Monday 18 August 2008

Tragédia de Mbuzini



Tragédia de Mbuzini
Sérgio Vieira Especula sobre Circunstâncias do Acidente que Vitimou Samora Machel

Maputo (Canal de Moçambique) - Numa longa entrevista ao canal televisivo, STV, e que foi reproduzida na última edição do semanário, O País, o antigo ministro da segurança, Sérgio Vieira, voltou a comentar sobre o acidente de aviação de Mbuzini que ceifou a vida ao fundador da nação moçambicana, Samora Machel, e a 33 outros passageiros. Embora membro da Comissão Nacional de Inquérito, nomeada pelo governo moçambicano para investigar as causas do desastre, Sérgio Vieira revelou na entrevista conduzida por Jeremias Langa uma ignorância profunda sobre as circunstâncias do fatídico acontecimento. Vieira, que presentemente desempenha as funções de director do Gabinete do Plano do Zambeze (GPZ), baralhou situações, distorceu factos, para além de ter recorrido à especulação e à fantasia, fruto da sua fértil imaginação. A determinada altura da entrevista, Sérgio Vieira afirma que “na caixa de voz de cabine, não a dos motores, que é feita na África do Sul, está registado onde é que estamos. “Estamos fora da rota?” e o navegador responde: “não”. Desta afirmação de Vieira há a reter dois aspectos fundamentais. O primeiro, é que a leitura do gravador de cabine (CVR, mas que Vieira chama de “caixa de voz de cabine”) não foi efectuada na África do Sul. Conforme o acordado entre as três partes (Moçambique, África do Sul e União Soviética) em Maputo a 19 de Novembro de 1986, a leitura do CVR foi efectuada em Zurique, Suíça. O segundo aspecto é que da transcrição do conteúdo do CVR não constam as palavras que Sérgio Vieira atribui aos tripulantes, e que atrás transcrevemos da entrevista por ela dada à STV e vem reproduzida na edição de 15 do corrente do jornal O País. Sérgio Vieira também se referiu às horas de voo dos tripulantes, tendo dito “que todos eles, menos um, tinham cerca de 40 mil horas de voo.” E acrescenta: “O que tinha menos andava à volta de 8 mil horas.” De acordo com o Relatório Factual do acidente, compilado e assinado por peritos moçambicanos, sul-africanos e soviéticos, nenhum dos tripulantes possuía nada que se parecesse com as “40,000 horas” de voo avançadas por Sérgio Vieira. De acordo com o referido relatório, as horas de voo dos tripulantes do Tupolev presidencial estavam distribuídas da seguinte forma: Tupolev 134-A C9-CAA Tripulantes Horas de Voo Comandante 13056 Co-piloto 3790 Navegador 12948 Operador de Rádio 14370 Mecânico de Bordo 6203 A facilidade com que Sérgio Vieira lança números ao acaso, como se a contabilização de horas de voo fosse uma espécie de totoloto, já havia ficado demonstrada num artigo de opinião por ele assinado no semanário Domingo, edição de 29 de Junho de 2003, em que afirmou: “Qualquer dos tripulantes beneficiava de uma folha brilhante, o comandante com mais de duas dezenas de milhar de horas de voo.” A aparente dificuldade de Sérgio Vieira em lidar com questões aritméticas ficou ainda patente na entrevista concedida ao canal STV, no decurso da qual afirmou que “o comandante, por qualquer razão, levanta o avião, entra no território sul-africano e cerca de 200 /300 metros bate com a cauda numa montanha e o avião cai num barranco.” Ao contrário do que afirma o actual executivo do GPZ, o avião apenas entrou 150 metros no território sul-africano. Em nenhum momento da descida, o comandante “levanta o avião”, segundo alega Sérgio Vieira, e muito menos ao entrar no espaço aéreo sul-africano, não obstante o sinal de aviso dado pelo Sistema de Aviso de Proximidade do Solo (GPWS) e que foi escutado no interior da cabine de comandos durante 32 segundos. O desrespeito pelo sinal do GPWS por parte de quem comandava a aeronave foi uma das principais causas do desastre e não o “aparelho muito mais complexo que estava a ser testado e podia dar informações falsas de radar e de rota”, segundo especula Vieira. Na realidade, e conforme as três partes deixaram explícito no Relatório Factual de sua autoria, todos os instrumentos de bordo funcionaram normalmente, não tendo sofrido qualquer interferência externa, contrariamente ao que Sérgio Vieira, mercê da sua fértil imaginação, afirmou numa tentativa de iludir os telespectadores da STV. Surpreendentemente, e contrariando o que peritos moçambicanos confirmaram num parecer que consta do relatório da Comissão de Inquérito, Sérgio Vieira, ao tratar da questão do combustível da aeronave, afirmou na entrevista, que “tentou-se acusar que o avião não tinha combustível suficiente, mas viu-se que tinha combustível suficiente”. De facto, conforme vem claramente enunciado no Relatório Factual, o avião não dispunha de combustível suficiente para o voo de regresso a Maputo. Na eventualidade de ter de abortar uma aterragem em Maputo, o avião não conseguiria alcançar o aeroporto alternante, que era a Beira. E aqui, o erro da tripulação foi não ter cumprido com os regulamentos da aviação que determinam que uma aeronave deve dispor de combustível suficiente para poder alcançar o aeroporto de destino, e dirigir-se deste ao aeroporto alternante, e ainda 45 minutos adicionais em voo de espera sobre o aeroporto alternante. Se, na noite do dia 19 de Outubro de 1986, o Tupolev presidencial tivesse de desviar a rota para a Beira quando se encontrava desorientado nas proximidades de Maputo, não conseguiria ir muito além do Rio Save – caía, simplesmente, por falta de combustível. A falta de combustível verificada no voo em que o Presidente Samora Machel perdeu a vida, não foi a primeira que ocorreu em voos pilotados pelo mesmo comandante. Meses antes do desastre de Mbuzini, o Tupolev presidencial efectuou uma aterragem em Maputo com um dos motores parados por insuficiência de combustível.
Ao longo da sua carreira, o piloto do Tupolev presidencial efectuou voos na Europa e em outros países africanos em que as aeronaves sob seu comando não dispunham de combustível suficiente. E isto foi confirmado por ele próprio durante a conversa que manteve com os demais tripulantes do voo de 19 de Outubro de 1986, dentro da cabine de comandos, e que ficou gravada no CVR. A transcrição do CVR, efectuada em Zurique, prova-o. (Redacção)
2008-08-18 06:41:00

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