Monday, 2 February 2009

Um olhar às relações Mondlane/Simango (2)*


Quarenta anos depois, o país declara 2009 como ano do 1° Presidente da Frelimo

· Defensor da Unidade Nacional morto em circunstâncias pouco claras e até agora
inexplicáveis
Quelimane (DZ) – Um testemunha que viveu esses momentos afirmaria anos mas tarde
que: “Havia tribalismo na Frelimo. Isso não se pode negar. Eu sou do sul do país, mas tenho que admitir que havia tribalismo e quem o galvanizou foram algumas pessoas
do sul que chegaram mais tarde entre 1963 e 1965. Viviam muito preocupados com Simango e agitavam Mondlane dizendo-lhe que o Reverendo pretendia usurpar o poder; que era preciso ter cuidado com ele, etc, etc. Souberam jogar, dividindo as pessoas e
usando até alguns do centro e norte do país que pouco entendiam de afinidades e lealdades. Algumas dessas pessoas, ignorantes que eram, foram sendo usadas como
marionetas sem se aperceberem que os outros pretendiam dividir para reinar”.
Apesar da queda de Mabunda, Gumane e Muguambe ter sido um choque imprevisto de Mondlane, a posterior e gradual aparição (entre 1963 e 1965) de indivíduos
oriundos do sul de moçambique no movimento veio reanimar as aspirações do antropólogo de impor um “nacionalismo elitista” ditado pelo sul no meio da Frelimo.
Em encontros privados com alguns desses recém-chegados, Mondlane passou a escutar antentamente as suas lamentações e sugestões e, gradualmente, foi acreditando na
genuína intenção patriótica dos queixosos e olhando com desconfiança o seu parceiro Uria Simango e todos aqueles que ousassem estar de acordo com o vice-presidente ou contrair as sujestões trazidas a algumas reuniões por pessoas ligadas culturalmente aos recém-chegados. A partir de uma certa altura, Mondlane passou a dar mais imptância aos conselhos desse grupo, tornado mais relevante as decisões tomadas em
conferências na sua casa em Oister Bay do que às decisões do Comité Central.
Mas os termos “escutar” e “acreditando” acima mencionados devem ser entendidos nas entre linhas, pois “Mondlane era um homane acedémico e intelectualmente bem preparado. Isso lhe confereria capacidade de perceber as intenções dos recém-chegados e dos que com ele confidenciavam, tais como Mateus Sansão Mutemba, Samora
Machel, Joaquim Chissano, Francisco Sumbane, Lourenço Matola e outros. De forma nenhuma o presidente cairia numa cidade sem se aperceber dos objectivos que moviam esses indivíduos.
Quero com isto dizer que Mondlane, como intelectual e conhecedor de certos fenómenos sociais, jogou um papel preponderante na coesão do grupo para a prossecução dos objectivos tribalistas que pairavam na mente de alguns desses camaradas do sul e, quem sabe?!... na mente dele mesmo.
Cerca de 30 anos mais tarde, a ilação de que o tribalismo e o regionalismo jogaram um papel de relevo nos conflitos de Frelimo encontra igualmente como base de sustentação o ponto de vista de Hélder Martins em seu livro tornado público em 2001. A despeito de na sua obra Martins tratar da questão tribal e regional na Frelimo de forma um tanto ou quanto infantil, e mesmo mesquinha, não deixa de ser elucidativo que os problemas vividos no interior daquele movimento
repousavam, fundamentalmente, na questão étnica e regional. Martins transforma as vítimas do tribalismo de alguns sulistas em principais protagonistas do tribalismo na Frelimo.
Num exercício que ilustra ausência de argumentos convicentes, ao descrever a
personalidade de Francisco Sumbane, pessoa que, segundo ele, era seu confidente
e, igualmente, confidente particular de Mondlane, Martins fá-lo de uma forma
suspeita, capaz de induzir o leitor a incluír que havia duas dimensões de tribalismo na Frelimo: Uma dimensão ofensiva, capaz de pôr em risco a unidade que se pretendia, e outra, inofensiva, que não fazia mal algum.
Curiosamente, Martins apelida, e sem rodeios, o seu confidente Sumbane de tribalista convicto, por este viver a imaginar que os diversos dirigentes de outras tribos
estavam a prejudicar os militantes do sul, pessoa a quem Mondlane carinhosamente
tratava por tio. e afirma que ambos (Sumbane e Muthemba) eram muito amigos, originários de Gaza. Para eles, conclui Martins, “a tribo representava muito”. Contudo, em todo o seu livro, Martins não encontra espaço para atribuir directamente aquele epíteto a outras figuras no interior da Frelimo. De forma astuta, apenas conjectura imaginando que os outros podiam ser mais tribalistas que os seus dois confidentes.Numa tentactiva de caracterizar o tribalismo de Sumbane e Muthemba como sendo inofensivo, comparativamente a um suposto tribalismo ofensivo de Simango e de outros moçambicanos orinudos do centro e norte do país, Martins recorre à teoria da
vigilância popular tendo como base suposições. Tacteia no palheiro e escreve uma história curiosa a respeito de Francisco Timóteo Zuca. Segundo Martins, no decurso
do seu trabalho no Instituto Moçambicano, para produzir os manuais para os
estudantes era indispensável que fossem dactilografados em cera (stencil) e
policopiados. Para o efeito, necessitava da presença de um dactilógrafo capaz, o que
era difícil de encontrar no seio dos combatentes em Dar es-Salam. Martins decobriu então que encontrava-se em Bagamoyo o Francisco Zuca, um dactilógrafo profissional que trabalhava na Aeronáutica da Beira e que havia se juntado a Frelimo nos finais e 1965.
Aventado a hipótese deste ir trabalhar para o Instituto ao lado de Martins, Zuca,
jubilou de alegria com a ideia, pois, segundo deduz Martins, para ele, “era a
certeza de não ir combater”. Martins afirma isto porque não sabe explicar como é que desde a chegada daquele até Março ou Abril de 1966, não havia ainda sido treinado militarmente. Pressupõe-se então o médico havia deliberadamente se furtado de ir
aos treinos militares com medo de combater o exército colonial no interior
de Moçambique.
Zuca foi então juntar-se a equipa de Martins no Instituto. Contudo, a despeito
de Martins afirmar que o rapaz “foi duma ajuda extraordinária”, um profissional à
altura e denodado trabalhador, Zuca passou a ser uma pedra no sapato porque
cedo o médico descobriu que o rapaz era da etnia de Simango, o que prossupunha
que não tardaria a ser um espião a favor de Simango. Timóteo Zuca seria um de
tantos que abandoaria a Frelimo no auge dos conflitos em 1969. Regressou à
Moçambique e, depois do golpe de 25 de Abril de 1974, na companhia de Pedro
Francisco Simango (Um combatente que chegou a exercer o cargo de chefe de
armas e que mais tarde também abandonou a Frelimo), foi preso e encaminhado para Nachingweia e posteriormente para o Niassa (depois da independência) onde igualmente foi executado sem ter passado por nunhum tribunal.
* Esta é a segunda série de artigos extraidos do Livro “Uria Simango, Um homem, uma
Causa”, da autoria de Bernabé Lucas Ncomo.

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