Prisão de Manhenje e o mal-estar de alguns!
Se não tomarmos medidas profilácticas, sérias e urgentes, sobre nós mesmos, corremos, nós moçambicanos, sérios riscos de sermos um povo esquisito, um povo que não sabe o que quer, um povo desnorteado, desorientado e confuso, na hora de tomada de posições sobre aspectos cruciais da vida nacional.
Corremos o risco de sermos um povo que ralha de tudo, mas que se não dá o tempo de analisar a natureza, a origem e o modo como as coisas acontecem ou aconteceram.
Este longo intróito vem a propósito do barulho que a detenção de Almerino Manhenje, e outros quadros do Ministério do Interior, vem levantando, desde a sua ocorrência, na segunda-feira, dia 22 de Setembro corrente. Várias são as vozes que “analisam” o ocorrido, usando, para o efeito, diversos instrumentos de análise disponíveis, quer na Lei, quer na imaginação popular e na cabeça dos políticos da nossa praça.
Alguns indignaram-se pela forma como os detidos foram capturados sem, contudo, explicitarem se esta é, ou não, a primeira vez que cidadãos deste País são detidos daquela maneira. Ou seja, não conseguimos ver nem ilegalidade, nem nenhuma anormalidade espectacular, na forma como foram detidos os arguidos, pois os mesmos foram detidos como, normalmente, se detêm outros cidadãos neste País. Aliás, há cidadãos que já foram detidos em muito piores circunstâncias, como sejam cidadãos detidos quando se encontravam a passar refeições com a família; cidadãos detidos quando participavam em festas familiares, com vários convivas presentes; há, até, o caso de um cidadão que, no ano passado, foi detido em Maputo, no Palácio dos Casamentos, quando contraía matrimónio com a sua futura esposa, entre vários outros detidos em circunstâncias humanamente não recomendáveis.
Outros indignaram-se pela detenção em si, opinando que, em seu entender, os indiciados deveriam aguardar ulteriores procedimentos em liberdade, alegadamente porque há pessoas acusadas de crimes mais graves, mas que, ainda assim, não recolhem à cadeia. Quem assim se pronuncia só o pode fazer com profundo conhecimento do conteúdo do processo, a ponto de aquilatar que a matéria nele contida não é suficientemente grave para justificar a prisão preventiva fora de flagrante delito. É que os processos judiciais têm peculiaridades tão particulares que se torna quase impossível comparar um processo com outro, pois cada processo decorre de actos concretos, praticados pelos respectivos intervenientes processuais, os quais agem imbuídos de vontades incomparáveis; daí ser aberrante comparar um caso com outros, sobretudo quando os casos em comparação decorrem de ordens jurídicas diferentes.
Não é porque o Gaguinho aguardou o julgamento em liberdade, que eu também irei aguardar o meu julgamento em liberdade. Tudo depende dos factos de que cada um for acusado e das providências e actos praticados por cada um, em sede do processo. E tudo depende de provas e argumentos aduzidos em sede da contestação, bem como do mérito e acolhimento desses argumentos pela autoridade instrutora do respectivo processo. Portanto, em processo penal, pode-se afirmar que nenhum processo é igual ao outro, pois cada processo deriva de motivações e práticas distintas, porque distintas são as pessoas intervenientes e suas vontades de acção.
Do lado da imprensa, nossa arena de batalhas diárias, vemos aparatosa confusão, tendo-se andando, por aí, a noticiar-se que até segunda-feira, dia 29 de Setembro, o juiz de Instrução ainda não decidira da sorte dos arguidos.
Ou seja, sugerem esses nossos colegas que, ao contrário do que a Lei estatui, não se teria observado neste caso o comando legal segundo o qual “os presos sem culpa formada serão apresentados ao juiz de instrução competente, ou ao do lugar da prisão, dentro do prazo máximo de quarenta e oito horas após a detenção” (Artigo 311 do Código do Processo Penal). Aliás, sugerem tais noticiários e comentaristas apressados que o juiz, após ouvir em audiência os arguidos, na última quarta-feira, dia 24 de Setembro, até hoje (dia 29 de Setembro), nada decidira sobre a sorte dos indiciados, alegadamente devido à complexidade da matéria em análise. Se isso fosse verdade, salvo melhor entendimento, o juiz estaria, em nosso modesto entender, a agir fora da Lei, pois estaria, injustificada e perpetuamente, a manter sob reclusão indivíduos sobre quem não haveria a certeza da sua forte indiciação de participação em crime de que são acusados. Estaria o juiz, invocando feriados e fins-de-semana pelo meio, a violar o princípio jurídico de que a regra é a liberdade dos cidadãos, sendo a reclusão uma excepção à regra: “Nenhum arguido pode estar preso, sem culpa formada, além dos prazos marcados na lei” (Artigo 308 do Código do Processo Penal).
Felizmente, soubemos que o juiz Boaventura Canuna decidiu na mesma quarta-feira, dia 24 de Setembro, pela legalização da prisão, optando pela manutenção da reclusão, ao invés da liberdade provisória, o que é, igualmente, de lei, quando haja:
a) fundado receio de fuga dos arguidos;
b) perigo de perturbação da instrução do processo, mantendo-se o arguido em liberdade; ou
c) quando, em razão da natureza e circunstâncias do crime, ou da
personalidade do delinquente, haja receio fundado de perturbação da ordem ou da tranquilidade pública, ou da continuação da actividade criminosa, conforme dispõe o segundo parágrafo do artigo 291 do CPP.
Em princípio, os advogados dos arguidos foram notificados, na mesma quarta-feira, dia 24 de Setembro, do despacho de legalização de prisão dos seus clientes, razão pela qual, e ao que tudo indica, na última Sexta-feira, submeteram ao juiz pedidos de modificação da decisão tomada, para se conceder aos arguidos liberdade provisória.
Seguindo a Lei, o juiz movimentou aqueles pedidos, antes de tomada de decisão, à apreciação do Ministério Público, para que este se pronuncie sobre o pedido dos arguidos, após o que, naturalmente, o juiz decidirá, obedecendo à lei e à sua consciência, conforme lhe impõe a Constituição da República.
Portanto, até aqui não estamos a ver a razão para tanto alarido à volta de uma detenção legalmente realizada, nos termos da Lei e da Constituição.
Talvez isto aconteça por estar detido um ex-ministro e, por sinal, um ex-super-ministro, a julgar pelas elevadas responsabilidades que tinha no executivo de Joaquim Chissano, onde era, para além de ministro do Interior, ministro na Presidência para Assuntos de Defesa e Segurança e Chefe da Casa Militar, também junto à Presidência da República.
Na verdade, porém, independentemente do peso presente e/ou passado dos indivíduos, no Estado de Direito ninguém deve estar acima da Lei e ninguém deve usar, de forma abusiva e irresponsável, para não dizer criminosa, as suas responsabilidades públicas.
Nós sempre apelámos para a aplicação da Lei, independentemente de quem são os indivíduos visados. Por isso, ficamos bastante preocupados quando notamos que nem todos os cidadãos, sobretudo cidadãos com responsabilidades públicas neste País, estão de acordo com a aplicação uniforme da Lei para todos os cidadãos.
Deve ser por isso que o ex-Procurador-Geral da República, Dr. Joaquim
Madeira, sempre se queixou de pessoas poderosas que não o deixavam aplicar o princípio de que ninguém está acima da Lei.
Nós somos de opinião de que o “caso Manhenje” só peca por ser tardio, pois o mesmo deveria ter atingido o actual estágio de desenvolvimento durante o consulado de Joaquim Madeira, o que não aconteceu, por razões que só Joaquim Madeira poderá explicar ao povo moçambicano.
É bom recordar aos leitores que Manhenje e os actuais detidos fazem parte do processo número 771/PRC/07, o qual arrola 11 arguidos, dos quais estão agora detidos 10, faltando um.
Para além desse processo, existe na Procuradoria da Cidade o processo número 773/PRC/07, com 13 arguidos ainda em liberdade. Este processo é relativo a desvios de fundos no Comando Geral da PRM, sendo que um dos indiciados é, actualmente, vice-ministro no Governo de Armando Guebuza.
A nossa maior expectativa é vermos o processo 773/PRC/07 a ganhar a necessária velocidade, em função da sua similaridade com o processo 771/PRC/07.
Pensamos que, ao invés de nos lamentarmos da justiça, quando esta pretende dar indicações de querer funcionar, nós todos deveríamos prestar a nossa maior colaboração aos órgãos de administração da justiça, incentivando-os a pautarem a sua actuação pelo estrito respeito da legalidade, mas perseguindo todos aqueles que, de forma dolosa ou culposa, delapidam os fundos públicos e/ou usam a sua influência como dirigentes públicos para servirem os seus interesses particulares, enriquecendo ilicitamente, e sem causa aparente.
A construção do Estado de Direito, em toda a parte, é um processo doloroso, penoso, que implica a responsabilização, até às últimas consequências, dos indivíduos, pelos actos que praticam, independentemente da posição social e/ou política que ocupem na sociedade.
Uma actuação independente e vigorosa dos órgãos de administração da justiça é a garantia fundamental da confiança e da lealdade dos cidadãos ao sistema democrático ora em construção.
Assim, para além dos casos oficialmente apresentados à PGR pelos titulares de pelouros governamentais, achamos urgente que a própria PGR aja, como advogado do Estado, para averiguar e, eventualmente, apurar responsabilidades nos casos recentemente denunciados pela comunicação social, em assuntos como os que consta ocorrerem ou terem ocorrido, por exemplo, nos Aeroportos de Moçambique, os casos de narcotráfico, as irregularidades no INSS e outros, tão abundantes quantos os corruptos neles envolvidos, sob diversas colorações, formas e tamanhos.
Só assim haverá alguma dignidade em afirmarmos que somos moçambicanos, cidadãos de um país sério, no qual haja uma clara separação residencial entre corruptos e gente honesta, país onde os corruptos vivam nas celas e os cidadãos honestos e trabalhadores nas suas casas, juntamente com as respectivas famílias.
Isso, porém, tem custos: custos políticos, custos sociais e, sobretudo,
custos humanos.
Só que, para que nasça um país exemplar, alguém terá que estar na vanguarda do suporte desses custos. E, quanto maior for o número de cidadãos que partilham esses custos, devido ao seu engajamento na luta, menores serão os prejuízos materiais sobrantes para cada cidadão moçambicano, individualmente.
Contra assaltos criminosos à dignidade e fundos do Estado, a luta deve continuar!
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