Friday 25 June 2010

A OPINIAO DO CANAL DE MOCAMBIQUE

Editorial

Moçambique: 35 anos de Independência

O povo merece outros governantes

Maputo (Canalmoz) - Amanhã, 25 de Junho, Moçambique cumpre mais um aniversário como Estado soberano e independente.
Há 35 anos, os que assistiram à celebração da despedida da administração colonial portuguesa do território nacional – simbolizada pelo arriar da Bandeira lusa e o hastear da nossa primeira Bandeira Nacional – alimentavam as esperanças mais díspares, mas todos sentiam orgulho e uma enorme satisfação por passarem a ter uma Pátria soberana. Nem todos puderam desfrutar. Uns ainda tiveram de continuar a oferecer o seu melhor, e alguns até as suas próprias vidas, para que a liberdade de ser diferente deixasse de ser negada.
Para os que acreditavam na retórica salazarista segundo a qual este território só era Moçambique porque era Portugal, aqui está a resposta que o tempo se encarregou de dar. Moçambique é Moçambique e é independente do País que o colonizou.
Neste período de 35 anos foram muitas as contrariedades e grandes as controvérsias. Os traços comuns prevaleceram, apesar das enormes diferenças que irão persistir entre os moçambicanos.
São hoje bem visíveis grandes avanços relativamente ao momento em que Moçambique se desvinculou de Portugal, com uma particularidade que hoje não se pode descurar: os próprios portugueses manifestam-se orgulhosos por serem mais independentes sem as suas ex-colónias.
O mundo que fechou as portas a Portugal voltou a abrir-lhe as mesmas portas, quando constatou que profundas mudanças tinham ocorrido. E muitos dos moçambicanos que se insurgiram contra a colonização até são, hoje, aficionados ferrenhos de clubes portugueses e fervorosos apoiantes da selecção portuguesa no Mundial de Futebol, que decorre aqui ao lado na África do Sul.
O tempo encarregou-se de provar que os extremismos não são um bom caminho.
Muita coisa mudou nestes 35 anos que nos separam da zero hora de 25 de Junho de 1975. Mas nem tudo correu bem após a proclamação da Independência. Teve ainda de correr muito sangue, para que a moçambicanidade se tornasse um bem comum.
“A Frelimo sujou as conquistas da Independência com as suas políticas devastadoras”, afirma hoje, em retrospectiva, o presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, a propósito da celebração dos 35 anos da Independência Nacional.
“Toda a gente abraçou a Independência por ter lutado por ela, e, com a saída dos colonos, os nacionalistas já se podiam afirmar, mas, surpreendentemente, o Governo da Frelimo veio a piorar a situação e, em muito pouco tempo, matou muitas pessoas, mais do que durante os quinhentos anos da colonização portuguesa. A Frelimo negou a democracia. Matou quem se arriscasse a pensar de maneira contrária à sua ideologia marxista-comunista. Quem pensasse de forma diferente era morto. Muitos moçambicanos foram fuzilados por serem acusados de anti-independência”, resume assim a sua visão o homem que liderou a luta que visava pôr termo à usurpação do poder por aqueles que passaram a negar aos outros moçambicanos o direito de pensarem de maneira diferente, acreditarem em coisas diferentes, serem simplesmente diferentes, sendo tão moçambicanos como quaisquer outros.
Tudo o que diz Dhlakama parece pertencente ao passado, mas não é, pois essa usurpação do poder parece ser mais intensa do que nunca.
Também não pode pertencer ao passado que aceitemos, sem nos preocuparmos, que nos tenham andado a enganar, décadas a fio, com a história do assassinato do presidente Eduardo Chivambo Mondlane no seu escritório da Frente de Libertação de Moçambique, quando, de facto, ele terminou os seus dias assassinado na casa de Betty King, bem longe dos escritórios da Frelimo, ainda que também em Dar-es-Salaam.
Dizer-se, como o disse há dias, na Beira, o coronel Sérgio Vieira, ex-ministro do SNASP, que os que levantam essa questão da casa de Betty King querem retirar “repelência” ao assassinato de Mondlane, ou querem confundir as pessoas, fazendo crer que ele tinha uma relação íntima com a senhora, isso é próprio de quem não dorme descansado com a sua consciência e sofre de uma obstrução mental preocupante. Só pode!
Quando se trata do local onde houve um assassinato, o que está em causa não são supostas relações íntimas. Levantar essa questão é uma manobra de diversão vinda da parte do próprio coronel. É uma tentativa de atirar poeira para os olhos. Quando se trata do local de um assassinato, o que está em causa são as pistas sobre o percurso percorrido pelos assassinos. É a diferença entre o percurso para os escritórios da Frente de Libertação de Moçambique e o percurso para a casa de Betty King. É esse percurso que se pretende esconder, assim como encobrir quem fez um percurso e não o outro?
A grande questão foi, é e continuará a ser sempre a mesma: porque terá alguém necessidade de contar, décadas a fio, uma história como tendo-se passado num determinado local, quando, de facto, tudo se passou noutro local? O que se terá pretendido esconder? O que se continuará a querer esconder?
As circunstâncias em que foi assassinado Kennedy alguma vez poderão servir para explicar as circunstâncias da morte de Samora?
Uma bomba que explode nos escritórios da Frelimo é uma coisa, e outra coisa é uma bomba explodir em casa de alguém onde só algumas pessoas conhecem bem o que lá se passava, quais eram ali as intimidades, os ódios, as paixões, as opções, as fidelidades, as traições que por lá haveria. Quem poderia saber que Mondlane iria àquele local, àquela hora em que a vida lhe foi ceifada numa residencial que nesse dia até estava encerrada para folga do pessoal? Porque se disse que o tal livro explodiu no escritório de Mondlane, na sede da Frente de Libertação de Moçambique na capital tanzaniana, quando afinal foi muito longe dali?
Ainda hoje continuam a encher-nos a cabeça com mentiras atrás de mentiras. Dados estatísticos viciados para os moçambicanos acreditarem em sucessos que não são como se conta, são a outra face da mesma moeda de quem se habituou a mentir.
Proclama-se que estamos a vencer a pobreza absoluta quando se sente que há cada vez mais pobreza à nossa volta.
A nossa moeda nacional já desvalorizou mais de 30% de há um ano para cá, mas só se fala de sucessos económicos, de crescimento económico.
Porquê continuar um povo inteiro a crer em gente que não escreve por linhas direitas?
Em nosso modesto entender, temos que nos libertar o mais urgentemente possível de gente que anda, há anos, a pretender fazer-nos crer que sem eles não conseguiremos viver. Esta é a mesma conversa do antigo regime colonialista português: sem eles não conseguiríamos viver.
Temos que encontrar outra gente, agruparmo-nos em redor de gente com valores que não passem por exercícios cachimbados de salão, a troco de migalhas que ofendem quem acredita profundamente que o respeito é devido às instituições, mas que acredita também que a soberania é de facto uma questão muito séria, que não pode continuar nas mãos de quem mente, além de não se dar ao respeito, como se infere das companhias que o tempo se encarrega de nos mostrar que não são boas para qualquer mortal que se preze e se auto-estime. É bem conhecido o provérbio que, nesta hora, muitos gostariam de esquecer: “Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és”.
Tentemos, ao menos, chegar aos 40 anos da Independência Nacional com outras perspectivas. Tenhamos a coragem de arejar o terreiro. Basta de nos envergonharmos com os desavergonhados que querem continuar a enganar-nos. O país merece gente com nariz menos levantado, gente com mais qualidade humana. Essa gente existe. É preciso que se acredite! E existem condições para isso.

(Canal de Moçambique)

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