Monday 5 April 2010

CRESCIMENTO - não se reflecte na partilha da riqueza

MOÇAMBIQUE tem vindo a registar taxas recordes de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), estando as previsões para este ano fixadas entre 5.9 e 6.4 porcento, depois de 6.3 em 2009. Todavia, o Grupo Moçambicano da Dívida (GMD) entende que apesar da tendência crescente do PIB não há no país indicações ou mecanismos consistentes de partilha dos benefícios desta riqueza gerada por uma maioria do moçambicano. Maputo, Sexta-Feira, 2 de Abril de 2010:: Notícias

Esta organização considera também que as forças impulsionadoras do crescimento acelerado continuam a ser os projectos de maior dimensão intensivos em capital que ao mesmo tempo têm vindo a lograr benefícios duma política de atracção de investimento estrangeiro, que se baseia na isenção de obrigações fiscais.

Um documento que constitui a contribuição desta organização para o desenvolvimento o Observatório de Desenvolvimento adianta que o sistema continua rígido (leis, regulamentos, procedimentos, etc.), favorecendo menos o sector manufactureiro, tradicionalmente tomado como o que tem o maior potencial de gerar emprego em grande escala, e pequenas empresas em todas as vertentes de sua existência.

“Portanto, poucos são os sectores que têm vindo a mostrar sinais de evolução, destaque vai para o sector de serviços que é menos vulnerável à rigidez do sistema mas que possui um potencial menor de geração de emprego”, considera o documento.

Refere ainda que as taxas de juro reais são proibitivas e constrangem o crescimento do sector produtivo nacional de menor dimensão que pode gerar mais emprego aos Moçambicanos. Actualmente as taxas de juro reais andam entre 10 a 15porcento, chegando em certos casos a ser cerca de 5 vezes mais elevadas do que na África do Sul. Perante esta situação, não há medidas alternativas evidentes para o financiamento ao investimento, particularmente as pequenas e médias empresas.

A emissão de instrumentos de dívida interna e consequente colocação no mercado pelo Governo, cuja taxa real de juro ronda a volta dos 5 porcento ao ano (de acordo com a dívida interna em carteira), estimula a elevação das taxas de juro pela banca privada.

Para o GMD, os instrumentos de dívida interna do Governo são da preferência da banca privada por apresentarem um risco menor à recuperação dos fundos alocados pela banca privada. “Hoje, no contexto da crise económica internacional e perante sinais de uma possível redução da ajuda externa e do investimento directo estrangeiro, o que pode levar ao recurso à dívida interna pelo Estado, o receio em relação a este problema volta à mesa, mostrando, desde já, que é preciso privilegiar a geração de recursos dentro do país através dum sistema fiscal robusto”.

O documento é contribuição do GMD ao trabalho da Sociedade Civil para o processo de Revisão Anual 2010, tendo como um dos momentos peculiares o Observatório de Desenvolvimento. A sua elaboração baseou-se num conjunto de análises efectuadas pelo GMD e outras instituições, bem como dados dispersos disponíveis em finais de 2009 sobre o desempenho do Governo e do país em geral nos últimos anos. O documento faz um levantamento de alguns problemas e desafios de natureza macroeconómica prevalecentes e sua relação com a redução da pobreza no país.

SISTEMA DE COLECTA CONTINUA FRÁGIL

Maputo, Sexta-Feira, 2 de Abril de 2010:: Notícias
Actualmente grande parte de entidades singulares e colectivas não paga impostos, ou o fazem de forma indevida, um fenómeno mais evidente particularmente nas zonas urbanas.

O Grupo Moçambicano de Dívida cita alguns estudos segundo os quais, o fenómeno de fuga ao fisco leva a que não mais do que 10 porcento dos potenciais contribuintes sejam os pagadores efectivos.

Para aquela organização não governamental, se todos os potenciais contribuintes efectivamente cumprissem com as suas obrigações fiscais, o nível de dependência externa no financiamento ao Orçamento do Estado estaria a níveis não superiores a 30 porcento.

Para já, ainda de acordo com o GMD, um dos fenómenos que caracteriza este aspecto é a injecção de dinheiro pelo Estado nas empresas públicas e privadas, cuja recuperação pelo Estado não tem sido eficaz. Este fenómeno é responsável pelo desperdício de somas significativas de recursos que, doutra maneira, ajudariam a reduzir o défice no Orçamento do Estado.

O desenvolvimento de medidas em resposta às questões acima apresentadas deverá ter em conta alguns desafios que serão inevitáveis, mas que a sua consideração poderá levar à elaboração de medidas mais robustas e sustentáveis.

No documento em causa aquela organização levanta algumas questões, nomeadamente como aumentar de forma adequada a receita pública sem pôr em causa o florescimento do sector privado e sem acelerar o peso da dívida; como conciliar a ajuda à produção nacional e a satisfação das necessidades básicas do cidadão, que passam necessariamente por uma expansão da despesa, com o crescimento e sustentabilidade a longo prazo e compromissos assumidos com parceiros internacionais no que concerne à disciplina fiscal e ao respeito estrito de alguns limites de indicadores macroeconómicos.

O GMD efectuou levantamentos adicionais de vários analistas de políticas, investigadores e actores da sociedade civil, que conduziu à constatação de que há um conjunto de problemas que o país continua a enfrentar, embora as estatísticas mostrem um cenário promissor, numa conjuntura internacional adversa. Tais problemas podem neutralizar os efeitos positivos decorrentes da performance macroeconómica positiva de que todos louvamos.

Em relação aos mega-projectos de capital intensivo e com um impacto limitado na criação de riqueza, particularmente o emprego e contribuição fiscal, bem como a sua fraca ligação com a indústria o GMD ressalta a necessidade da revisão das condições de sua existência.

O Observatório de Desenvolvimento 2009 também levantou questionamento em relação aos obstáculos impostos pelas altas taxas de juros aos empréstimos (21.4 porcento), a rápida deterioração do poder de compra do cidadão, o fraco progresso de alguns indicadores de Desenvolvimento Humano como mortalidade infantil, peso à nascença e malnutrição, tendo levado ao questionamento da possibilidade de realização das metas de redução da pobreza para 2010 e 2015.

DESAFIO É ALARGAR COLECTA DE RECEITA

Maputo, Sexta-Feira, 2 de Abril de 2010:: Notícias
“O país deve adoptar medidas céleres para que a força da conjuntura e indicadores macroeconómicos se tornem sustentáveis e que beneficiem a uma larga maioria da população, alargando a capacidade interna de geração de receita, o que vai levar o país à redução da dependência externa”, lê-se no documento do Grupo Moçambicano da Dívida, cuja cópia o “Notícias” teve acesso.

As políticas e estratégias devem acautelar a remoção de factores que criam custo (barreiras administrativas e legais) como um elemento importante para o estímulo ao investimento privado, tanto doméstico como estrangeiro, que possa gerar mais empregos e beneficiar uma grande maioria da população.

As saídas passam também pela revisão do que é efectivamente matéria colectável e impor sem parcialidade o cumprimento das obrigações tributárias a todos. As principais matérias a explorar sob ponto de vista de tributação são o consumo específico, a indústria extractiva, os bens de luxo, as propriedades, pessoas singulares e colectivas que não pagam imposto, o pequeno produtor das zonas rurais, entre outras.

“Na componente fiscal a disciplina/prudência não deve ser vista apenas na perspectiva de contenção da despesa pública, mas mais do que isso, e muito mais importante, deve ser o incremento das capacidades de determinação do custo real das acções públicas no processo de planificação pública”, diz o documento.
Acrescenta que as medidas da componente fiscal podem levar a poupanças significativas e, combinado com as de alargamento da base tributária, podem incrementar significativamente as receitas do Estado, criando condições para o não recurso à dívida interna pelo Estado e, contribuindo para a redução da dependência externa.

Entretanto, o GMD queixa-se do prevalecente problema de acesso à informação que vem limitando, inclusivamente, a realização de simples análises exploratórias sobre a performance do país nos diferentes sectores e áreas.

Este trabalho específico foi produzido em Janeiro e Fevereiro de 2010 numa altura em que estatísticas macroeconómicas sobre o desempenho do país em 2009 ainda não são públicas, incluindo o Balanço do Plano Económico e Social (PES) 2009. Como resultado disso, há-de se notar, em alguns casos, o recurso ao uso de dados preliminares, alguns que dizem respeito ao período que vai até terceiro trimestre de 2009.
Entretanto, o Grupo Moçambicano da Dívida considera que a estabilidade macroeconómica é condição necessária para o crescimento económica, mas não suficiente.

Entende que esta organização que há outros elementos que precisamos ter em consideração: a capacidade de mobilização de recursos internos e, consequentemente, o grau de redução da dependência externa, o nível de eficiência na afectação da despesa pública, o stock de infra-estruturas, o stock de capital humano, etc.

“Não há economia que prospera sem crescimento económico, e para a economia crescer a estabilidade macroeconómica é chave, basicamente, devido à sensibilidade do investimento a este factor”.

PAÍS RESISTIU À CRISE

Maputo, Sexta-Feira, 2 de Abril de 2010:: Notícias
O país conseguiu fazer face à crise económica geral com sucesso, apesar de continuar altamente dependente da ajuda externa, tendo, desta maneira, sido protegidas as bases para a continuação de um cenário macroeconómico favorável.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) considera que o nível de endividamento mais baixo do país associado a uma política fiscal saudável foram fulcrais para que o Governo conseguisse enfrentar a crise através duma política fiscal mais expansionista.

Na base do cenário acima, análises do Fundo Monetário Internacional (FMI) adiantam que Moçambique pode começar a relaxar temporariamente as medidas de política fiscal e monetária, nomeadamente, o aligeiramento temporário das políticas macroeconómicas, a partir de 2010 face a uma esperada recuperação da actividade económica. De acordo com aquela instituição, espera-se para 2010 um crescimento económico na ordem dos 5,5 porcento (MF, Outubro de 2009).

“Em termos de output, o FMI refere que até finais do primeiro semestre de 2009, maior parte das principais metas quantitativas para Junho de 2009 tinha sido alcançada, sendo, contudo, nós de estrangulamento o crescimento do crédito ao Governo e do dinheiro da reserva, que foram mais altos do que o previsto. O FMI também ressalta que outro importante elemento é o facto da implementação das políticas não ter perdido o ritmo, mantendo-se basicamente alinhada com o previsto, o que permitiu o alcance das metas até Junho de 2009, conforme o referido acima, incluindo progressos plausíveis na implementação das reformas estruturais no país”.

O GMD cita o Ministério das Finanças referido que apesar dos novos desafios impostos pela crise económica global, o Governo procurou alinhar as suas estratégias para os objectivos de médio prazo, entre os quais a prossecução de um crescimento económico em torno dos sete por cento ao ano, para dar continuidade à redução da incidência da pobreza absoluta de 54 por cento em 2003, para 45 por cento no final do corrente ano (2010).

Como forma de reduzir a vulnerabilidade do país aos choques externos, o governo estabeleceu como meta aumentar a receita pública anual em 0,5 por cento do Produto Interno Bruto (PIB), para elevar a base doméstica de recursos para o financiamento do Orçamento do Estado e apostar no distrito como pólo de desenvolvimento através do processo de descentralização orçamental e de transferência directa de fundos de investimento de iniciativa local. Este posicionamento também poderá ter contribuído para que o país se saísse bem na gestão dos efeitos da crise económica global.

“O contributo das medidas suplementares por si impostas para mitigar os efeitos da crise sobre o sector produtivo e as camadas mais pobres da população, nomeadamente a introdução, em 2008, do subsídio aos combustíveis para os transportadores semi-colectivos urbanos de passageiros e o diferimento do pagamento dos direitos aduaneiros e do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) que incidem sobre o gasóleo e petróleo de iluminação. De acordo com o Governo, para manter a sustentabilidade orçamental, a implementação das medidas acima foi acompanhada pela adopção de medidas estritas de contenção da despesa pública e reorientação de recursos no Orçamento do Estado para se assegurar a neutralidade no défice orçamental.

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