Os nossos compatriotas zangados (5): O espírito de manada
“SEM vestígios o mar”, declama Fernando Couto: Não procures vestígios no dorso do mar:/de animal ou homem não encontrarás/cheiro ou rastro, fresco ou diluído/Tudo se apaga, nada o sulca, inviolável/na sua carne de bicho sem alma. O nosso poeta “com os olhos deslumbrados” – como escreve Ana Mafalda Leite no seu belo prefácio a esta bela antologia de poesia – é capaz de ter falado cedo demais. Ou tarde. Vestígios no dorso do mar? Onde é o dorso do mar? A crista da onda? A ondulação? As várias gotas que suportam o que flutua? E as gotas, elas, onde estão? Também no dorso do mar? A imagem mais próxima do que Fernando Couto sugere, encontro-a no changana quando alertamos as pessoas para não se esconderem na clareira. Isso derrota todo o sentido da palavra “esconder-se”. É como quando crianças tapam os olhos e pensam, assim, que estão fora da nossa visão.
A procura é central ao empreendimento epistemológico dos nossos compatriotas zangados. A procura de vestígios. Participar no debate público de ideias é identificar sinais de onde alguém se situa. O que a pessoa contribui, como opinião, para o debate não vale pelo conteúdo. Vale pela indicação que a pessoa dá do lado do debate onde se encontra. Vamos ser mais precisos. Se a discussão é sobre Mugabe – outra vez! – e um de nós emite opinião sobre o assunto dizendo que é preciso incluir na reflexão o papel negativo desempenhado por Tony Blair, por exemplo, o que conta não é a sugestão em si, mas sim se a sugestão coloca a pessoa do lado dos que estão a favor de Mugabe ou não.
É o mesmo com a corrupção. Se alguém pergunta se a corrupção é mesmo assim tão má para o desenvolvimento do país – e que desenvolvimento, já agora – a atenção vira para aí mesmo: está a defender a corrupção? Se os doadores reduzem o auxílio ao país e alguém – já agora, eu – pergunta se as razões que eles oferecem para isso são plausíveis ou não, não se discutem as reticências que essa pessoa – eu – formula. Pergunta-se se foi de novo chamado em defesa do governo. Mesmo que na mesma reflexão diga – continuo eu – que é preciso, por mais enganados que estejam os doadores, procurar saber porque não fizemos as coisas como eles esperavam, quem tem a culpa e o que vamos fazer para sairmos desta dependência. Não, isso não é suficiente para marcar a intenção de debater ideias. De que lado está ele, perguntam os nossos compatriotas zangados.
Os heróis da nossa vida são os que emitem os sinais politicamente correctos. Assim que um doador aponta o dedo acusador contra alguma coisa que não o agradou, o dever de um verdadeiro moçambicano patriota é imediatamente alinhar com o doador. Porquê? Mas que pergunta! Porque está tudo mal, estamos a viver na podridão, e os doadores não se enganam. Não se pode perguntar se o dedo que os doadores apontam tem a sua razão de ser. Todo o moçambicano patriota e democrata concorda com tudo o que vem do lado certo. Há alguns anos a USAID patrocinou a publicação de um horrível relatório sobre a corrupção com uma definição do conceito central que não passaria nenhum teste de primeiro semestre em curso de pesquisa social empírica, e os nossos compatriotas zangados bateram palmas. Não foram verificar. Não se interessaram nem um bocado por isso. Certificaram-se apenas de que se estava a bater no governo. Isso é que é fundamental. Bater no governo. Porquê? Mas que pergunta! Porque está tudo mal, temos um governo de corruptos!
Sem vestígios é a fala na esfera pública. A fala afirma a sua presença com as razões que proporciona para as conclusões que tira. E num primeiro momento é só isso que conta. O Manuel de Araújo, deputado da Renamo, disse que a política regional em relação ao Zimbabwe está errada? Muito bem, que razões proporcionou ele para fundamentar essa conclusão? Repito: num primeiro momento não conta o facto de ser da Renamo. Conta o que ele disse. E é isso que ele está a trazer à discussão. É discutindo as suas ideias que havemos de valorizar a sua contribuição para o fomento deste país. Destacar o lado do debate onde ele se situa é a forma mais segura de fechar o assunto e viver apenas de certezas mal formuladas.
Mas procurar saber se alguém está connosco ou não, agrada aos nossos compatriotas zangados. O importante é terem razões para estarem zangados.
*Sociólogo/Nosso colaborador
ELÍSIO MACAMO - Sociólogo/Nosso colaborador
Maputo, Segunda-Feira, 13 de Outubro de 2008:: Notícias
Hezbollah media chief killed in Israeli strike in Beirut
-
The head of Hezbollah's media office, Mohamad Afif, was one of the group's
few remaining public faces.
56 minutes ago
No comments:
Post a Comment