Wednesday 13 August 2008

GUINE BISSAU

CODESRIA
Diálogo Aprofundado Sobre Questões de Pesquisa e Política
Pluralismo Político e Democracia Eleitoral na Guiné-Bissau : Que Desafios ?
De 16 a 17 de Outubro de 2008
Bissau - Guiné-Bissau
Anúncio de Programa

O Conselho para o Desenvolvimento da Pesquisa em Ciências Sociais em África (CODESRIA) tem o prazer de anunciar a realização do diálogo aprofundado sobre questões de pesquisa e política dedicado ao tema « Pluralismo político e democracia eleitoral na Guiné-Bissau : que desafios ? ». O objectivo do diálogo é contribuir para o debate sobre os desafios da construção de uma sociedade mais aberta e democrática na Guiné-Bissau. Ele foi concebido com o intuito de dar continuidade aos debates que tiveram lugar em Bissau em 2007, durante o primeiro encontro do género organizado no país pelo CODESRIA sobre a reconstrução económica, social, política e cultural pós-conflito. No final da reunião, e segundo a recomendação feita pelo Chefe de Estado da Guiné-Bissau na cerimónia de abertura do primeiro diálogo, foi adoptada uma declaração, a « Declaração de Bissau », que exortou o governo e a sociedade civil a desenvolverem iniciativas que visem a institucionalização de um diálogo permanente e de espaços de consulta mútua entre os principais actores e actrizes políticos, económicos e sociais no país. O diálogo de Bissau de 2008 será dedicado à análise do pluralismo político e da democracia eleitoral, dois temas que têm uma relevância directa para os vários grupos no país à luz das eleições legislativas previstas para o mês de Novembro de 2008. O significado destas eleições para o governo, partidos políticos, sociedade civil e para a nação no seu todo não pode ser suficientemente enfatizado se tivermos em conta a recente história de instabilidade crónica, repetidos conflitos violentos, e de sustentado subdesenvolvimento socioeconómico que tem caracterizado a economia política do país. O diálogo reunirá pesquisadores, políticos e representantes de movimentos sociais e de organizações da sociedade civil.

O debate académico e político sobre pluralismo político e transição democrática não é, obviamente, novo. Contudo, ele ganhou um novo vigor por causa das limitações que acompanharam as tentativas de construção de governos democráticos em vários países africanos. A adopção de formas democráticas de governação nos inícios dos anos 90 por muitos países africanos permitiu o estabelecimento de sistemas políticos onde políticos organizados em partidos competem para obter a maioria parlamentar e formar um governo com base em eleições livres e justas. Nesta perspectiva, alguns países são vistos como aqueles que não só conseguiram organizar eleições livres e justas, como puderam construir um sistema eleitoral próprio. Nestes casos, as eleições contribuíram para criar as bases de uma democracia estável.

Noutros casos, apesar de ter organizado eleições, a classe política não conseguiu lançar as bases de uma verdadeira democracia. Estas foram manchadas por acusações de fraude, a sociedade civil sentiu-se perseguida, as liberdades de expressão e de imprensa tiveram tendência em não ser respeitadas, etc. Num terceiro grupo de países e por razões diversas (conflito armado, cálculos políticos mesquinhos, falta de meios financeiros, etc.), as eleições não foram realizadas regularmente e quando tiveram lugar, foram na maioria dos casos fraudulentas, a justiça não pôde ou não soube fazer prova de independência, a sociedade civil foi perseguida, e os políticos não deram provas de sentido de Estado. Aliás, nestes países, o Estado em vez de ser o garante da democracia, tem servido de instrumento utilizado pela classe dirigente para explorar as riquezas nacionais em benefício próprio.

Os exemplos de países onde as eleições falharam em ajudar a aprofundar a governação democrática, e naqueles onde as eleições não são realizadas, ou quando realizadas se transformaram numa farsa, mostraram que as relações existentes entre pluralismo político e democracia eleitoral não são lineares e que a democracia não se limita simplesmente à organização de eleições. Por outras palavras, as eleições são uma condição necessária mas não suficiente para classificar um regime ou país de democrático. O pluralismo político só se torna possível se o sistema político permite aos múltiplos actores políticos autónomos exprimir interesses e pontos de vista diferentes, programas e opções divergentes em termos de organização política da sociedade, o que por sua vez pressupõe que as actividades destes actores são consideradas legais. Independentemente de contribuir ou não para a consolidação da democracia, eleições pluralistas podem também ser um elemento crítico, até mesmo decisivo na resolução de graves crises políticas ou conflitos armados, como foi o caso de Angola em 1992, da Guiné-Bissau em 1999, do Burundi em 2005 e da RDC em 2006, para citar apenas alguns exemplos africanos. Isto não quer dizer, contudo, que o processo de paz seja obrigatoriamente irreversível, especialmente quando os problemas estruturais como a justiça social, a construção de um Estado de direito e de uma sociedade inclusiva não são cabalmente resolvidos a contento da maioria da população. De notar ainda que, em certos casos, as eleições podem permitir o regresso e/ou a confirmação de líderes antipopulares no poder. A tendência em identificar eleições com democracia deve ser desencorajada se tivermos em conta certos contextos históricos e actuais no qual as primeiras contribuem para o enfraquecimento e mesmo erosão do segundo. Para um país como a Guiné-Bissau e na verdade para a maioria dos restantes países africanos, o desafio que se coloca hoje é como fazer com que as eleições contribuam para reforçar o processo democrático.

Na Guiné-Bissau, a história do pluralismo político é de data recente. Definido como um sistema onde o pluralismo é reconhecido pela lei e onde os partidos podem disputar periodicamente o controlo do poder político, tornou-se uma realidade duas décadas após a ascensão do país à independência, em 1974. Como um legado directo do colonialismo, o país conheceu um sistema político altamente centralizado. Instaurado a partir dos anos 30 com a ascensão de Salazar ao poder, este sistema tomou contornos de um regime fascista, com tudo o que isto comportava em termos de restrições das liberdades políticas e cívicas, tanto a nível da Metrópole como a nível dos territórios colonizados. Nos primeiros anos que se seguiram à independência política, o país conheceu igualmente uma concentração do poder político nas mãos de um partido único, o Partido para a independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) que fora declarado, até à revisão constitucional de 1991, o único e legítimo representante do povo guineense.

À semelhança de muitos países africanos, no decurso dos anos 90, o monopartidarismo foi abandonado e a vida política foi aberta a outros actores sociais. O artigo 4 da Constituição de 1984, que consagrava o PAIGC como força dirigente da sociedade foi abolido. Muitos factores contribuíram para a abolição do sistema monopartidário na Guiné-Bissau, entre os quais se poderia citar o profundo descontentamento e as transformações socioeconómicas que favoreceram uma acção cada vez mais autónoma de certos grupos de cidadãos e de interesses. A trajectória das reformas políticas na Guiné-Bissau foi similar ao processo que ocorreu noutros países africanos: mudança na constituição, criação de novos partidos, adopção de um novo código eleitoral, constituição de uma comissão nacional eleitoral, etc. Contudo, a experiência da Guiné-Bissau teve as suas próprias especificidades, que serão analisadas e exploradas no decurso do diálogo de 2008. Questões pertinentes a serem abordadas neste contexto serão as seguintes: Que forças sociais impulsionaram e animaram este processo de reformas políticas? Qual foi o alcance desta transição de um regime autocrático para um regime pluralista ? Pode-se considerar o processo encerrado ou ainda existem vestígios de um passado marcado pelo monopartidarismo? O que alimenta o pluralismo político guineense hoje ? Estas serão algumas das questões às quais os participantes serão chamados a responder.

A democracia liberal e as eleições pluralistas que a ela se seguiram foram apresentadas como as fórmulas mais adequadas para escolher os representantes do povo. Isto pressupõe que os representantes do povo defendem efectivamente os interesses daqueles que devem representar. Mas na maioria dos países, incluindo os africanos, a realidade raramente corresponde a esta representação teórica. Sendo assim, seria legítimo convidar os participantes do diálogo a examinar a agenda da reforma democrática em África, tomando em conta todos os factores históricos que configuram o contexto actual. Uma atenção particular será dedicada à luta de libertação nacional e às formas como o seu impacto e legados contribuíram para acelerar e configurar as reformas democráticas. Que relação existe entre a noção de democracia revolucionária, cara a Amílcar Cabral, e as exigências actuais da democracia? Em que medida os dois tipos de democracia (liberal e revolucionária) são compatíveis ?

O pluralismo, por definição, pressupõe pluralismo de ideias, de projectos de sociedade, etc. Contudo, baseando-se estritamente no tipo de programas que propõem, não parece que os partidos políticos que emergiram depois da abolição do monopartidarismo sejam fundamentalmente diferentes um do outro. Isto é notório especialmente no que diz respeito a questões como a natureza do sistema político e o papel dos partidos políticos, o modelo económico a ser seguido para o desenvolvimento nacional, as políticas sociais que devem ser seguidas, o posicionamento do país na arena internacional, o Estado de direito, a adesão aos organismos regionais e internacionais, a construção e consolidação da legitimidade do Estado, o estatuto da Guiné-Bissau em organizações regionais e internacionais, etc. As linhas de clivagem entre os partidos políticos não são propriamente ideológicas, mas resultam essencialmente da defesa de interesses particulares. Perante esta realidade, trata-se de entender o contorno do debate político na Guiné-Bissau, não somente entre os partidos políticos, mas igualmente entre estes e a sociedade civil e no seio das organizações da sociedade civil. Isto é muito importante num contexto onde a competição política tende a ser altamente conflitual mesmo se os actores políticos concordam com o princípio segundo o qual um verdadeiro sistema político pluralista está no interesse do país.

Uma das questões fundamentais sobre a qual o diálogo vai debruçar-se prende-se com a questão de como , em termos do seu funcionamento, o sistema político pode devolver o poder ao povo. Esta é uma questão que continua a estar no cerne da política guineense e de cuja resolução depende o futuro do país. Responder a ela requererá uma completa revisão de um sistema eleitoral que até aqui deu provas de incapacidade em produzir governos que sejam capazes de dar resposta às desigualdades sociais que manteve a maioria da população excluída e pobre.

O diálogo proporcionará aos participantes a oportunidade de:

1. Contribuir para a clarificação do conceito de pluralismo político e de democracia eleitoral não só no contexto da história da Guiné-Bissau, mas também noutros contextos;
2. Repensar os contornos e o conteúdo do pluralismo político e da democracia eleitoral na Guiné-Bissau ;
3. Analisar os desafios que se colocam à democracia na Guiné-Bissau e as oportunidades que existem para estender as suas fronteiras e aprofundar as suas raízes; e
4. Proceder a uma análise comparativa do caso da Guiné-Bissau com o de outros países do continente.

Para mais informações sobre o diálogo, favor contactar:

CODESRIA
A l’attention du colloque sur la lusophonie
BP 3304, CP 18524, Dakar Sénégal
Tel. : 221-33.825.98.22/23, Fax : 221-33.824.12.89
E-mail : colloque. lusophonie@codesria.sn
Site Web : http://www.codesria.org/

No comments: