Monday 1 September 2008

TOMBOU O EMBONDEIRO DE ULONGUE!


Foi com incredulidade e consternacao que recebi Sabado ultimo, a noticia do desaparecimento fisico do Dr. David Aloni, membro do Conselho de Estado, ex-deputado e membro da Comissao Permanente da Assembleia da Republica, Conselheiro da Agenda 2025, membro do Conselho Nacional e Ministro da Industria e Comercio no Governo-Sombra da Renamo.

A morte de David Aloni, e uma perda irreparavel nao apenas para o pais, mas tambem para a oposicao, para os cidadaos das provincias da Zambezia e Tete e da populacao do Distrito de Ulongue, sua terra natal. E uma perda para a juventude mocambicana que via em David Aloni, um modelo singular de dirigente comprometido com a causa do seu povo! Um dos poucos dirigentes deste pais, que sabia colocar os interesses do pais acima dos interesses partidarios, regionais, familiares ou pessoais. David Aloni era um mocambicano de raiz, um patriota que amava o seu povo e a sua cultura! Um patriota que amava as suas gentes e que nao discurava suas origens camponeses mas aristocraticas dentro da 'estrutura filosofica negro-africana', como ele propria e muito bem o sabia definir. dono de uma escrita peculiar, David aloni sabia destruir com razao, sem ofender nem beliscar o adversario. Os seus lendarios discursos e intervencoes do pulpito da nossa Casa Magna, a Assembleia da Republica, seus artigos imortalizados nos semanarios Zambeze, Magazine Independente e Savana sao disso testemunha. A sua obra intelectual iniciada ao longo da sua formacao quer no seminario, quer em Portugal ou no Reino dos Paises Pais onde se doutorou (PhD)em Sociologia e Relacoes Internacionais e uma autentica biblioteca e passa pela publicacao ainda antes da independencia nacional ou pouco depois de duas obras de valor inestimavel. Oxala a academia mocambicana saiba valorizar o trabalho intelectual deste filho da patria mocambicana, que teve o 'azar' e por isso pagou o preco, de estar do 'lado errado da historia' e amar seu povo e suas origens, segundo seus detratores, que o idolatravam em surdina mas o odiavam e invejavam pela fulminencia e lucidez de seu raciocinio.

Apagou-se uma estrela na noite intelectual mocambicana. Morreu David Aloni, Um homem de grande caracter e inteligencia. Um homem que representava a integridade moral e coerencia.

Morreu David Aloni sem ter realizado dois dos seus sonhos. Leccionar e ver sua terra respirar o ar puro da democracia materializada na alternancia do poder, liberdade de opiniao e de expressao. Para meu desconforto, varias faculdades deste pais, publicas e privadas negaram-lhe o direito simples defendido pela nossa Constituicao da Republica- o direito de leccionar! Vi e vivi como isso lhe corroia a alma. Mas mesmo assim, nunca o vi desistir ou desfalecer ou curvar-se perante seus adversarios, quer internos quer externos!
A sua ultima aparicao publica foi na ultima Quinta Feira no Hotel VIP, no debate sobre o 'Impacto da Zona de comercio Livre na economia Mocambicana;, organizada pelo Centro de Estudos Mocambicanos e Internacionais (CEMO) de que era fervoroso apoiante e conselheiro. Aloni, como sempre, leu a sua intervencao.

Morreu David Aloni – meu modelo de academico, professor, mentor e quica pai ideologico!

Conheci o Dr. David Aloni na Cidade de Quelimane. Andava eu na 7a classe na Escola Secundaria 25 de Setembro, vulgo ‘Liceu’. Aloni era director da Enacomo, uma empresa que procedia a distribuicao e comercializacao de produtos alimentares na provincia da Zambezia e mais tarde da Companhia da Zambezia ou vice-versa.

Na altura andava eu 'apaixonado' pela poesia e fazia parte de um grupo de estudantes do ‘liceu’ que faziam parte do Nucleo de Artistas e Escritores da Zambezia (NEAZA). E logico que com catorze anos nao eramos membros efectivos, eramos uma especie de aprendizes de sapateiro, de ‘continuadores’ da NEAZA. Faziam parte do grupo o Armando, o Belarmino Varela de Barros, o Octavio e outros. Uma vez por mes, aos Sabados a tarde reunia-mo-nos nas traseiras do Gabinete do Governador, no Restaurante Aquario, para algumas tertulias poeticas, acompanhadas de poesia e quica de alguns comes e bebes, sempre e infalivelmente, gentilmente patrocinadas por David Aloni, na companhia do tambem sempre jovem poeta e escritor Joao Inroga-Pai.

David Aloni notabilizava-se nao apenas na direccao do nucleo, mas essencialmente na simplicidade, no carinho e esperanca com que tratava os seus 'continuadores', os continuadores do seu sonho de poeta. Lembro-me das inumeras vezes em que David Aloni, com a paciencia de chines, corrigia e nos mandava redigir de novo os poemas e contos, ate atingir os 'minimos exigidos para uma apresentacao em publico'. Era um pedagogo exemplar, de se lhe tirar o chapeu.

Estavamos em Guerra. Lembro-me do dia em que o Dr. Aloni nos levou para um apartamento, no Predio Bulha para vermos ‘in loco’ um video que mostrava como os ‘bandidos armados’ haviam arrasado a Vila de Milange e com eles levado todos os zincos da vila. Na altura contavam-se as pessoas que na Cidade de Quelimane possuiam um video. E ele era dos poucos e vivia, se a memoria nao me trai, numa casa da Companhia da Zambezia, a alguns metros do palacio do governador provincial.

Essa imagem de uma vila sem zincos nunca mais saiu do meu imaginario, tendo marcado toda a minha vida! Tinha sido, a primeira percepcao vivida por mim, sobre os efeitos nefastos da Guerra, que apenas ouviamos falar na rua, ou entao pela radio, pois na altura nao havia sinais de televisao na Cidade de Quelimane.

Confesso que uma das maiores decepcoes que tive na minha curta mas excitante vida politica foi ter sido eleito deputado da AR foi, e nao ter podido estar lado a lado com a sabedoria do ‘meu professor’ e mentor social e politico!

Do Dr Aloni aprendi uma coisa que prezo e prezarei ate ao fim dos meus dias de vivente neste vale de lagrimas: a ser coerente comigo meso e nunca manter-me calado! Todas as vezes que nos encontravamos, e a ultima foi quando o convidei para dar uma palestra majestral no Hotel Rovuma sob os auspicios do CEMO sobre 'A xenofobia na Africa do Sul', o Dr Aloni perguntava-me. continuas a dar aulas? -meu filho, 'nunca abandones a academia'!.

A avaliar pelos recentes acontecimentos no Municipio da Beira, sem querer ser advinho, posso imaginar que deve ter-lhe doido a alma! Aloni defendia a cultura democratica com unhas e dentes. Na obra Mocambique 10 Anos de Paz, de Brazao Mazula, Aloni disse sem papas na lingua: 'Na dimensao politica, importa referir que, aquilo que seria de desejar-a reconciliacao nacional entre os mocambicanos a luz do artigo 66 da Constituicao da Republica, ainda nao se efectivou. E ainda uma miragem porque ainda persistem os resquicios dos anos da Guerra agravados por preconceitos que levam a exclusao social de uma boa parte da sociedade mocambicana, porque se institucionalizou o espirito de clube', para depois rematar: 'Multipartidarismo, sim; democracia, sim, mas tudo quase so no papel. De boas intencoes estao cheios os nossos dirigentes politicos, mas, na pratica, nada acontece, porque o principio e: 'quem nao esta comigo, 'esta ipso facto, contra mim'

E dificil aceitar esta orfandade. A natureza e por vezes injusta. Muito injusta!

Saibamos pois valorizar esta dadiva humana. Saibamos preservar a obra, a memoria e o legado deste 'homem incompreedido pelos seus e pelos demais.'

David Aloni era a reserva moral e intelectual do oposicao em Mocambique! Os seus ensinamentos ficaram indelevelmente registados na historia desta patria indica.

Em memoria deste grande HOMEM, deste PATRIOTA de credenciais indescritiveis, deste nacionalista ferrenho, intelectual e academico de finura e perspicacia inigualavel, homem de uma verticalidade estonteante, parlamentar e debatedor de primeira agua, lider incontestavel de massas como o demonstrou quando cabeca de lista nas provincias da Zambezia e de Tete com vitorias estonteantes, africanista de gema, ficaremos ate Quarta feira, dia previsto para o seu enterro sem blogar!

A familia enlutada, a esposa, ao Paulo, Carlitos, Miguel e Arlete, vao os nossos mais sentidos pesames! Estamos de luto: Perdemos um pai, biologico para voces, mas ideologico para mim!

Saibamos valorizar e preservar o pensamento, a imagem, a luta, a causa, a memoria e fundamentalmente o legado deste Embondeiro de Ulungue!

Onde tomba um combatente pela liberdade, nascem milhares de combatentes! Que o caule do seu giganteco tronco, adube o solo de onde nascerao milhares de embondeiros com caules ainda mais pujantes, eloquentes e frondosos!

Continuaremos com a luta, porque a nossa luta e JUSTA!

PAZ A SUA ALMA!

BAYETE, COMANDANTE ALONI!

Manuel de Araujo (LONDRES)

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