O Governo moçambicano deplora a decisão da contraparte do Malawi de avançar com o projecto de navegabilidade do canal Chire e da Bacia Hidrográfica do Zambeze sem a devida conclusão do estudo de viabilidade acordado entre as partes.
Fonte do governo moçambicano afirma que o episódio mais flagrante e recente ocorreu no último sábado, em que as autoridades malawianas realizaram a cerimónia de inauguração do Porto de Nsanje situado no rio Chire que, mais para o interior do país as suas águas desaguam no Rio Zambeze próximo do distrito de Morrumbala, província central da Zambézia.
A viabilização do projecto passa necessariamente pela realização de um estudo de viabilidade que ainda não foi concluindo. Aliás, a única empresa que ganhou o concurso público para o efeito não o finalizou.
Porém, na cerimónia havida sábado o Presidente do Malawi, Bingo wa Mutharika, endereçou um convite formal aos seus homólogos do Zimbabué e Zâmbia, nomeadamente Robert Mugabe e Ruphia Banda, mas para Moçambique o Ministério dos Negócios Estrangeiros do Malawi enviou pura e simplesmente uma nota verbal ao Alto Comissariado no Malawi.
Na nota verbal, a diplomacia malawiana solicitava a confirmação da participação de Sua Excelência o Presidente da Republica de Moçambique, Armando Guebuza, na cerimónia.
Além dos estadistas do Zimbabwe e Zâmbia, a cerimónia de sábado contou igualmente com a presença do Ministro do Desenvolvimento e Comunidades da República da Tanzânia, o Presidente da Comissão da União Africana (UA), Jean Ping, o Secretário Executivo da SADC, o moçambicano Tomaz Salomão, e representante do Secretario Geral da COMESA e representantes das Missões diplomáticas acreditadas no Malawi.
Na inauguração, Bingo wa Mutharika pretendia, na verdade, mostrar aos seus convidados que mesmo sem o estudo de viabilidade há condições para iniciar a navegabilidade dos rios Chire e Zambeze até ao Oceano Índico.
Para dar prova, wa Mutharika aguardava pelo aparecimento de uma embarcação navegando nas águas do Chire, que não chegou a “despontar”, porque a mesma tinha sido interceptada dias antes em Marromeu, noroeste da província de Sofala.
Num outro incidente diplomático, segundo a fonte, “o Malawi usou sexta-feira uma das embarcações de pequena dimensão que havia sido retida em Marromeu, província de Sofala, onde pretendia levar contentores carregados de fertilizantes”.
“Durante o percurso ao longo do rio Chire, na zona de Pinda, na travessia para a Província de Tete, a Polícia da República de Moçambique (PRM) interceptou a referida embarcação com a matrícula PA 24279FL tripulada por um sul-africano de nome Anton Botes”, acrescentou a fonte.
A bordo da mesma encontrava-se o Adido Militar da missão diplomática do Malawi em Moçambique, James Kalipinde, que saiu de Maputo sem a devida autorização do Ministério da Defesa Nacional (MDN), como tem sido procedimento.
Todavia, explicou a fonte, Kalipinde foi levado à cidade de Quelimane, capital da província central da Zambézia, para mais averiguações, tendo sido liberto no sábado seguinte, quando se constatou que ele era um diplomata.
Na embarcação encontravam-se igualmente dois oficiais do Governo do Malawi e tripulantes da embarcação, nomeadamente, Jones Kaunda e Mathews Chinganda.
Importa sublinhar que Moçambique nunca, esteve contra a viabilização do projecto de navegabilidade dos rios Chire e Zambeze, porém o mesmo carece de um estudo de viabilidade.
O projecto de navegabilidade dos rios Chire e Zambeze foi sugerido e submetido, em 2005, pelo Governo do Malawi.
Em Setembro de 2006, Moçambique recebeu, do Governo daquele país, o relatório do pré-estudo de viabilidade do referido projecto.
Porém, tal pré-estudo não era conclusivo, tendo levado os Governos de Moçambique, Malawi e Zâmbia a recomendar a realização de um estudo de viabilidade mais profundo e completo, que traria conclusões sobre a viabilidade ou não da navegabilidade dos rios Chire e Zambeze, incluindo o seu impacto ambiental.
Neste contexto, os três governos assinaram, no dia 25 de Abril de 2007, em Lilongwe, Malawi, o Memorando de Entendimento sobre o Projecto de Navegabilidade dos rios Chire e Zambeze, visando a mobilização de fundos para a realização do estudo de viabilidade.
No âmbito da implementação do memorando, foram criados o Comité Técnico Conjunto e o Comité Consultivo Conjunto dos Ministros responsáveis pelo pelouro dos Transportes dos três países. Estes comités reuniam-se regularmente até Agosto de 2009, para debater e decidir sobre as fases do projecto.
Em Maio de 2008, os três Governos Parte do Projecto lançaram um concurso internacional para a realização do estudo de viabilidade do projecto de navegabilidade dos rios Chire e Zambeze, o qual foi ganho pela empresa intitulada ZARTCO, que por sinal foi a única concorrente.
No dia 15 de Agosto de 2009, em Maputo, os três governos e a empresa vencedora do concurso, a ZARTCO, assinaram o Memorando de Entendimento sobre a realização do estudo de viabilidade do projecto de navegabilidade dos rios Chire e Zambeze.
Entretanto, no dia 20 de Outubro de 2009, dois meses depois da sua assinatura, Moçambique denunciou o referido Memorando, pelo facto de a ZARTCO não ter cumprido com o estipulado, que indicava o prazo de 21 dias para o início do estudo de viabilidade, a contar da data da assinatura do texto.
No dia 29 de Janeiro último, o Ministro moçambicano dos Transportes e Comunicações e o Ministro dos Transportes e Infra-Estruturas Públicas do Malawi mantiveram conversações em Maputo, cuja tónica dominante foi a questão da navegabilidade dos rios Chire e Zambeze.
As minutas acordadas no fim da visita indicam que os governos dos dois países notaram com preocupação a incapacidade da empresa ZARTCO de levar a cabo o estudo de viabilidade e concordaram em se retirar do Memorando de Entendimento devido a este facto.
Malawi informou sobre a vontade e interesse do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) em financiar o estudo de viabilidade do projecto e os ministros dos dois países concordaram em convocar a reunião do Comité Consultivo Conjunto logo que o banco tomasse a decisão final em relação ao financiamento do projecto incluindo as modalidades e logísticas sobre a realização do concurso público.
Malawi solicitou, na ocasião, uma autorização para levar a cabo a navegação experimental dos rios Chire e Zambeze, tendo Moçambique concordado em facilitar a mesma mas aconselhou sobre os trâmites a seguir para obtenção de uma autorização para o efeito.
Na recente 11/a Sessão da Comissão Mista entre Moçambique e Malawi, havida em Maputo, de 13 a 15 do corrente, Moçambique voltou a reiterar a sua posição em relação a realização do estudo de viabilidade e de impacto ambiental para determinar a navegabilidade dos rios Chire e Zambeze.
Porém, no dia 29 de Setembro de 2010, uma embarcação supostamente registada em Moçambique e pertencente a ETC Marine Limitada, partiu do Porto de Quelimane navegando experimentalmente no rio Zambeze, em direcção a Nsanje (Malawi), foi interceptada e retida em Marromeu, onde pretendia levar contentores carregados de fertilizantes.
No dia 19 do corrente, o Executivo do Malawi enviou uma delegação constituída pelos Ministros dos Negócios Estrangeiros e dos Transportes e Infra-estruturas Publicas, nomeadamente Eta Banda e Sidik Mia que manteve conversações com os homólogos moçambicanos.
Na reunião a Ministra dos Negócios Estrangeiros do Malawi solicitou a libertação da embarcação retida em Marromeu para continuar a sua viagem fluvial para Nsanje. Informou ao Governo Moçambicano que o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) disponibilizou 3.5 milhões de dólares americanos para o estudo de viabilidade dos rios Chire e Zambeze.
A retirada de Moçambique do Memorando de Entendimento sobre o projecto aconteceu porque a empresa que ganhou o concurso não demonstrava seriedade.
Esta realidade sobre a empresa ZARTCO foi confirmada por um grupo de trabalho dos três países membros do projecto, na sua digressão ao Zimbabué, África do Sul e Moçambique, países onde a empresa dizia possuir escritórios. Factos constatados nos países visitados revelaram a falta de idoneidade do consórcio ZARTCO, pois não possuía escritório em nenhum.
Fonte: RM/AIM
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