regulamentar;
o Concessão do poder de veto ao Presidente da República;
o Concessão do poder ao órgão legislativo para fazer sindicâncias e ratificar algumas das decisões do Presidente da República;
o Efectiva separação de poderes através da despartidarização do Estado;
o Devida implementação da Constituição da República e demais dispositivos legais existentes de modo a concertar o discurso político e a realidade prática.

• O Presidente da República uma vez eleito não pode ser simultaneamente Presidente de um partido;
• A garantia, observância, manutenção e respeito de todas as matérias que não podem ser alteradas sem a auscultação do povo através do referendo, nomeadamente:
o A independência, a soberania e a unidade do Estado;
o A forma republicana do Governo;
o A separação entre as confissões religiosas e o Estado;
o Os direitos, as liberdades e as garantias fundamentais;
o O sufrágio universal, directo, secreto, pessoal, igual e periódico na designação dos titulares electivos dos órgãos de soberania das províncias e do poder local;
o O pluralismo de expressão e de organização política;
o A separação e a interdependência dos órgãos de soberania;
o A fiscalização da constitucionalidade;
o A independência das autarquias locais;
o Os direitos dos trabalhadores e das associações sindicais;
o As normas que regem a nacionalidade.

• A eleição dos Governadores Provinciais para que, a filosofia de criação das Assembleias provinciais como representante do povo na fiscalização das actividades dos Órgãos Locais do Estado não sejam letra morta;
• Eleição dos mais altos magistrados do Sistema de Administração da Justiça pelos pares. Propõe-se que os Presidentes do Tribunal Supremo, da Procuradoria Geral, do Conselho Constitucional e do Tribunal Administrativo sejam designados pelos seus pares juízes conselheiros dos respectivos órgãos, como forma de garantir interdependência e maior liberdade de acção destes órgãos. De igual modo, que haja orçamento independente para os poderes legislativo, executivo e judicial;
• Incompatibilidade entre o activismo partidário e a ocupação de altos cargos no poder judicial – imparcialidade e independência;
• Recomenda-se a existência de um tempo de mandato único, não renovável de 10 anos para os mais altos magistrados do Sistema de Administração da Justiça de modo a que a vontade de renovar não seja motivo para se sujeitar à manipulações e exigências arbitrárias de quem o designou para o cargo;
• Eliminação de Vice-ministros e de Secretários do Estado;
• A redução do número de assinaturas exigidas para o recurso ao Conselho Constitucional, de 2000 para 1000 assinaturas de modo a tornar a justiça mais acessível aos cidadãos;
• A abertura constitucional para o acesso ao Conselho Constitucional de casos individuais, tornando a justiça mais próxima do cidadão, desde que haja argumentos devidos;
• A devida sistematização dos direitos. O direito à vida (direito fundamental) consta na lista dos direitos sociais na actual organização da Constituição da República.
• A introdução do conceito de inconstitucionalidade por omissão de modo a fiscalizar a devida satisfação dos direitos, nomeadamente o de trabalho, acesso à saúde, habitação, segurança, entre outros. Este conceito servirá de instrumento de pressão para que estes direitos deixem de ser meras expectativas. A título de exemplo, a Constituição da República de Cabo Verde, consagra no seu artigo 16 sobre a Responsabilidade das Entidades Públicas, que:
o 1. O Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis por acções ou omissões dos seus agentes praticadas no exercício de funções públicas ou por causa delas, e que, por qualquer forma, violem os direitos, liberdades e garantias com prejuízo para o titular destes ou de terceiros.
o 2. Os agentes do Estado e das demais entidades públicas são, nos termos da lei, criminal e disciplinarmente responsáveis por acções ou omissões de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias”.
• O estabelecimento, na Constituição da República, de normas e regras básicas relativas aos números máximos a serem observados nos órgãos e instituições do Estado. Por exemplo, o número máximo de Ministérios no Governo;
• O estabelecimento de quotas básicas para admissão no Estado de grupos vulneráveis (deficientes), desde que reúnam os requisitos relacionados a função em concurso;
• A fixação através da Constituição da República do valor máximo percentual de remuneração e subsídios aos servidores públicos detentores de mandato electivo, demais agentes políticos e, ocupantes de cargos de administração directa, autárquica e fundacional;
• O militar, enquanto em serviço activo, não pode estar filiado a partidos políticos;
• A manutenção da consagração a terra como propriedade do Estado. Contudo, o Estado deve estimular a valorização da terra, distribuindo a terra para cidadãos que tem pretendem utilizá-la efectivamente;
• A sociedade deve ponderar a possibilidade da institucionalização de um Mercado de títulos de terra como forma de promover um maior uso da terra para o desenvolvimento económico do país.


Maputo, aos 28 de Maio de 2011

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