Wednesday, 22 July 2009

O preço de ser negra



Lucrecia Paco, actriz
Lucrécia Paco narra o episódio triste vivido no Brasil



A actriz moçambicana Lu­crécia Paco viveu, recen­temente, um episódio de discriminação racial no Brasil, onde se encontrava a participar num festival de diferentes ex­pressões culturais. No entanto, foi surpreendida pelo “festival de racismo” que se registou pou­cas horas antes de se apresentar em palco.



O racismo verifica-se em qua­se todo o mundo. Certamente que já acompanhou casos de outras pessoas que passaram por situações de discriminação racial.Quer comentar sobre o episódio de racismo que viveu? Para mim, o que aconteceu foi um incidente ultrapassado, não quero me agarrar a isso. E a par­tir daí assumo que as pessoas são diferentes. Depois dessa si­tuação, encontrei uma menina que quer tanto ser negra, que me admirava... me pegava... e dizem que come muito choca­late, pois tem a ideia de que é assim que se fica negro. ela im­pressiona-se com a cor preta.

Como aconteceu e como se sentiu perante a situação?

Estava numa casa de câmbios no centro comercial paulista, precisava de trocar dólares. Não sei nem assumo que toquei na senhora. Ela virou e puxou a sua bolsa. pedi desculpas mesmo sem assumir que a toquei. Ela pôs-se a gritar: “vou chamar a polícia”. Ela apostava que eu era uma imigrante ilegal. tirei o passaporte e mostrei-lhe. Irrita­da, eu disse que o meu país tem estado a receber muitos brasi­leiros, que “vivo num país tão belo que os brasileiros quando lá vão querem instalar-se”. Eu acho que ela é doida. Tudo isso aconteceu numa altura em que estava preocupada com a mi­nha timbila, que ficou na hora de ambarcar. E o senhor do cai­xa, que é o chefe das bagagens da SA, entendeu que a mesma timbila que uma semana antes tinha passado com ela para Es­panha já não a podia levar para Brasil como bagagem simples­mente porque não lhe apetecia, e teve a ousadia de me dizer.
Como reagiu?

Normalmente.
Se tivesse vivido uma situa­ção do género no seu país, a re­acção seria a mesma?

Não vejo a possibilidade de viver isso no meu país, porque estou no meu espaço. digo isso porque aqui somos multiraciais, vivemos bem, não é por acaso que as pessoas quando vêm para aqui querem ficar. não imagino que possa passar por uma situa­ção do género no meu país. Pre­firo continuar a julgar as pesso­as pela sua competência, pelas suas capacidades, e não pela cor da pele.

Sei que o dia em que foi hu­milhada publicamente era o mesmo em que ia apresentar a peça “mulher asfalto”. De que forma o sucedido terá abalado o seu estado de espírito, tendo em conta a sua apresentação?

Ahh... foi uma das melhores apresentações. Não posso negar que realmente no Brasil é dificil ser preto. “mulher asfalto” já diz “eu estou aqui, eu existo”. Não abalou o meu espírito, naquele momento disse para mim mes­ma “Sou negra, mas estou aqui e vocês estão a aplaudir”.

Com esse triste incidente, terá mudado a imagem que tem do Brasil?

Não significa que vou olhar para o brasileiro com olho tor­to, ela (a senhora) não conse­guiu criar em mim um desejo de vingança.

Sei que se casou com um ho­mem branco. sentia maus olha­res quando estivesse com ele?

Algumas pessoas olham e gostam, outras desdenham. Ca­sei-me com o homem que amo, não tenho como ser racista nem preconceituosa com a questão da cor.

Qual foi a reacção da família dele quando a conheceu?

Fui muito bem aceite pela fa­mília. sempre fui adorada por todos. Houve sempre respeito tanto por parte da minha fa­mília, assim como da dele. Não houve quem se opusesse.
Quarta, 15 Julho 2009 12:35 Felicidade Zunguza

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