Monday 17 August 2009

A Opiniao de JJ Macuane

Caros "Moçaambiqueonliners ",
A quantidade de coisas que se disse sobre este assunto e a emoção em torno do debate parece que nos faz cair em algumas zonas de penumbra. Certamente muito ainda será dito, mas eu queria concentrar-me em um ponto.

O Sr. Momade Ali, passo a citar, diz no seu e-mail (também em destaque abaixo): S. Excia o Presidente Armando Emílio Guebuza, que participou da epopeia do povo moçambicano contra o colonialismo e é o principal mentor da luta atual contra a POBREZA ABSOLUTA!
Primeiro, a bem do debate, pediria ao próprio autor que compartilhasse connosco o que entende por "principal mentor da luta actual contra a POBREZA ABSOLUTA. Mas, enquanto aguardo a possível resposta à questão levantada, aproveito a oportunidade para apresentar algumas inquietações relativamente à essa afirmação.

Tanto quanto sei, o Presidente Guebuza, que certamente tem méritos nessa luta, é o Chefe do Governo da República de Moçambique, que por sua vez aprovou e está a implementar um conjunto de políticas de combate à pobreza, incluído no Plano de Acção de Combate à Pobreza Absoluta, vulgo PARPA II, que vai de 2006 a 2009. O PARPA II, como certamente muitos deste fórum estão a par, deriva do PARPA I (lógico, se há II é porque houve I), que foi o primeiro programa de combate à pobreza,que começou a ser implementado em 1999 (salvo erro), mas o o seu documento orientador foi formalmente aprovado em 2001 e vigorou até 2005. Se formos mais além, veremos que o segundo programa de ajustamento estrutural -- o PRES (o primeiro foi o PRE, introduzido no final da década de 1980), já mostra uma preocupação com as questões sociais, aqui simbolizada pela inclusão do S na sigla e a introdução de políticas sociais para mitigar os efeitos nefastos dos programas de ajustamento estrutural. Se ainda fizermos um pequeno esforço de investigação veremos que a crítica severa aos programas de ajustamento estrutural em todo o mundo levou às instituições financeiras internacionais (FMI e Banco Mundial) a mudarem de abordagem, o que abriu espaço para a iniciativa dos países pobres altamente individados (HIPC) e o chamado quadro compreensivo de desenvolvimento. É este quadro que criou as bases, muitas vezes com sabor de condicionalismo, para a introdução dos chamadoss PRSP - os documentos de Estratégia de Redução da Pobreza, cujo exemplo entre nós são os PARPAs. A adopção de programas de redução de pobreza absoluta foi definida como a condição sine qua non para o perdão da dívida dos países mais pobres do mundo, com a contrapartida de canalização de mais fundos a programas de redução da pobreza. Moçambique aderiu à essa iniciativa.

Quem tiver vontade e paciência para aprofundar o contexto internacional em que surge a agenda de combate à pobreza nos moldes actuais pode consultar um pequeno artigo que fiz sobre o assunto em 2006 no url: http://www.codesria .org/Links/ conferences/ general_assembly 11/papers/ macuane.pdf.

Não me vou alongar nesta tediosa descrição, porque acredito que muitos deste fórum conhecem o resto da história.

O que quero dizer é que o Presidente Guebuza certamente introduziu o seu cunho pessoal no combate à pobreza; os sete milhões são largamente indicados como exemplo disso. Contudo, a actual abordagem de combate à pobreza é multifacetada e está inserida no contexto de país sub-desenvolvido e dependente que Moçambique é. No âmbito interno, há toda uma história de combate à pobreza que não começou com o Governo do Presidente Guebuza e certamente continuará nos próximos anos em outros governos. E acredito que o próprio presidente Guebuza nem deve reivindicar essa condição para si apenas, sabida que é a participação activa do mesmo na história recente deste país -- como combatente da liberdade, como governante, cidadão, empresário, deputado e agora Presidente da República -- o que lhe permite conhecer o contexto histórico em que o seu governo actua.

Portanto, salvo melhor juízo e/ou argumento, há muitos elementos que influenciam o formato da presente agenda de combate à pobreza no País e não me parece correcto reduzir a sua concepção ao Presidente Guebuza. Este debate é deveras saudável, mas não devemos escamotear a história do nosso país.
Cumprimentos,
JJMacuane

No comments: