Segunda-feira, Setembro 13, 2010
O bom senso do Governo à sustentabilidade das suas decisões
O passo dado esta semana foi importantíssimo para aliviar o sofrimento das pessoas no imediato, não há dúvida. Mas temos que nos questionar em relação à sustentabilidade das decisões tomadas, pois amanhã, podem ser um grande embaraço à economia.
O Governo anunciou, esta semana, um pacote de 27 medidas de fundo para atenuar o custo de vida dos cidadãos das classes média-baixa e baixa, fortemente fustigados pelas últimas subidas de preços.
Para lá do impacto prático e real, que tem algumas das medidas tomadas, na subsistência de muitas famílias, sobretudo não aumentar preços de água, pão e energia, o simples facto de o Governo ter levado a sério as preocupações decorrentes das manifestações de 1 e 2 de Setembro e não ter embarcado nos discursos triunfalistas, de cortesães do poder, de que “está tudo bem” e que estas manifestações não eram representativas do pensamento da maioria dos moçambicanos, por terem ocorrido apenas em Maputo, é um agradável sinal de que as pessoas que governam este país compreenderam o que se está a passar. Compreenderam, sobretudo, que já passou o tempo em que eram sempre os outros os culpados dos nossos problemas, das nossas incapacidades.
Por isso, convenhamos: a mão externa que levou aos levantamentos populares de 5 de Fevereiro de 2008 e de 1 e 2 de Setembro de 2010 é a nossa incapacidade de prevermos convulsões sociais por nos convencermos de que estamos no bom caminho; a nossa impotência em materializarmos na vida dos cidadãos o crescimento e a estabilidade económicas do país; a nossa incapacidade para promovermos um diálogo são entre governantes e governados. O resto são cantigas.
Fez bem, por isso, a meu ver, o Governo ao não fazer ouvidos de mercador, mesmo às críticas menos católicas. Mostra que, ao contrário do que tinha deixado transparecer nos últimos dias, está, afinal, sensível aos problemas dos seus cidadãos e às opiniões diferentes das suas.
Há quem veja as decisões do Governo como uma cedência, uma fraqueza, um recuo. Não partilho dessa ideia. Pelo contrário, sou da opinião de que, ao decidir como decidiu, o Governo mostra que teve a leitura certa dos acontecimentos, percebeu que os governantes são servidores e quando os servidos não estão satisfeitos, cabe aos que governam satisfazê-los, mudar. O povo é que nunca muda. Por isso, um Governo recuar para satisfazer aqueles que o elegeram, é, a meu ver, sinal de grandeza, de elevação.
No caso do pão, da energia e da água, as medidas tomadas têm o mérito de atingir as pessoas que, de facto, careciam, pois, há cidadãos, neste país, para quem ter água, luz e pão ainda é luxo. Já o congelamento dos aumentos salariais e outras regalias dos principais dirigentes do Estado e dos gestores de topo das empresas públicas e participadas do Estado, é de um simbolismo político de efeito transcendental. Transmite a moralizadora ideia de que também os governantes estão disponíveis a consentir os sacrifícios que tanto pedem ao povo, dispõem-se a viver mais proximamente ao estilo do povo.
É certo que o real impacto desta medida, nas finanças públicas, não é nada extraordinário, mas é inegável o seu alcance político. Vincula os próprios membros do Governo e gestores da coisa pública de forma efectiva no desiderato de combate à pobreza. É, por isso, provavelmente, das medidas de impacto político mais importantes que se tomam nos 35 anos da nossa independência.
Poder-se-ia ir mais longe? Poder-se-ia, claro. Afinal, a estrutura de despesa governamental não se mostra em sentido de redução do deficit. Antes pelo contrário. Ainda há pouco, o Estado emitiu títulos de dívida no mercado para fazer face às despesas e isso fará, certamente, disparar a dívida pública. Por isso, no lugar de uma política de austeridade tímida, o Governo deveria avançar com medidas de corte mais de fundo, eliminando instituições supérfluas e aglutinando ministérios dispensáveis em poucos. Uma estrutura mais enxuta, mais flexível, mais eficiente e, mais importante ainda, menos dispendiosa. Porque o Estado não pode pedir contenção aos cidadãos e continuar ele próprio a gastar mais do que (não) produz – as receitas fiscais cobrem apenas 51% das despesas totais, na sua maioria despesas que têm a ver com remunerações. Os restantes 49% vêm de donativos e empréstimos.
O passo dado esta semana foi importantíssimo para aliviar o sofrimento das pessoas no imediato, não há dúvida. Mas temos que nos questionar em relação à sustentabilidade das decisões tomadas, pois amanhã, podem ser um grande embaraço à economia. Subsidiar pão, combustíveis, energia e água (sim, porque, não aumentando as tarifas, as empresas de electricidade e de água ficaram privadas de receitas com que contavam e que deverá vir de algum lado, agora – repassando-a a consumidores de maior capacidade financeira através do sistema de subsídios cruzados ou de subsídios vindos do próprio governo) é uma tarefa hercúlea para um orçamento que, como vimos acima, 49% das suas despesas são cobertas por donativos e empréstimos.
E, para agravar, se o Governo deu subsídio aos consumidores, terá de fazê-lo também aos produtores. São eles, afinal, que quando terminar a anestesia agora dada, terão de garantir a sustentabilidade das decisões ora tomadas. Urge, por isso, que o governo aproveite esta trégua e avance, seriamente, para soluções estruturais. É agora, pois, tempo de transformar o jargão “aumentar a produção e produtividade” em algo concreto.
E isso passa, de alguma forma, por atacar as distorções da nossa economia, apostarmos na competitividade, copiando dos outros, se necessário. Afinal, estamos apenas na posição 127 entre 135 países no Índice de Pobreza Humana da ONU. Atrás de nós, só mesmo estados falhados como Serra Leoa, Afeganistão ou Guiné Bissau. Muito pouco, na verdade.
E é tão importante gerarmos grandes transformações no nosso tecido produtivo, quanto antes, porque os próximos tempos não serão, propriamente, agradáveis. A entrada de vários milhões de novos consumidores provenientes da Ásia e da América Latina vai criar dificuldades inegáveis à economia mundial por via do aumento da procura nos mercados internacionais. O que quer dizer que os preços dos bens essenciais terão tendência a subir. E aí, os primeiros a sofrer são sempre as populações pobres de países pobres como nosso, que não têm como aumentar a sua renda para suportar aumentos repentino, como os que vivemos. Daí a premência de pensar para lá de Dezembro.
Regressando ao ponto de partida: bem ou mal, o Governo fez a sua parte nesta crise. O mesmo não se pode dizer dos partidos políticos da oposição e da Assembleia da República. Num período social crítico no país, os deputados não foram capazes de convocar uma sessão extraordinária para ajudar a encontrar soluções para os seus eleitores. Deixaram o Governo, sozinho, reunir e decidir. Sucede que algumas decisões tomada pelo Governo têm impacto directo no Orçamento de Estado aprovado pela própria Assembleia da República. Sobretudo nas questões fiscais, nesta crise, o Governo assumiu como acto consumado (está a negociar já com moageiras e panificadores quanto lhes vai dar de subsídios) compromissos de reorientação orçamental, sem ter o aval de quem aprova o orçamento – o parlamento. Noutra geografia política, imagine-se a crise política, se as propostas do Governo, entretanto apresentadas ao público, não passassem depois no parlamento.
Fonte: O País online - 10.09.2010
Domestic abuse cases rarely convicted, data shows
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A pilot for tougher domestic violence orders is announced - but charities
warn police must act on them.
3 hours ago
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