Re-publicamos aqui com a devida venia, e sem comentarios pois o artigo por si so e de forma elegante espelha o que me vai na alma, um artigo de Bayano Valy originalmene publicado no seu blog (Nullius in verbas)
Cheias e montes de dinheiro
Numa Oração de Sapiência proferida na abertura do ano lectivo 2001-2002 da Universidade Eduardo Mondlane, o falecido Prof José Negrão, citado no Relatório Nacional do Desenvolvimento Humano 2005, dissertou sobre a necessidade de se aprender a viver com as cheias. Acho que a mensagem veio mesmo a calhar porque o país (principalmente a zona sul) acaba de saír de umas cheias devastadoras para a nossa infrastrutura socio-económica.
“... em meados da década de setenta, era óbvio para todos nós que as pessoas afectadas pelas cheias tinham de saír de perto do rio e ir viver em zonas mais elevadas.... Em suma, viver longe das cheias... Novas cheias vieram em 2000 e... (este princípio) foi qualitativamente alterado para o de viver com as cheias. Desenvolver um sistema de alerta rápido e eficaz, definir linhas de fuga e identificar zonas de refúgio... Esta é uma concepção totalmente diferente e nova sobre como lidar com as cheias, ou seja, novo conhecimento foi produzido baseado na nossa experiência e especificidade enquanto país... Aprender a viver com as cheias significa também tirar proveito do que de bom estas têm para dar e o que podemos aprender por causa delas...” disse Negrão.
Desculpem-me citar este longo extracto, mas tinha que o fazer sob risco de perder algum do seu sumo. Interessa-me mais a parte em que Negrão falou de “desenvolver um sistema de alerta rápido e eficaz, definir linhas de fuga e identificar zonas de refúgio.”
O governo moçambicano, através das suas várias instituições como o Instituto Nacional de Gestão de Calamidade (INGC), já desenvolveu sistemas de aviso prévio (Plano de Contingência, elaborado anualmente, sob a égide da Primeira Ministra) e está também ligado à uma rede hidrometereológica regional, entre outros. Não é por acaso que agora se fala de alertas vermelhos (o código mais alto e perigoso). Se o sistema é eficaz ou não, cabe aos peritos o julgarem.
Este novo conhecimento, como disse o Prof Negrão, permite ao país definir os meios a usarem para o socorro às populações e evidentemente criar zonas de reassentamento delas - aqui a porca torce o rabo. Uma questão prévia: quem são essas populações? são populações locais ou imigrantes? alguém pode dizer se volta-e-meia, ano após ano, não são as mesmas pessoas que são socorridas? porquê teimam em voltar para os mesmos locais sabendo que as águas eventualmente virão destruir as suas culturas? Como disse, eram questões prévias.
Há algo que ressalta nesta nova abordagem do governo. Não me recordo de nalgum momento falar-se de mortes devido às chuvas. Deve ser sinal de que a máquina de resgaste está bem oleada – acho que na linguagem das calamidades estar preparado significa reduzir possíveis perdas de vida ao mínimo. Portanto, usando este critério o governo safa-se muito bem.
O drama é mais intenso no período pós-cheias e parece que este ano vai ser pior, a julgar pelos cabeçalhos dos jornais. Fala-se das piores cheias de sempre no vale do Zambezi – não sei se é alarmismo ou realidade. Nas notícias que lí não esteve claro com que base é que o INGC diz que estas serão as piores cheias de sempre. De qualquer das formas a mensagem não podia estar mais clara para os doadores, quero dizer, parceiros de cooperação.
Hoje o Notícias anuncia que “Cheias no país: Parceiros preparam resposta de emergência”. Estão a ver o padrão que emerge? Não estou a tentar ser mesquinho, mas é que não posso resistir à tentação de questionar porquê precisamos de ter este circo quase todos os anos? Tenho em mim que parece estarmos perante um ciclo vicioso (chuvas-cheias-resgate-reassentamento-apelo humanitário-volta às origens-chuvas).
Não será altura de se procurar um outro tipo de intervenção que não passe por este drama todo? Me parece contra producente que ano após ano tenha que viver este drama. Há quem vai dizer que as populações vivem em áreas susceptíveis de cheias porque são as mais férteis. Há alguma verdade nisso, mas porque não criar incentivos para que fiquem um pouco longe das margens? Tais incentivos passariam pela criação de pequenos diques de irrigação para a prática de agricultura um pouco longe das margens – talvez o investimento, a longo termo, fosse menor em relação ao que os parceiros de cooperação nos dão sempre que há cheias (uma hipótese).
Penso que o governo deve ser um pouco mais duro na forma como lida com este tipo de situações. É irónico que para se construir barragens ou outro tipo de empreendimentos (como a Mozal, por exemplo) consegue-se reassentar as populações, mas já não se consegue quando é para mitigar os efeitos das cheias.
Evidentemente que, as populações hão-de sempre voltar quando se apercebem que o governo vai colocá-las em centros de reassentamento. Porquê não encontrar formas para quebrar este ciclo vicioso?
Já agora, qual é o papel da Hidroeléctrica de Cahora Bassa nisso? Como é que se gerem as descargas, sabido que é que neste momento estamos a falar de cerca de 6,000 metros cúbicos por segundo? A construção de uma outra barragem à jusante ajudaria a minimizar a situação? E porquê não falar de outros rios como o Save e o Buzi? O que se deve fazer?
E qual é o papel da comunidade humanitária nisso tudo? Vai sempre nos dar dinheiro quando houver problemas? Não será altura de pensarmos numa eventualidade deles desenvolver a tal “fatiga de doadores”?
E porquê é que os meios de comunicação social não procuram diversificar as suas fontes? O facto de o INGC ser o órgão estatal que lida com as calamidades naturais não implica que seja o único que possa dar uma opinião abalizada sobre o que está a acontecer naquela região.
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2 hours ago
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