Tuesday 22 February 2011

Opiniao de Noe Nhantumbo

PYONGYANG E MAPUTO TÃO DISTANTES MAS TÃO PARECIDAS

Mesmo com cólera e fome os banquetes continuam…
Quanto custa promover o culto de personalidade? Quem paga?



Beira (Canalmoz) - Não se advoga o fim das comemorações nem da celebração de datas com significado importante para uma nação. Não se pode parar de viver e deixar de cumprir agendas previamente estabelecidas. Não se pretende entrar pelo caminho da austeridade pelo facto em si ou por ser algo religiosamente cultivado ou instituído. É politicamente correcto e está na moda. Também os que afirmam que para governar é preciso gastar não deixam de ter razão. Só que tudo tem os seus limites e deve ser criteriosamente analisado pois cada caso é um caso.
É típico de gente que não tem, gastar o pouco que consegue, logo que se apresente a oportunidade, sem olhar para o dia de amanhã. Também é comum observar que quase todos os líderes políticos inseguros ou que se pretendem perpetuar no poder adoptam o estilo de auto-promoção e se rodeiam de gente servil pronta a responder ‘sim’ a qualquer dos desígnios do chefe. No lugar que colaboradores e assessores que trazem ao chefe informação relevante para que este tome as decisões mais apropriadas para cada caso, estas pessoas procuram explorar as necessidades do chefe e aperceberem-se dos seus apetites, vontade e sonhos. Uma vez descoberta a estrutura de pensamento do chefe especializam-se na sua satisfação. Em troco recebem cargos e mordomias, regalias e posições de relevo na esfera política e governativa.
A ofensiva comemorativa que se assiste no país e um aparente movimento para recordar e reafirmar a importância de algumas figuras que participaram na luta de libertação nacional tem de ser vista na sua real dimensão e significado. Quando se propõe o gasto de fundos escassos do erário público em celebrações e comemorações relacionadas com este ou aquele herói, o que se faz é simultaneamente celebrar os mortos e os vivos pois os mortos são de uma maneira ou de outra companheiros dos vivos e entre os vivos está o chefe. É portanto uma auto-celebração e comemoração custeadas com os impostos de todos nós.
Este tipo de acções, a julgar pelo que acontece em outras latitudes, é indicativo de uma firme tendência ao culto de personalidade. Os chefes que se aventuram por estes caminhos são em geral pessoas que não estão predispostas a abandonar o poder por qualquer motivo.
É sintomático o que se passa por exemplo na Coreia do Norte em que uma autêntica dinastia está no governo daquele país num processo que começou por uma forte promoção do culto de personalidade do falecido pai do actual chefe daquele país. Kim Il Sung tinha um estatuto de pequeno deus na Coreia do Norte. A carga de elogios que cobre o seu sucessor faz prever que ele também terá o mesmo estatuto após sua morte. Mas como já tem um filho alinhado para o substituir, a dinastia continuará garantida. Pode-se afirmar que se trata do extremo do culto de personalidade.
Mas atenção que os rios nascem pequenos e crescem alimentados por seus afluentes. Se a constante e permanente exposição do PR moçambicano, o elogio a si por tudo e por nada por parte da sua corte, a sua imitação e emulação por membros do seu partido e por funcionários governamentais, servem uma agenda política que visa bombardear o povo com o seu nome e seus alegados feitos. Os resultados dessa corrente audiovisual podem ser inesperados. A veneração que se faz nestes dias a Samora Machel até parece algo religioso em que os promotores pretendem conferir a categoria de “santo” ou algo maior a um homem normal que em face de uma determinada situação se tornou líder de um movimento de libertação. Heroicidade ou não que ele tenha tido e o facto de haver necessidade de prestar as devidas homenagens, não significa nem deveria significar que por todo um país se erguesse uma estátua do mesmo.
Tudo se conjuga para que se conclua que todo o movimento relacionado com a denominação de Ano Samora Machel, a 2011, tem objectivos profundamente políticos. Pretende-se com as estátuas dele e usando de alguma simpatia que goza no seio das populações, influenciar mentes no sentido de votarem nos candidatos do seu partido. Portanto as estátuas têm de ser vistas como uma mensagem de marketing político permanente porque onde houver estátua está será vista pelos cidadãos.
Mas enquanto a miséria grassa e ceifa vidas, enquanto as doenças se propagam e as inundações mostram um cenário de incompetência crónicos de quem governa, não é de bom-tom nem é sabedoria governativa promover banquetes televisionados onde os políticos sobem ao palco para discursar o mesmo de sempre.
Contenção de custos tem validade e significado que podem mobilizar mais do que “mil palavras” como diz o ditado. Moçambique não pode continuar a ser aquele país que caminha cegamente para o abismo e com uma liderança que só se interessa pelo voto dos cidadãos mas jamais se recorda de que os cidadãos merecem um tratamento humano e igual.
Enquanto se distrai o Zé-povinho com aguardente barata, espectáculos como Verão Amarelo ou Azul, comícios e discursos em CD pirateados de Samora, os cérebros do regime avançam com esquemas de engenharia financeira que visam essencialmente a sua perpetuação no poder. E neste jogo até a utilização abusiva dos mortos serve. Senão “os fins não justificariam meios”.
Do Parlamento local é de esperar muito pouco porque a ditadura do voto sempre faz valer a sua posição. Nem posição alguma é tomada antes de se conferenciar e receber orientações dos superiores hierárquicos que à distância controlam a orquestra despesista em que se tornou aquele órgão legislativo e “fiscalizador”.
Tudo indica que a cegueira e incapacidade de utilizar as oportunidades e recursos existentes para fazer a diferença e promover desenvolvimento benéfico para os cidadãos continuará fora da agenda.
Com o fim próximo do mandato, o “carnaval” vai continuar embora os espectáculos aéreos possam diminuir e alguns disfarces e consultorias encomendados possam deixar de se ver com a mesma insistência.
Caricata, também triste, é esta farsa de fabrico de heróis em que vivos agem como se quisessem garantir a sua última moradia na Praça dos Heróis em Maputo. O cúmulo do ridículo!
À custa do erário público até andam tão distraídos que deixam escapar para a comunicação social que uma visita à província de Maputo custou dois milhões de meticais. Estes são exageros como os que se praticam em Pyongyang, na Coreia do Norte. Sempre que o “Grande Líder” tem aniversário…Aqui também!... (Noé Nhantumbo)

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