Monday 10 May 2010

A Opiniao de Joao Mosca sobre Impostos

ECONOMICANDO


Por Joao Mosca


O governo através da Autoridade Tributária de Moçambique (ATM) procura aumentar a arrecadação de impostos. A estratégia parece ser o de alargar a base tributária, isto é, aumentar o número de contribuintes evitando-se a elevação da carga fiscal dos que já contribuem que, segundo dados existentes, não são mais de 10% dos potenciais contribuintes (número de contribuintes/população activa) e com taxas já elevadas. Parecem ser opções acertadas. Mas a questão que se pretende apresentar neste texto é outra.
Durante a guerra pela independência, a FRELIMO incentivou o não pagamento de impostos. Impostos reforçavam o Estado colonial. O imposto de palhota e o chibalo eram compulsivos. Libertar os homens significava também rupturas com as formas de exploração e de agressão à dignidade. Não pagar impostos era uma manifestação de resistência e luta. Por outro lado, os camponeses nas zonas libertadas, segundo a documentação oficial, dedicavam uma parte do seu fundo de trabalho nas cooperativas para a produção de alimentos dos combatentes. Isto não é um imposto (compulsivo ou não)? Politicamente (ou melhor, ideologicamente), pode ser interpretado como um acto libertador e prova do engajamento na libertação do país.
Com a independência, no período “socialista”, a maioria dos cidadãos, as actividades informais e os pequenos negócios, continuaram não pagando impostos. As empresas estatais também não o faziam. As receitas do Estado provinham principalmente dos lucros de algumas poucas empresas rentáveis, das alfândegas, e o défice era financiado através de crédito bancário, de emissão de moeda pelo banco central, do financiamento e da ajuda externa. Posteriormente, após as reformas, regulou-se a responsabilidade das pessoas singulares e colectivas.
Mas a maioria dos agentes económicos e das pessoas continuam não estando abrangidas. A explicação é simples e complexa. Simples porque a base tributária está associada à estrutura económica, onde a grandíssima maioria dos agentes económicos são informais, com pequenos negócios sem organização empresarial convencional e grande parte do emprego não está legalizado/registado e, portanto, não é tributável. É complexo porque, como estabelecer impostos aos camponeses, sobretudo quando nas últimas décadas nunca o fizeram? Como integrar a economia informal no sistema tributário?
Mais complicado resulta se existirem preocupações de justiça fiscal. Por exemplo:
• É justo que uma pequena parte dos cidadãos paguem impostos, suportando um Estado que depois, teoricamente, presta serviços a toda população? Nestes casos, uns poucos financiam os serviços à maioria. Alargar a base tributária pode ser entendido com esse sentido de justiça.
• É justo que os grandes investimentos externos tenham benefícios fiscais anormais (não pagando impostos), mesmo que a razão seja a suposta criação de uma maior atractividade do investimento externo?
• Como se sentem os contribuintes quando tomam conhecimento de casos de corrupção e má utilização de fundos públicos (dos impostos dos contribuintes) pelo Estado e por funcionários? Há eficiência e produtividade no aparelho de Estado?
• Que contra partidas os cidadãos têm do Estado? Há boas escolas, centros de saúde e hospitais de qualidade, seguros de saúde, segurança nas ruas? Os cidadãos que necessitam de serviços públicos, são cordialmente atendidos por funcionários cujos salários são pagos pelos contribuintes e pelos impostos dos cidadãos de outros países através da cooperação?
Mais impostos deveria assentar essencialmente no crescimento económico, na ampliação da base tributável e na eficácia da administração tributária. A nossa economia tem crescido entre 7 e 8 por cento e os impostos em ritmos inferiores, o que significa uma baixa elasticidade da relação entre o volume de impostos e a riqueza. Em outra linguagem, há criação de riqueza não tributada, o que é justificado pelas seguintes razões:
• Investimentos estrangeiros com benefícios fiscais.
• Uma parte significativa do crescimento está assente na economia informal, como por exemplo na agricultura que não está sendo tributada.
• Fuga ao fisco.
• Ineficácia da administração tributária e corrupção.
Arrecadação de mais impostos deve ainda ser entendido na perspectiva de reduzir o défice e a dependência externa. Talvez seja esta a razão próxima das actuais pressões e pressas da governação.
Os desafios da ATM são grandes. E a pressa é má conselheira. Corre-se o risco de arbitrariedades na tributação. De aplicações indevidas da lei ou da existência de lacunas legislativas. No lugar de se pretender de forma rápida obter mais receitas, talvez fosse mais aconselhável:
• Melhorar a eficácia da máquina tributária, incluindo no combate à corrupção.
• Afinar a legislação.
Este esforço terá efeitos limitados se não houver a consciencialização dos cidadãos para a responsabilidade de pagamento de impostos. E aqui está a grande questão: antes, não pagar impostos, era uma forma de resistência ao colonialismo. Agora é um acto patriótico para impulsionar o desenvolvimento e reduzir a dependência. Os cidadãos, alguns já idosos que nunca pagaram impostos, entenderão este discurso?
Finalmente, um aspecto não referido no texto e que se deixa para o leitor. O reequilíbrio do orçamento não pode ser pretendido apenas através de medidas do lado das receitas. O problema das despesas é quiçá não menos grave. Há tanta injustiça orçamental, desigualdades espaciais e sectoriais, ineficiência e baixa produtividade da burocracia estatal, mordomias e formas de compensação dos baixos salários, gastos em manifestações de afirmação do poder, etc. E com tudo isto, não se conhecem medidas para conter ou reduzir as despesas. É fácil entender os porquês, mas não é aceitável.

In Savana 07/05/2010

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