Friday, 12 September 2008

Chang em Primeira mao!


Na relações com parceiros : Nem sempre se fala a mesma língua
A ajuda externa para o orçamento do Estado vai registar um crescimento de 18 por cento em 2009, o que contradiz as recentes informações postas a circular dando conta da existência de uma alegada intenção de redução de financiamento por alguns países por não concordarem com a forma como o dinheiro está a ser aplicado. Segundo o Ministro das Finanças, Manuel Chang, à excepção da Suíça que poderá baixar 2,8 por cento do seu apoio, ou seja, de 6,1 milhões de dólares de 2008 para 5,9 milhões de dólares em 2009, todos os restantes países do grupo dos 19 parceiros de apoio programático vão manter uma tendência de crescimento nos seus financiamentos. Em relação à Dinamarca, Manuel Chang considera que, contrariamente ao que foi veiculado, este país já se comprometeu a aumentar a sua ajuda o mesmo acontecendo com os números apresentados pela Suécia. Numa entrevista ao nosso Jornal, o Ministro das Finanças refere que muitas vezes o que acontece é que se confundem roubos de fundos e corrupção.

Maputo, Quinta-Feira, 11 de Setembro de 2008:: Notícias
NOT - Nas últimas semanas alguns países como Suécia e Suíça anunciaram a redução do seu apoio ao Orçamento Geral do Estado. Quanto é que cada país vai reduzir?

M. Chang – Em relação a esse aspecto, primeiro, queria informar que relativamente aos compromissos de 2008/2007 houve crescimento em termos de apoio dos parceiros. Em relação aos desembolsos dos fundos comprometidos para 2008, a avaliação que foi feita até ao dia 2 de Agosto, é que eles estão a ocorrer normalmente, portanto, na nossa verificação nota-se que a Suécia, a Dinamarca e Noruega desembolsaram os seus fundos no primeiro trimestre deste ano. Há alguns países que ainda não desembolsaram, mas é normal haver atrasos de mais ou menos um mês. Contudo, a avaliação global que fazemos em relação aos desembolsos dos compromissos dos parceiros para o apoio directo ao orçamento está tudo a correr normalmente.

Em relação a 2009, aquilo que são os compromissos já assumidos pelos parceiros mostra-se um crescimento global de 18 porcento. Dos 19 parceiros do apoio programático 16 parceiros mantém níveis de crescimento e mantém o nível de apoio, outros dois apareciam com um decrescimento já na altura dos compromissos.

NOT – Quais são esses países?

M. Chang - Esses países eram a Suíça e a Dinamarca. Mas, a Dinamarca, nestas negociações que tivemos com o Ministro das Finanças ele, perante aos jornalistas, comprometeu-se a fazer a rectificação aumentando aquilo que são os compromissos de 2009. Até há um documento da Dinamarca que mostra isso. Portanto, temos apenas um país que, de facto, em relação aos compromissos de 2009 tem algum decrescimento que é Suíça e isto pode ser verificado. Em relação à Suécia, nós temos um crescimento de 5.73 porcento comparando 2008 com 2009. Numericamente, podemos dizer que em 2008 foram desembolsados 44.5 milhões de dólares, 2009 são 47.1 milhões de dólares. Em relação à Suíça notamos um decrescimento de 2.8 porcento, ou seja vai se baixar de 6.1 milhões de dólares em 2008 para 5.9 milhões de dólares.

Portanto, o meu posicionamento pessoal como ministro das Finanças é que relativamente a 2009, nós estamos bem porque já há compromissos que nos garantem que o Orçamento pode ser feito e tem um crescimento global que como disse é de 18 porcento.

NOT - Quais sãos as causas que eram ou que são apontadas para as reduções do apoio?

M. Chang – Nos compromissos não há causas. É que quando fazemos as reuniões anuais com os parceiros, depois daquele trabalho aturado que realizamos com os 19 parceiros de cooperação faz-se a análise da execução do ano anterior e depois assume-se os compromissos. É preciso ver que a análise que foi feita pelos doadores este ano, principalmente na área da Gestão das Finanças Públicas foi positiva. Há algumas áreas que eles consideram que não estavam a atingir aquilo que é a satisfação ideal neste relacionamento e que em princípio discutimos e vemos o que é possível fazer. Mas, nunca foi referida frontalmente a questão de que há redução porque há algum problema aqui ou doutro lado.

NOT – O Embaixador Sueco quando aparece a falar à imprensa publicamente, comunicando que eles vão reduzir o apoio ao orçamento. O que é que ele estará a dizer na óptica do ministro das Finanças?

M.Chang – Eu não gostaria de entrar na análise das suas afirmações.

NOT – Mas há ou não redução?

M. Chang – Nos valores comprometidos para 2009 não há redução. Onde se nota a redução é para com a Suíça onde há uma baixa de 2.82 porcento, mas como dizia, no global há um crescimento de 18 porcento. É preciso entender que estes parceiros funcionam como um grupo, portanto, é o tal grupo dos 19 parceiros que apoiam o Orçamento e eles têm um “task force” da parte deles que, neste momento, é dirigido pela Irlanda. E é com este grupo que temos estado a discutir os assuntos considerados importantes para as duas partes.

NOT – O que a Suíça falava é que a redução era insignificante, mas que era um sinal de alguma insatisfação.

M. Chang - Mas é a tal coisa. Analisando todo este pacote de doadores que trabalham juntos, nós quando assinamos o acordo com os 19 parceiros que apoiam o Orçamento do Estado era para, primeiro, termos a mesma forma de diálogo, mesma forma de prestação de contas, auditorias. Pretendíamos que o espírito dos 19 parceiros fosse o mesmo. Agora, durante as reuniões, no grupo todo, tínhamos apenas dois países que estavam na linha de baixar o orçamento que eram a Dinamarca e a Suíça. Como disse, no caso específico da Dinamarca, o compromisso do ministro das Finanças perante as autoridades de Moçambique e perante a própria imprensa e perante o documento que eles enviaram, de facto, negam que possam reduzir, pelo contrário, eles querem aumentar a ajuda. O ministro das Finanças da Dinamarca negou rediscutir aquilo que foi o passado das relações e quer olhar para frente.

NOT – E com a Suécia?

M. Chang - Com a Suécia há esses pronunciamentos que nós ouvimos e que também estão aqui a me colocarem, mas quando olhamos para os números eles não estão na linha daquilo que estão a dizer. A não ser que venha a acontecer, mas não nos compromissos que eles já assumiram não encontramos a lógica.

NOT – Como ministro das Finanças sente que o diálogo é profícuo, ao contrário das alegações que são colocadas, por exemplo, pela parte Suíça de que há pouco diálogo?

M. Chang – Eu sinto que há diálogo. Aliás, há várias formas de diálogo que temos com os parceiros. Cumprindo aquilo que está estabelecido nos memorandos, mas também fora disto. Hoje recebi o embaixador de Portugal aqui, que vinha se despedir, mas aproveitámos para discutir outros aspectos, para dizer que temos tido diálogo como o fizemos com a Dinamarca há pouco tempo. Eu sinto que há diálogo e nós como Ministério das Finanças temos a obrigação de fazer tudo aquilo que deve ser feito para que se garanta a canalização dos fundos que precisamos para o orçamento. Ainda precisamos desses fundos porque estamos a realizar projectos de investimento que, infelizmente, ainda não temos capacidade para financiá-los.

É preciso ver que para verificarmos se há problemas ou não, é só verificarmos os desembolsos deste ano e aquilo que é a forma de desembolso. Portanto, nós encontramos, no primeiro trimestre do ano, a Holanda, Noruega Canadá, França, Irlanda, Suécia, Reino Unido e Dinamarca. No segundo trimestre está a Bélgica, Itália e Áustria. No terceiro trimestre, acabam de desembolsar a Finlândia, Suíça e União Europeia nos dias 12, 19 e 20 de Agosto, respectivamente. Portanto, olhando para este quadro é possível ver que este problema não se coloca, neste momento, nem para o próximo ano isso olhando para aquilo que são os compromissos. Eu estou tranquilo, mas sinto que devemos continuar a trabalharmos para a satisfação daquilo que é necessário fazer para que os nossos parceiros também se sintam tranquilos.

NOT – A corrupção tem sido um dos pontos que são insistentemente colocados pelos doadores. Como ministro das Finanças está satisfeito com o trabalho que é desenvolvido para o combate a este mal?

M. Chang - O problema não pode ser visto só dessa forma. Eu penso que tem que se analisar essa questão no quadro das reformas. O país já fez reformas no sector financeiro que, a nível da África, é dos melhores, portanto, refiro-me a existência de bancos comerciais ou das instituições financeiras. Há instrumentos que nós conseguimos ter aqui no país, temos reformas no sector fiscal e que estamos a fazer ainda. Na área aduaneira já fizemos e encontramos resultados positivos na área fiscal e muitas outras. Neste momento, o ponto mais alto do governo é a reforma do sector público e judicial. É onde o governo está empenhado em realizar acções que visam precisamente eliminar essas situações. Portanto, o trabalho é ainda grande para ser feito pelo governo e não só. Agora, o que é preciso sentir é que se está a fazer um trabalho e em nenhum momento se pode dizer que o governo está a fazer ou não está a fazer. Os primeiros a quererem sentir a eliminação dessas situações é o próprio governo. Se o Orçamento do Estado poder ser executado como deve ser, podermos fazer muito mais com os recursos do orçamento, aí estaremos a conseguir aquilo que de facto são os resultados que nós queremos.

Na verdade, sentimos que há momentos que ainda não conseguimos ter os resultados que desejamos ter. Portanto, mesmo em termos de realização da despesa ainda não conseguimos esgotar o trabalho mesmo na área da reforma do sector público e do sistema judicial não estamos ainda em condições de dizer que agora estamos bem. Contudo, estamos a trabalhar na linha de que é preciso criar condições propícias para o aumento do ambiente de negócios.

Not – Mas, na discussão com os doadores do G-19 e outros, há uma linguagem comum sobre a corrupção?

M. Chang - Nalguns momentos não, porque eu às vezes costumo dizer que não se pode confundir corrupção com roubo. Se há roubo numa instituição do Estado não é corrupção, é roubo mesmo e a pessoa que roubou deve ser penalizada, porque uma coisa é roubar e a outra é corrupção.

Not – Não acha que esta falta de clareza faz alguma confusão?

M. Chang – Eu acho que sim, penso que nalgum momento isso traz confusão. Portanto, há questões que são analisadas e descobre-se que alguém roubou dinheiro que devia servir para pagar professores no distrito tal ou na província, esse caso é tratado como crime e é remetido imediatamente para as instâncias judiciais para efeitos de tratamento, mas não se pode dizer que isso aumenta o número de casos de corrupção. Não sei; a minha análise é que há casos que são roubos, que sempre aconteceram e, felizmente, o SISTAFE está a tentar reduzir essas situações. Agora, corrupção é um fenómeno talvez difícil de abranger porque são as tais utilizações de influência, desgaste de recursos de forma mais difíceis.

Not – Eles como donos dos dinheiro já apresentaram alguns indícios de coisas que acham que é corrupção e o Governo tenha reagido ou não reagido?

M. Chang - É difícil eu, pessoalmente, ter que abordar este ponto. Julgo que a nível do governo existe algum sector que pode dar este tipo de exemplos, mas eu pessoalmente, não tenho exemplos, embora sinto que nós temos que aceitar aquilo que são as percepções que cada um deles tem porque bom, se eles estão a desembolsar fundos dos seus países para aqui, o sentimento que têm é o mesmo que também tenho: os fundos têm que ser bem usados. Agora, há uma coisa que eles apreciam e que têm estado a referir nos seus relatórios. É que eles apreciam a forma como estamos a gerir esses fundos. A forma transparente sobretudo.

O último relatório que temos dos 19 parceiros, a apreciação do capítulo da gestão dos fundos das finanças públicas teve maior cotação. Estranho é que faz-se esta análise positiva, mas a seguir coloca-se a questão da corrupção, então, não consigo entender por quê isso. Então, aqui está a dificuldade de perceber porque na minha área nós sentimos que esta questão havia nas Alfândegas, mas o trabalho que estamos a realizar lá leva que haja redução do fenómeno de corrupção. Portanto, ao nível do sector que estou a dirigir neste momento, sinto que de facto, os problemas estão a reduzir e a utilização de métodos duma gestão transparente, a implementação do SISTAFE pode e está a mostrar como é que as coisas são feitas. A publicação dos decretos 54 sobre os concursos também mostra a nossa vontade de que tudo aquilo que é a utilização dos fundos do estado para a contratação tem que seguir normas bem estabelecidas.

HÁ PROBLEMAS ESTRUTURAIS NO ORÇAMENTO?

Maputo, Quinta-Feira, 11 de Setembro de 2008:: Notícias
NOT – Os últimos relatórios que têm vindo a ser publicados pelo Tribunal Administrativo têm apresentado questões problemáticas como sãos os casos de desvios de aplicação, métodos não transparentes e não cumprimento dos procedimentos. O que é que está a acontecer?

M. Chang – A minha reacção, mesmo na Assembleia da República onde, felizmente, o relatório é aprovado, detecta-se algumas situações que na óptica da legislação actual não estão bem, mas a explicação económica existe. Portanto, desvio de aplicação porquê: é que o nosso orçamento é muito reduzido. Se nós quisermos cumprir o que está nas linhas orçamentais em termos de despesa significa que o governo no meio do ano podia parar porque o Parlamento funciona da forma como nós sabemos. Para corrigir alguma coisa do orçamento tínhamos que esperar a realização duma sessão plenária.

NOT – Está a dizer que há problemas estruturais?

M. Chang – Sim, há problemas estruturais e que podem ser corrigidos. Não significa que há desvio de fundos, mas é mais no sentido de que no lugar de fazer um projecto, foi se fazer um outro projecto e na óptica do Tribunal Administrativo há razões para se dizer que houve desvio de aplicação. É só ver por exemplo, um Orçamento que tenha uma dotação que era para fazer um projecto já aprovado e está na lista, mas no decorrer do ano, em Janeiro ou Fevereiro, verifica-se que aquele projecto por qualquer motivo não vai ser feito. Então, o que nós fazemos é não deixarmos aquele dinheiro, porque no ano seguinte já não tenho as possibilidades que tinha, então, o que fazemos é meter um projecto que já estava no pipeline. Agora, quando-se faz a conta faz-se de acordo com aquilo que nós executamos. E o que é que faz o Tribunal, ele verifica que aquele projecto que foi feito não estava no orçamento.

Not – Sendo um problema estrutural não é uma disfunção de procedimentos no funcionamento normal. E sendo, qual é a correcção que se pode fazer?

M. Chang – A correcção tinha que ser por via da legislação ou tínhamos que ter uma capacidade de financiamento do orçamento mais folgada em que de facto o orçamento chegasse até ao final do ano. Assim, se se deixasse de executar um projecto não haveria problemas porque o dinheiro ficaria lá. Mas, neste momento, a situação que vivemos é esta de que, de facto, deixar de fazer um projecto para o ano seguinte é complicado porque o outro ano tem os seus problemas. As outras situações tem a ver com as de emergência e outras que surgem. Por exemplo, quando houve a explosão do Paiol de Malhazine tivemos que entrar com o dinheiro, felizmente, tivemos nesse ano capacidades adicionais de receita em que fizemos uma revisão orçamental. Mas aquilo que o tribunal indica nos seus relatórios são situações em que os auditores têm que apontar porque eles encontraram, mas agora, é preciso ficar claro que não se trata dum desvio de levar o dinheiro para ir fazer coisas que não têm nada a ver com Estado. Tem a ver com o Estado só que não estavam lá dentro precisamente porque os recursos são poucos.

NOT – Não sendo o apanágio do Ministério das Finanças que é de uma área inter-sectorial, o que é que o seu pelouro está a fazer para que não haja este tipo de disfunções?

M. Chang - Nós temos tido contactos com o Tribunal, aliás a própria Assembleia da República, na última sessão que houve, na aprovação da conta, voltou a haver esta recomendação de que o governo e o Tribunal Administrativo deviam encontrar uma solução para este assunto. Significa ou revisão da legislação ou outra forma de solução. Eu sei que o trabalho está a ser feito. Ao nível do Ministério das Finanças tem estado a trabalhar nisso o secretário permanente e acho que é hoje ou amanhã que eles vão ter mais um encontro ligado a outras matérias que é a questão do visto do Tribunal em relação aos contratos de obras públicas. É que nós sentimos que deveríamos conversar com o tribunal para ver se é possível adiar algumas situações sobretudo de algumas pequenas obras em que os concursos realizados têm que obedecer aquele critério da legislação, mas que leva algum tempo para se conseguir isso.

Nós temos estado a cumprir as recomendações, anualmente, cumprimos aquilo que é dito e há melhorias. Agora se quer saber, nenhum auditor fica satisfeito ou gosta de dizer que está tudo bem. É preciso ver que a responsabilidade do auditor não é detectar coisas boas, mas é encontrar coisas más. Esse é que é o trabalho dele, para dizer que quando vejo o relatório do Tribunal Administrativo, sobretudo este último, tenho estado a saudar porque ajuda-nos a melhorar a nossa situação. O mais importante é que mantemos a linha de que a conta do estado tem que ser feita de três em três meses. Nós temos que fazer um relatório que tem que ser publicado na imprensa sobre a execução do orçamento do estado. Neste momento já saiu o relatório do segundo semestre, e ele é público. Isto ajuda-nos na tal melhoria, na tal gestão das Finanças Públicas.

SETE MILHÕES: UM RISCO CALCULADO

Maputo, Quinta-Feira, 11 de Setembro de 2008:: Notícias
NOT- Quanto dinheiro é alocado anualmente para o Fundo de Apoio a Iniciativas Locais?

M. Chang – Nós começámos com um orçamento de sete biliões para cada um dos distritos há três anos. Esse orçamento era para ser distribuído duma forma uniforme para cada distrito. No exercício passado, em 2008 já alterámos os critérios de afectação por distritos, quer isto dizer que há distritos que receberam mais dinheiro que os outros.

NOT – Mas, quanto é que é alocado no global?

M. Chang – Em 2008 nós afectámos o valor de 1322,7 milhões de meticais para investimento de decisão local nos distritos. Deste montante 308,1 milhões foram para infra-estruturas. Então, o que nós estamos a pensar é que este valor vai subir ligeiramente em 2009. A afectação por distrito, por exemplo, em 2007 tínhamos distritos que tinham 7,8 , mas outros que tinham 9,4 milhões. Em 2008, há ainda distritos que tem 10,7 e 10,9.

NOT – Há clareza sobre para quê se destina esse dinheiro?

M. Chang - Esse dinheiro é essencialmente para projectos, ou seja, é um valor que vai servir para criar o Fundo de Desenvolvimento Distrital. Portanto, nós estamos a financiar actividades que são feitas em cada um dos distritos. Por exemplo, se um distrito é potencial em pecuária a maior parte desse financiamento vai financiar actividades que tem maior potencial nos distritos para que as famílias camponesas possam desenvolver essas actividades e poderem ter dinheiro de amortização desse valor que é dado a título devolutivo. Este valor quando é devolvido reforça o tal Fundo de Desenvolvimento Distrital. Não volta para o orçamento central do Estado.

NOT – Os reembolsos satisfazem aquilo que eram as expectativas do Governo?

M. Chang - É por isso que se tem chamado a atenção para as pessoas perceberem que este fundo não está a ser oferecido, está a ser utilizado, precisamente porque achamos que nesses distritos não há bancos. Os bancos só existem em cerca de 28 distritos e se nós queremos que nos 128 distritos haja actividades desta natureza, alguma coisa tinha que ser feita. Digo alguma coisa igual àquela que já fizemos na pecuária. Lembram-se que na pecuária nós tivemos um programa de fomento do gado em muitos distritos. Magude é um deles e esta é, exactamente, um processo igual, só que desta feita usa-se dinheiro.

A ideia é que se há no distrito pessoas que podem fazer trabalho de carpintaria, mas não o fazem porque não têm capital para iniciar. Este dinheiro pode ajudar a arrancar com a actividade e fazer o trabalho para o distrito, mas tem que devolver o dinheiro.

NOT – Temos a consciência de que o Governo, sobretudo o Ministério das Finanças não são aventureiros. Tinham a consciência de que uma parte desse valor não seria reembolsado?

M. Chang – Nós quando tomamos esta decisão sabíamos que o dinheiro não voltaria para os cofres do Estado, é por isso que estou a dizer que este fundo visa a criação do Fundo de Desenvolvimento Distrital.

NOT – Mas qual era a previsão sobre o nível de retorno para que de facto, se entrasse num nível circular?

M. Chang – O que aconteceu nos primeiros anos é que os distritos pegaram neste dinheiro e utilizaram para acções que não têm retorno. Isso corrigiu-se depois em 2008. Atribuiu-se valores para esse efeito que é o valor para infra-estruturas. Portanto, há distritos que quando receberam aquele dinheiro viram que não tinham infra-estruturas para o funcionamento duma instituição, ou para professores e usaram o valor para esses efeitos. Bom, aí temos a consciência de que não haverá retorno, naturalmente. Mas aquele que foi entregue às associações a pessoas privadas, aí sim, esperamos pelo retorno.

NOT – Acreditam que os conselhos consultivos e as administrações têm capacidade para gerir os valores que tendem a aumentar cada ano que passa?

M. Chang – O problema é que se tu esperas por essas capacidades, de facto, não sei se mesmo nós, aqueles que nos dão o financiamento se esperassem pela criação de capacidades, talvez, hoje a gente tenha, mas há uns anos atrás, teria sido complicado. O mais importante é que o objectivo principal é que nós queremos olhar para frente.

NOT – Estamos a aceitar que há consciência de que esse tal retorno, mesmo para as cooperativas, a probabilidade é pequena?

M. Chang – Eu como ministro das Finanças não posso assumir isso. O mais importante é que há um objectivo e este objectivo acredito que vai ser alcançado em dois a três anos o que passa pela geração de comida e geração de emprego. Já começa-se a se sentir isso nos distritos e dentro de três anos as coisas vão melhorar e estarão no lugar. O que nós queremos é que esses retornos, o próprio Governo distrital e os conselhos consultivos devem sentir que se querem mais no distrito deles, têm que obrigar a cobrar este dinheiro. Se querem mais, há que trabalhar mais. Hoje o Estado pode estar a dar este orçamento, mas se aquele dinheiro emprestado for reembolsado para aquele fundo, vai haver aumento do bolo e multiplicar mais. Portanto, é preciso que se entenda, e o trabalho que está a ser feito é mais para meter isto na cabeça das pessoas.

NOT – A percepção que se cria é que vai se continuar a aumentar o bolo e não se diz quando é que se vai parar com esta alocação dos fundos. Será que este saco veio para ficar?

M. Chang – Nesta altura não estou em condições de dizer até quando, mas nós estamos a acompanhar o processo. Temos o nosso sistema de auditoria que está a ser feito na utilização dos fundos e terão se apercebido que estão a ser tomadas algumas medidas que ainda não há interesse na sua publicitação, mas que estão a ser tomadas. Essas medidas incluem, mesmo a exoneração de alguns administradores.

Not – Até que ponto os administradores não ficam vítimas dum processo de gestão de dinheiro que é não é função deles?

M. Chang – O administrador não deve se preocupar em gerir apenas aquilo que é o Orçamento do Estado, mas tem que estar atento a aquilo que são as doações directas para o distrito. É tão simples como isso. Não pode chegar alguém com dinheiro dentro do território do distrito, ir montar um projecto sem que o administrador ou outro órgão distrital tenha aprovado esse projecto. É preciso entender que nos distritos também foram reforçados os órgãos com a nomeação dos secretários permanentes que são mais agentes de execução, mas o administrador em termos políticos é responsável e tanto que, ele é responsável por aquilo que são os recursos da zona. Eu penso que é só o administrador pegar nos instrumentos que tem e saber utilizar, porque se ele consegue ir dando as capacidades financeiras a tudo aquilo que desponta no distrito é a melhor coisa que ele pode fazer.

Not – Mas, donde é que vem este dinheiro?

M. Chang – É o Orçamento do Estado, é a componente interna do nosso orçamento.

Not – Qual tem sido a reacção dos parceiros que colocam este dinheiro que para já não vai retornar ao Orçamento Geral?

M. Chang – Inicialmente, antes de perceberem bem o alcance do programa havia uma pequena apreensão, mas, neste momento, confesso que eles já entenderam qual é o alcance deste programa. O alcance deste programa irá superar tudo aquilo que se acha, neste momento, que são perdas. Portanto, estas questões macro são sempre assim, quando se trata de uma indemnização, uma compensação, tudo isto é para dentro daquilo que são as medidas que tem que ser tomadas para que a vida esteja normal e se alcance a tal estabilidade macro-económica. Numa altura em que estamos com problemas da crise alimentar mundial esta medida está a ser aceite porque o objectivo é gerar emprego e produzir comida, portanto, ele intervêm imediatamente nas acções de redução directa da fome. Também o que nós queremos é que a circulação do dinheiro seja ao nível do distrito. O nosso objectivo agora, é que em cada distrito nós tenhamos um banco comercial pelo menos. E descentralizaremos aquilo que são recursos do Estado que pertencem ao distrito. Portanto, os recursos hoje estão na província, mas têm que descer para o distrito. Toda a gente que trabalha num distrito, a partir de 2009 ou 2010 o seu salário tem que ser pago no distrito. Portanto, o dinheiro tem que circular lá e isto é que vai elevar os distritos para um nível elevado que pode superar a província.

NOT – As dificuldades que se verificam a nível dos reembolsos não reforçam a ideia de que não existe uma cultura de devolução do dinheiro. Até que ponto isto não legitima a relutância dos bancos em fazer empréstimos nas zonas rurais?

M. Chang – Eu dizia que o sector financeiro é daqueles que teve um bom desempenho, infelizmente, o que sucede, neste momento, é que os bancos não estão a ir para as zonas rurais. Na altura disseram que era preciso incentivos fiscais, nós concedemos, por isso, se os bancos quiserem abrir delegações ou dependências nos distritos gozam de certos benefícios. Felizmente, já há bancos que têm programas de abertura de agências nos distritos. Isso é bom porque é o queremos, mas enquanto isso não acontece temos que encontrar alternativas. Quer dizer, enquanto o dinheiro não estiver disponível, não barato, temos que encontrar formas de aliviar essa situação. Sobre o hábito ou cultura de devolução, eu penso que o deve ser feito é incutir as pessoas a ideia de que devem devolver este fundo da mesma maneira que se está a incutir a ideia de que as pessoas podem transformarem-se e serem empresários. Portanto nós não vamos esperar que o empresário venha de fora. Temos que nos questionarmos por que é que não pode ser um chapeiro a se transformar num empresário da área dos transportes de passageiros, por exemplo? Por que é que não podem ser esses que estamos a financiar nos distritos a se transformarem em empresários capazes de investirem noutros distritos? Quer dizer, o trabalho que estamos a fazer é nesta linha. Primeiro, é preciso valorizar o dinheiro, saber que ele serve para ser investido, retornar e pagar. Tem que haver a consciência de que não vamos importar pessoas para virem fazer este tipo de trabalhos. Há riscos, mas penso que avaliando aquilo que são os riscos e os benefícios contam mais os benefícios do programa.

NOT – São riscos já calculados?

M. Chang - Sim, são situações que nós sabemos que com o tempo serão superados para de facto passarmos para a outra fase. Temos que atravessar este deserto e passarmos para frente.

NOT – Este é um fundo que surgiu acima de outros fundos. Até que ponto não há dispersão de esforços?

M. Chang – Não há dispersão de esforços porque cada fundo tem o seu objectivo. Por exemplo, temos o Fundo de Desenvolvimento Agrícola e o seu papel é o fomento das actividades agrícolas. Ele especializa-se por essa área. Neste momento da crise alimentar não há dúvidas que esse fundo está a funcionar e, portanto, está a entrar a cofinanciar aquilo que são recursos externos. O mesmo está a acontecer em relação às pescas. Como dizia, estes fundos que estão a ser locados aos distritos são para capacitar os distritos. Nós temos descentralização que estamos a fazer e essa descentralização é orçamental e de recursos daí que se torna necessário capacitar o distrito para tudo. Como eu disse, em 2009 ou 2010, nós vamos descarregar tudo o que são acções de pagamento do Estado que estão na província para o distrito. Nessa altura, o distrito vai ter que assumir isso e se não estiver preparado, quando descentralizarmos as acções não vai ter ninguém para responder. Vamos ter que levar daqui de Maputo ou trazer não sei donde. Agora, o que estamos a fazer é que cada distrito esteja em condições até 2009.
ROGÉRIO SITOE e TITOS MUNGUAMBE in Noticias 12.09.08

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