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ISENÇÕES ADUANEIRAS DO PARTIDO FRELIMO
Grandes
volumes de importações são feitas através dos Portos de Nacala e de
Beira, no Norte e Centro do País, respectivamente, e conforme apurou a
investigação do Centro de Integridade Pública, as mercadorias importadas
com isenções aduaneiras abastecem a grandes comerciantes de Nacala e da
Beira.
Há cerca de um mês, o Centro de Integridade Pública (CIP) iniciou a
publicação de uma série de reportagens investigativas sobre a máfia da
fuga ao fisco que se instalou no País recorrendo à importação de
mercadorias como se se destinassem ao uso interno dos partidos políticos
quando, na verdade, são destinadas ao comércio geral no País. A
primeira publicação da série tratou da importação de viaturas de Japão e
Durban (África do Sul) pelos partidos políticos extraparlamentares. A
investigação prossegue e agora trazemos ao público os contornos das
isenções usadas pelo partido Frelimo para importar mercadorias diversas e
abastecer o mercado nacional, lesando o Estado.
Os casos que aqui apresentamos, devidamente sustentados por documentos
oficiais comprovativos, são apenas amostra das grandes importações que
são promovidas pelo partido no poder.
Na verdade o partido Frelimo não chega a importar, apenas "transmite" o
seu direito de isenção aos agentes comerciais em troca de dinheiro que
devia ir para os cofres do Estado em pagamento de Impostos.
Motorizadas, congeladores, pneus, cadernos escolares, pilhas, capulanas
são dentre várias, algumas mercadorias importadas pelos agentes
comerciais com direitos fiscais da Frelimo.
O agente comercial é que compra a mercadoria no exterior e manda passar a
factura em nome do partido Frelimo. Quando a mercadoria chega a
Moçambique, a Frelimo solicita isenção dos direitos nas alfândegas, como
se a mercadoria fosse da sua pertença. Uma vez concedida a isenção, o
partido Frelimo recebe uma percentagem do dinheiro de direitos
aduaneiros que o agente comercial deveria pagar. A outra parte fica com o
próprio comerciante. A única entidade que sai a perder neste negócio é o
Estado e por extensão o cidadão que seria o beneficiário último do
imposto desviado. Os documentos em anexo são referentes aos processos
abaixo indicados.
MOTORIZADAS
Em Junho de 2012, cinco contentores contendo 690 motorizadas entraram no
País, importadas pelo partido Frelimo de Dubai, adquiridas na empresa
RADAKRISHIN General Trading CO (L.L.C). O preço declarado da mercadoria
(incluindo frete e seguros) é de 130.970,00 Dólares. A mercadoria partiu
do porto de Chong Qing pelo navio YU Xing e foi descarregada em
Moçambique, no porto de Nacala.
No mesmo mês de Junho de 2012, mais 690 motorizadas chegaram a
Moçambique pelo porto de Nacala, importadas em nome do partido Frelimo.
As motorizadas foram adquiridas na mesma empresa que as primeiras
(RADAKRISHIN General Trading). Custaram igualmente 130.970,00 Dólares.
Foram carregadas no porto de ChongQing pelo navio Tai Bang.
Já em Julho do mesmo ano (2012), o partido Frelimo importou cinco
contentores contendo 690 motorizadas, adquiridos na empresa Top Trade
International, em Hong Kong. As motorizadas, segundo a factura da
compra, frete e seguro da mercadoria totalizou igualmente 130.970,00
Dólares. Foram carregadas no dia 24.07.2012 no porto de Shangai, China e
descarregados em Moçambique no porto de Nacala pelo navio MAERSK
SELETAR.
A 4 de Outubro de 2013, a Frelimo, ao nível da cidade da Beira, importou
497 motorizadas avaliadas em 32.300,00 Dólares, cerca de um milhão de
meticais. As motorizadas, adquiridas na ChongQing Lifan Industry (Group)
da China, foram carregadas no porto de ChongQing pelo navio Min Wei, e
descarregadas no Porto da Beira.
Um mês antes (19 de Setembro), o partido Frelimo importara, da ChongQing
Hanyuan Motorcycle Import and Export da China, uma outra empresa, três
contentores de motorizadas da China - foram 414 motorizadas -, avaliadas
em 56 mil Dólares americanos - 1.7 milhão de Meticais.
Como se pode ver, em dois anos, a Frelimo importou quase 3 mil
motorizadas. Estas foram facturas a que tivemos acesso. O que se sabe e
que estas importações ocorrem constantemente.
CONGELADORES
Em Julho de 2012, chegou ao porto de Nacala, pelo navio Kai Tong 9, um
total de 1. 610 congeladores transportados em dez contentores. A
mercadoria partiu do porto de Nanjing, na China. Os congeladores foram
adquiridos em nome do partido Frelimo na RADAKRISHIN General Trading,
Dubai ao preço de 104,00 Dólares cada. O custo total da mercadoria,
incluindo compra, frete e seguro, é de 204.440,00 Dólares.
Dois meses depois, em Setembro de 2012, chega mais um lote de 1. 610
congeladores, entrando em Moçambique pelo porto de Nacala, importados em
nome do partido Frelimo. Os congeladores foram adquiridos na empresa Al
Ranin Electronics em Dubai. Igualmente partiram do Porto de Nanjing,
China e custaram de compra, frete e seguro, 204.440,00 Dólares. Desta
vez o navio usado para o transporte da mercadoria é designado Heng Long
6.
Em Dezembro de 2013 (dia 28), a Frelimo, ao nível da cidade da Beira,
trouxe da Hong Kong dois contentores de congeladores de 15 toneladas,
contendo 340 unidades de 160 litros cada. Pela importação, o partido
declarou ter pago 31.000,00 dólares referentes à compra e ao transporte
de mercadoria.
Em Novembro do mesmo ano, no dia 21, já havia importado a mesma
quantidade de congeladores de Hong Kong, pagando o mesmo valor. Os
congeladores foram adquiridos na mesma empresa, Wiltex Limited. Ao todo,
foram 680 congeladores importados daquela empresa.
A 17 Janeiro do ano em curso, a Frelimo na Beira volta a importar pelas
mesmas vias, também da China, 10 contentores com 1.380 congeladores,
avaliados em 59.568,00 Dólares americanos, perto de dois milhões de
meticais.
No dia 23 do mesmo mês, o mesmo partido na Beira importou igualmente da
China, 10 contentores da mesma mercadoria, contendo 693 congeladores,
tendo pago, também 59.568,00 Dólares.
No mês seguinte, concretamente a 17 de Fevereiro de 2014, o mesmo
partido, na Beira, viria a importar dos Emiratos Árabes Unidos (Dubai)
cinco contentores de congeladores, ou seja, 696 unidades, avaliados em
74.589,00 Dólares, o equivalente a 2.3 milhões de Meticais.
PNEUS PARA CAMIÕES E AUTOCARROS
Em Outubro de 2013, o partido Frelimo importou, da empresa Mercury
Traders (LCC) de Dubai, 5 mil pneus de tamanhos diversos para camiões,
autocarros e viaturas turismo. O total de direitos aduaneiros que devia
ser pago pelos pneus é de 6.453.699,84 MT (seis milhões e quatrocentos e
cinquenta e três mil e seiscentos e noventa e nove e oitenta e quatro
meticais). Mas esta aquisição beneficiou de isenções com a justificação
de que tais pneus se destinavam ao "uso nos programas do partido".
Ainda em Dezembro (24) do mesmo ano, a Frelimo, em Sofala, importou da
Qingdao Doublestar Tire Industrial CO.LTD, da China, 240 pneus avaliados
em 26.000,00 Dólares, equivalente a 800.000,00 Meticais.
TECIDOS
Em Setembro de 2012, o partido Frelimo importou dois contentores
contendo tecidos, totalizando mais de 56 toneladas de tecidos. A
mercadoria foi adquirida na Atlas Export da Índia. O preço CIF (compra,
frete e seguro) da mercadoria é de 50.056,00 Dólares. A mercadoria
chegou a Moçambique através do navio D.R Camberra, tendo partido do
porto de UNPL, na Índia.
CADERNOS ESCOLARES
Em Março de 2013, o partido Frelimo importou dois contentores com mais
de 18 toneladas cada, contendo embalagens de cadernos escolares. Segundo
comprovam os documentos na posse do CIP, os cadernos foram adquiridos
na empresa Sundaram Multipap Limited, em Mumbai, na Índia. Partiram do
porto Nsict, pelo navio Delmas Keta e chegaram a Moçambique através do
porto de Nacala.
RASSUL TRADING, O CLIENTE DA FRELIMO?
O CIP sabe que grande parte dos produtos importados com isenção pela
Frelimo, ao nível da zona norte, são vendidas nas lojas da Rassul
Trading, em Nampula, sobretudo em Nacala, cidade Alta. De facto, alguns
documentos de importação (Bill of Lading), a que tivemos acessos provam a
existência dessa relação entre as importações da Frelimo e as lojas de
Rassul Trading. Por exemplo, o Bill of Lading nº557881682, de 10 de
Agosto de 2012, foi emitido em nome do partido Frelimo, em Nacala, mas o
contacto que consta desse documento é um fax da Rassul Trading (ver http://www.indexmocambique.com/empresas/rassul_trading.html).
No referido documento, a Frelimo importou a favor da Rassul Trading,
lojas de Gulamo Rassul, 690 motorizadas, avaliadas em 130.970,00
Dólares, o equivalente a 4.3 milhões de Meticais.
PRIMEIRO-MINISTRO AMEAÇOU BANIR IMPORTAÇÃO DE PNEUS USADOS
No mesmo período em que o partido Frelimo patrocinava importação ilegal
de 5 mil pneus de Dubai para o mercado nacional, sem pagar direitos, o
Primeiro-Ministro, Alberto Vaquina anunciava que o Governo quer banir a
importação de pneus usados, provenientes da África do Sul, alegando que
os mesmos são "lixo".
"Nós, como um país, não podemos aceitar ser a lixeira de pneus que os
outros já não usam. Eles já não os usam porque já não são seguros. Se já
não são seguros para os outros países, também não são seguros para
Moçambique, porque eles são tão pessoas como nós. Temos o dever de ver
como fazer para inibir aqueles aspectos que sabemos que são claramente
responsáveis pela ocorrência de acidentes", disse o PM citado pelo
jornal O País, na ocasião (ver edição de 06.08.13)
As palavras do PM até fazem sentido quando se evoca a necessidade de
segurança rodoviária, mas coincidentemente foram proferidas no momento
em que o partido Frelimo introduzia em Moçambique dezenas de toneladas
de pneus novos importados sem pagar direitos aduaneiros.
O PM ignorou ainda que Moçambique não só consome pneus usados, como
também que as viaturas que circulam no País, acima de 80% são usadas
noutros Países e depois importados para Moçambique.
URGÊNCIA DA INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
O Centro de Integridade Pública defende que é pertinente tal como
urgente que o Ministério Público aja para pôr cobro a esta máfia que
desvia dos cofres do Estado milhões de meticais. Não basta a actuação
exclusiva das Alfândegas, tratando estes crimes como exclusivamente
aduaneiros. Esta rede de negócio vai muito para além de simples
descaminho aduaneiro. Configura-se uma verdadeira máfia, de crime
organizado que envolve desde partidos políticos, agentes comerciais
nacionais, despachantes aduaneiros e até fornecedores estrangeiros. O
seu combate exige esforço conjunto de todas as autoridades estatais,
sendo o Ministério Público a entidade que por lei vela pela legalidade
no País, a que deve agir para repor a legalidade e esclarecer aos
moçambicanos sobre o fim último destas mercadorias.
ALFÂNDEGAS NEGAM DISPONIBILIZAR INFORMAÇÃO
A dimensão do negócio de produtos isentos de pagamento de direitos
aduaneiros, importados pelos partidos políticos, já justifica as razões
por que as Alfândegas de Moçambique rejeitaram o pedido do CIP no
sentido de disponibilizar a informação sobre as importações feitas pelos
partidos políticos nos últimos cinco anos. Segundo apurámos, logo após a
publicação do primeiro trabalho sobre o negócio de venda de isenções
pelos partidos políticos (ver
http://www.cip.org.mz/cipdoc%5C295_CIP%20Newsletter%20n%C2%BA01_2014.pdf),
o Governo ordenou que não fossem tornadas públicas as informações que
solicitamos sobre as importações dos partidos políticos.
Em carta número 89/DG/DGA/2014, de 19 de Março, a Direcção Geral das
Alfândegas de Moçambique respondeu ao CIP o seguinte: "manifestamos
indisponibilidade para fornecer os dados solicitados no número 1 e 2 da
carta na forma como pedido é apresentado devido a limitações
estabelecidas por lei sobre a divulgação da informação que é submetida
às Alfândegas (Diploma nº 16/2012, de 1 de Fevereiro - aprova o
regulamento do desembaraço Aduaneiro de Mercadorias)". No entanto, a
carta das Alfândegas não se refere ao artigo que veda o acesso a
informação dos partidos.
Os números 1 e 2 da carta que o CIP enviou às Alfândegas de Moçambique a
26 de Fevereiro passado, solicita a seguinte informação: 1) Número e
nomes de partidos políticos que requereram e obtiveram isenções fiscais
para a importação de viaturas em 2013 e o início de 2014; e 2) Lista e
características das viaturas importadas pelos partidos políticos com
benefício de isenção fiscal, no período acima referido.
É URGENTE A REVISÃO DA LEI DOS PARTIDOS POLÍTICOS
Os factos acima expostos mostram que é urgente e necessária a revisão da
lei dos partidos políticos. Esta lei já está desactualizada, para além
de que desde a aprovação, em 1992, ainda não foi regulamentada.
No nosso entender, um partido que abusa do direito à isenção que lhe foi
conferido na importação de equipamentos necessários ao seu
funcionamento, deve ser penalizado e até ver esse direito suspenso ou
retirado. Mas para que isso aconteça, deve haver regulamentação da lei,
que neste momento apenas confere direitos de isenção e não prevê sanções
em caso de uso abusivo desse direito.
A lei ainda não fixa o limite mínimo do volume das importações de um
partido político isentas de pagar direitos aduaneiros, o que faz com que
os partidos políticos abusem desse direito. Só a regulamentação da lei
pode estabelecer este limite. Aqui, a Assembleia da República (o
parlamento), é que deve assumir o papel soberano de legislar sobre esta
matéria.
O parlamento representa os interesses dos moçambicanos e como tal deve
agir com urgência para acabar com este tipo de abusos.
Em anexo os documentos das importações.
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