Não marquem para já o funeral!
Maputo (Canalmoz) – Esta afirmação celebrizou-se em tempos bastante antigos. Tempos de milagres de Jesus Cristo, o Rei. Neste período, conforme reza a Sagrada Escritura, a interpretação da morte era dual. Isso porque, perante a morte de alguém, enquanto uma ala se atirava aos prantos e gritos, outra tinha fé, que se chamassem Jesus Cristo, o ora falecido podia voltar à vida. Assim, os da fé, não choravam, nem sequer cogitavam já em funeral, mas sim rogavam a chegada de Cristo para que não mais se marcasse o funeral e que o morto ressuscitasse.
Abunda por aí, nos últimos dias, um bom número de comentadores e jornalistas encartados, a passarem certidões de óbito ao maior partido da oposição, a Renamo, por estar a tardar reencontrar-se consigo própria. Na minha modesta opinião, marcar o funeral com o corpo ainda quente parece, no mínimo, pouco avisado, tratando-se de um gato, conhecido que é, de sete vidas, mesmo acossado pelo "Frelimismo" que, embora na mó de cima, também vive momentos turbulentos, mas que nunca saíram para comentários.
Se a memória for convocada para o debate, relativizar-se-á o coma político que tantos diagnosticam. O Renamo sofreu mil e um golpes na sua história e sobreviveu. Viu partir para outros horizontes políticos parte dos seus jogadores de bastidores e intelectuais que traziam vida ao grupo.
Esta incursão histórica, se não elide a crise que a Renamo atravessa, recomenda pelo menos cautelas quanto à apreciação do seu fôlego, enquanto alternativa democrática, assim como outros partidos da oposição.
O actual problema da Renamo não é um, são, no meu entender, três. O primeiro é, digamos assim, estrutural. Trata-se do "original sin", ou melhor, o “pecado original” da indefinição ideológica, porventura útil quando os momentos assim o precisam, mas que o vulnerabiliza na Oposição. O segundo, prende-se com a "auto-orfandade" em que ainda vive. "Assassinou e continuamente assassina" o posto de líder, o pai. É que em nenhum canto do mundo existe um partido sem liderança. Não me refiro à liderança da pessoa como homem, mas sim pessoas munidas de capacidade técnica para fazer os joguetes recomendados em política. A Renamo padece de défice de liderança capaz de montar estratégias conducentes a resultados e frutos palpáveis. Nisso, recomenda-se a destruição total do xadrez para a montagem de um novo puzzle com estrutura e coesão ideológica.
Os dois factores acima alistados, quando conjugados, produzem o terceiro. A “auto – remissão” à categoria de estagiário político. Com isso, quero dizer que com a falta dos alicerces acima tratados, a Renamo está sempre a submeter-se a estágios na política moçambicana. Quando pensamos que o seu regime de estágio terminou e lhe passamos uma carta de admissão para a “Real Politic” a Renamo sempre faz alguma coisa para que lhe possamos retirar a carta e empurrar novamente para os estágios.
A Renamo deve, a meu ver, deixar de ser perita a desenhar estratégias para a sua própria derrota. O maior problema da Renamo é a própria Renamo, e nisso só a própria Renamo é que pode ser chamada para resolver o seu próprio problema. O resto é conversa de café. Mas seria tolice esperar que Jesus Cristo ressuscite a Renamo porque a política é para políticos, cabendo mesmo à Renamo metamorfosear-se para fazer o milagre da sua ressurreição. Sei que a Renamo não está morta. Mas em coma, indiscutivelmente, está. A Renamo ainda não morreu mas alguns ilustres que a lideram, política e tecnicamente já estão em exéquias fúnebres. E a estes é que deve ser marcado o funeral. Não marquem o funeral da Renamo para tão já, porque o corpo ainda mexe, e a democracia agradecerá.
(Matias Guente)
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